Da laje da casa de Antonio Carlos Santana de Jesus, 35, é possível observar as ruas, becos e vielas de São Caetano e Liberdade. Dá para ver, inclusive, as paredes coloridas da sede do bloco Ilê Aiyê. A poucos metros dali, Cala, como é conhecido, desenhou uma mensagem com o Salmo 125: "Os que confiam no Senhor serão como o Monte de Sião, que não se abala, mas permanece". O dono consentiu.
Cala vive na Fazenda Grande do Retiro. Bairro de caminhos duros, é lugar onde forasteiro não deve transitar sem a companhia de um guia local, sob o risco de ser assaltado. Cala gosta de ser essa pessoa que informa aos visitantes por onde andar.
Dos perigos das ruas soteropolitanas ele entende. Desde a adolescência picha muro no centro de Salvador. Quando está com uma lata de tinta spray nas mãos, seu maior inimigo é a polícia ou os vigilantes. Já apanhou quando, junto de amigos, pichava o alto de um prédio comercial.
Mas, desde que se converteu, há 11 anos, o inimigo é apenas um. Satanás.
Cala, que largou a escola depois de concluir o 2º ano do ensino médio, nunca foi muito de estudar. Com o batismo na Assembleia de Deus, começou a encher de livros religiosos a pequena sala de casa. No imóvel de dois quartos, uma mureta baixa faz a divisão entre a cozinha e a sala.
"Entendi que era necessário estudar as Sagradas Escrituras para melhor entendê-las", diz ele. São 251 exemplares de obras sobre teologia, biografias, poesia e história, tudo relacionado à fé, além de 35 Bíblias de distintas edições e traduções. Embora não entenda outro idioma, faz questão de ter em casa um original do Novo Testamento em hebraico, outro em grego, e um Antigo Testamento em aramaico. Na hora da leitura, recorre à tradução online.