As noites são alaranjadas como um crepúsculo. Os dias amanhecem cobertos de pó preto, e as pessoas e os cachorros vivem sonolentos. Na tríplice divisa entre os municípios de São Paulo, Santo André e Mauá, a megalópole preserva seu caráter industrial e seu efeito colateral: a poluição.
Nas últimas décadas, enquanto o polo petroquímico de Capuava se expandia, a população se adensou no entorno. "Escolhi morar aqui porque meu olho cresceu quando vi tanta indústria por perto: ia ter trabalho. No final, o que a gente conseguiu mesmo foi ficar doente", lembra a diarista Dorotéia de Oliveira Silva.
Em sua sala, a mesinha de canto já dá o diagnóstico: os retratos da família dividem espaço com as caixas de remédios. Todos ali têm problemas respiratórios. Além da tosse contínua, Ellen Cristina, a filha mais velha, acumula também sangramento no nariz e pele empipocada, o que obriga a jovem a perder muitos dias de aula.
A família de Dorotéia ficou presa nessa atmosfera doentia porque financiou em 10 anos seu apartamento pelo Minha Casa Minha Vida e, pelas regras do programa federal, não pode vendê-lo. "Pelo que oferecem por esse apartamento, só consigo comprar um barraco em favela", lamenta.
Cristiane Dantas, mãe solo e liderança de movimento por moradia na zona leste paulistana, vive drama semelhante. Ela está entre as 700 famílias cadastradas para um conjunto habitacional já aprovado e que vai ser construído colado ao polo. "Temo pela saúde do meu filho, mas foi a única chance de sair do aluguel que encontrei. Se tivesse condições, iria para fora de São Paulo. Mas o jeito é ficar e lutar para melhorar o ar e o atendimento médico por aqui." Histórias como essas mostram que a poluição é mais um subproduto da desigualdade no Brasil.