A vergonha é o maior obstáculo para alguém chegar até a irmandade D.A. (Devedores Anônimos). Quem afirma é Rosa (nome fictício), 52, coordenadora de uma das reuniões do grupo na zona Oeste de São Paulo. Ela conta que estava no fundo do poço quando foi ao local pela primeira vez, em 15 de agosto de 2008. “Admitir a falência é muito constrangedor. Existe uma sensação muito ruim de impotência, inferioridade, derrota, fracasso, perda de confiança e de dignidade. Como eu, que tenho duas faculdades, que ganhei milhões no mercado financeiro, estava então com o nome sujo, os bens todos penhorados, a luz cortada, com oficial de Justiça batendo à minha porta, vendendo pão de mel em frente a uma igreja? Foi vergonhoso admitir que havia perdido o domínio sobre minha vida”, lembra.
Só a partir da aceitação – justamente o primeiro passo do programa – é que Rosa diz ter conseguido pagar tudo o que devia, recuperar o que estava na iminência de perder e ainda aumentar seu patrimônio. Mas aí está o problema: a vergonha vem de brinde com a dificuldade financeira. É grátis. E complica muito a chegada até o caminho que pode levar à solução. “O primeiro passo consiste em admitir que da sua maneira nunca funcionou, não funciona nem vai funcionar. E aqui a vergonha é um ponto crucial: por causa dela, muitos não conseguem reconhecer a falência e acabam desistindo de se tratar”, afirma.
Esse tipo de dificuldade acerta em cheio a classe média, obcecada por pequenos luxos que não cabem no orçamento quando a situação aperta. Entre pessoas desse grupo e até mesmo as mais ricas, quantos vezes você esteve numa conversa no qual se falava abertamente sobre dívidas pessoais? Há ainda uma geração de jovens adultos, nascidos após o Plano Real (1994), para quem lidar com uma verdadeira crise econômica era uma experiência inédita – como enfrentar essa novidade sem sentir vergonha? E você? Numa situação de apuros, acha mesmo que conseguiria pedir socorro a quem está perto (talvez dinheiro, talvez uma conversa)? Não falar não elimina a dívida: está tudo lá, no extrato bancário ou, pior, nos órgãos de proteção ao crédito. A real sobre este problema é que, quanto mais se tenta esconder, mais ele aumenta.