Tem artista tentando burlar o atual domínio da tecnologia no nosso cotidiano para produzir um conteúdo questionador. "Arte é vida, e vida é arte. E não tem como pensar nossa vida sem a tecnologia", afirma Cesar Baio, artista, programador, professor do Instituto de Artes da Unicamp e autor do livro "Máquinas de Imagem: Arte, Tecnologia e Pós-virtualidade". "A programação se tornou um campo para a arte. O objetivo é entender como a tecnologia pode nos ajudar a repensar as nossas atitudes", diz.
Para simplificar, aqui vai um exemplo. Baio tem um projeto artístico que funciona pela insistência do artista em desrespeitar o que a tecnologia manda-o fazer. Em um app de localização no celular, ele define um ponto de partida e um de chegada, mas, na hora de seguir o caminho, sempre toma a direção oposta à determinada pelo aplicativo. O resultado fica salvo na tela do celular e mostra essa disputa de vontades entre o ser humano e a máquina.
"O que eu coloco [em questionamento] é como a gente usa e como produz tecnologias que, em vez de nos distanciar da nossa humanidade, possam nos aproximar dela", diz Baio. "O que resulta no GPS para mim é um desenho muito especial. Não fui eu que desenhei. A forma é decidida a partir de uma tensão entre o que eu quero fazer e o que a máquina quer que eu faça."
Alessandra Montini pensa da mesma forma. Com o avanço da IA, diz ela, "você vai fazer o ser humano ser um ser humano. Parou essa coisa de só fazer trabalho repetitivo. Vamos estimular aquilo que é mais importante: a imaginação."
Criatividade é a habilidade de inventar ideias que são novas, surpreendente e que tenham valor
Margaret Boden, professora e pesquisadora da Universidade de Sussex (Reino Unido)
Pode ser que a gente nunca considere algo produzido por um computador como arte, pela própria natureza do campo e pela dificuldade em definir a intenção e consciência da máquina. "Arte para mim é um fator muito cultural, não depende só de criatividade, de inteligência. É um lugar questionador", opina Silvia Laurentiz.
Mas a criatividade está também em outros campos. E em um deles a IA impressionou ao cruzar um limite.
Em março de 2017, o AlphaGo, criado pelo Google, fez uma jogada inesperada no jogo de tabuleiro Go, considerado um dos mais complexos do mundo. A inteligência artificial ganhou do então melhor jogador do mundo, deixando alguns humanos frustrados com seus próprios limites e, outros, esperançosos com o quando podemos aprender com as máquinas.
Marcus du Sautoy está entre o último grupo. Professor da Universidade de Oxford escolhido para advogar pela causa da compreensão pública da ciência, ele defende que a IA vai nos ensinar a entendê-la, em entrevista para a revista New Scientist. Assim como diversos pesquisadores da área, du Sautoy estudou cuidadosamente o movimento do AlphaGo que mudou as bases da criatividade de máquina como a conhecemos, e não tem receio em dizer que o considera criativo.
Para Sautoy, usar a IA na arte pode ser uma forma de deixá-la se expressar mais livremente e, consequentemente, entendê-la melhor. Mas ele não tem nenhum receio quanto à "substituição" dos humanos pelas máquinas no campo artístico. Pelo contrário. "A IA que estamos criando vai nos empurrar criativamente como humanos. Nós ficamos presos em comportamentos, regras, nos comportando muito mecanicamente. E a IA vai nos oferecer ideias para nos tirar dessa zona de conforto para algo novo", acredita o professor.