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Casa de redução de danos abre no carnaval de Olinda

Casa de redução de danos em Olinda - Divulgação
Casa de redução de danos em Olinda Imagem: Divulgação

Marie Declercq

Do TAB

24/02/2020 04h00

O Carnaval de Olinda (PE) é uma das maiores festas populares do Brasil. Somada a de Recife, a festança reúne mais de um milhão de pessoas, espalhadas em centenas de blocos de rua tradicionais. Prevendo o abuso de álcool e outras drogas psicoativas, a Escola Livre de Redução de Danos organizou uma ação coletiva e abrirá a 1ª Casa de Redução de Danos para acolher e conscientizar foliões sobre o uso de substâncias psicoativas.

A Casa Fique Suave abrirá no número 155 na Ladeira da Misericórdia, um dos endereços mais movimentados durante o carnaval de Olinda. Por um valor antecipado, o folião terá água à vontade, comida, um espaço para descansar, acesso ao "Museu das Drogas" montado especialmente para explicar a história e os efeitos de substâncias, kits gratuitos com canudos, protetor solar, soro e outros insumos para consumo seguro de drogas.

A redução de danos, também conhecida como RD, é um conjunto de práticas e estratégias multidisciplinares voltadas para pessoas que consomem, abusam ou são dependentes de drogas psicoativas. No Brasil, ela é um tipo de abordagem aplicado no Brasil desde o fim dos anos 1980, especialmente no combate ao HIV e em políticas públicas para dependentes químicos — como a operação "De Braços Abertos", realizada durante a gestão do ex-prefeito Fernando Haddad na Cracolândia.

O trabalho de um redutor de dano envolve estabelecer um vínculo com a pessoa, no sentido de promover o autocuidado e assegurar que o usuário tenha acesso aos seus direitos humanos básicos. A estratégia é formada por micro-ações, desde conscientizar pessoas a não dividirem agulhas, até abrir um espaço seguro de discussão sobre o consumo de substâncias.

Ingrid Farias, coordenadora da ação, frisa que a ideia não é estimular o consumo de drogas. "Muito mais perigoso do que o uso de drogas é o desconhecimento total sobre elas. A gente quer garantir o direito básico das pessoas à saúde, especialmente em festas em que o abuso de álcool e outras substâncias acontece. Todas as festas brasileiras, inclusive as festas religiosas, são regadas a álcool. A gente é favor de que as pessoas tenham informação. Não estimulamos o uso de drogas em nenhum momento", explica.

Desde 2019, a redução de danos deixou de ser uma diretriz na política de saúde do governo federal, mesmo que seja apontada como a forma mais eficaz no combate à dependência química. Hoje, a principal tática defendida por Osmar Terra, então ministro da Cidadania, é a abstinência e a internação compulsória.

No entanto, a redução de danos ainda é prevista no artigo 20 da Lei nº 11.343 de 2006, conhecida como "Lei das Drogas". Para a psicóloga Maria Angélica Comis, a redução de danos na prática continua em vigor, apesar de que nunca tenha sido efetivamente aplicada pelo poder público.

"Mudou a orientação do governo, mas efetivamente não houve essa proibição à política. Óbvio que impacta sua aplicação, ainda mais agora que estão questionando o tratamento de HIV, por exemplo", diz Comis, que coordena também Centro de Convivência É de Lei, uma das organizações que participaram da idealização do projeto em Olinda.

A casa Fique Suave tem capacidade para 70 pessoas por dia e o ingresso varia de R$ 80 a R$ 350 pelos quatro dias. Além do espaço da Ladeira da Misericórdia, a Escola Livre de Redução de Danos promoverá a distribuição gratuita de kits de redução de danos no carnaval de rua.

Para Farias, a ideia de inaugurar a casa no Carnaval de Olinda e abrir o jogo sobre o consumo consciente de substâncias é uma forma de "provocar" o poder público a fazer iniciativas parecidas. "A gente gostaria que essa iniciativa fosse realizada pelo poder público, especialmente porque é uma festa onde a gente sabe que as pessoas estão fazendo uso de drogas, especialmente de álcool. Precisamos falar sobre o uso de drogas em Olinda e vamos fazer isso, mesmo com a ausência do poder público", ressalta.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado na versão original deste texto, a casa de redução de danos não realizou testagem de drogas durante o Carnaval, por ordem da Polícia Civil. O texto já foi alterado.