Para as famílias que têm seus nomes ligados aos extremistas, a situação é pior ainda. “Quase não vou mais ao mercado porque é humilhante, as pessoas nos olham como se fôssemos lixo e dizem que somos terroristas”, diz Nada. “Somos tratadas como se não tivéssemos os mesmos direitos que as outras pessoas porque nossos maridos escolheram entrar para o Estado Islâmico”, completa. Ela se casou ainda adolescente, aos 16, como muitas outras mulheres da região. Mesmo coberta com um véu preto, sem maquiagem e qualquer adereço, como é o costume local, sua beleza chama a atenção. Ela conta que recebeu cinco propostas de casamento antes de aceitar se unir a seu marido, Khaled.
No Iraque, como em outros países do Oriente Médio muçulmano, a família do noivo oferece um dote para a noiva – o valor pode chegar a US$ 70 mil, conforme a condição social, a idade e aparência da moça. O acerto precisa da aprovação dos pais. O namoro não existe. Uma vez firmado o compromisso, parte-se para o casamento. As mulheres não têm direito à herança nem a tomar decisões na família, que são responsabilidade do marido. “Em muitas famílias, a mulher precisa consultar o cônjuge até para comprar uma roupa ou sair de casa para ir ao mercado”, diz Layla Saleh, arqueóloga de Mossul, que preferiu não se casar para manter sua independência. “É preciso ser forte para criar os filhos sem a presença masculina e tocar a vida em frente com alguma alegria”, afirma.
Na falta do marido, o guardião passa a ser o pai ou algum parente. O pai de Nada, aposentado, aceitou se responsabilizar pela família da filha e de Noor. “Ainda bem que ele entendeu a situação e não nos recriminou porque o genro aderiu ao grupo terrorista, como fizeram outras famílias”, diz Nada.
Mesmo assim, a vida não é fácil. Noor ainda não conseguiu tirar a carteira de identidade dos dois filhos menores, de três e dois anos, que nasceram durante a ocupação do Estado Islâmico, quando todos os serviços públicos oficiais foram suspensos. “Não dão os documentos porque somos viúvas de militantes do Estado Islâmico”, diz Noor. Sem a identidade, ela não pode matricular as crianças na escola. Mas não está nos planos de Noor desistir. Ela continua insistindo para obter o documento das crianças nos postos do governo. E se não conseguir? “Meu maior sonho é ver todos os meus filhos estudando e ter uma casa própria”, afirma. Se não puder colocar os filhos na escola em Mossul, ela pretende se mudar para o vilarejo em que nasceu, perto dali, onde acredita que teria uma acolhida mais positiva.