TAB: Aliás, da última vez que conversamos, você dizia estar preparando um novo filme -- e a temática seria ambiental. Como está essa empreitada?
Fernando Meirelles: Ainda estou escrevendo o roteiro com o Braulio Mantovani [trabalharam juntos em "Cidade de Deus", entre outros]. É um filme sobre a crise do clima, minha obsessão, não consigo evitar. Um filme para adolescentes que se passa em muitos lugares do mundo. O fato é que se você está preocupado com a Covid-19, melhor mudar a chave. Esse vírus é uma titica com data para acabar. Deve gerar uma crisezinha na humanidade, que vai durar uns quatro ou cinco anos, muito mais pela radicalidade das medidas tomadas do que pela letalidade em si, mas depois a vida segue -- um pouco transformada, espero. É claro que, olhando hoje, o que chamei de crisezinha sentimos como uma tragédia histórica. E, de fato, é. Mas comparada à outra, que pode simplesmente colocar fim na história, os cinco anos de crise parecem pouca coisa. É com esta perspectiva que estou falando. Não quero parecer engraçadinho diante do possível milhão de pessoas que morrerão, se é que vá chegar aí, mas a crise do clima é de outra dimensão. É só mais lenta, o que a torna meio invisível. Mas é definitiva e vai escalar continuamente, até uma possível extinção da civilização como conhecemos, e vai doer. Há muita gente tranquila porque acredita que a ciência vai dar um jeito no aquecimento global, "o Bill Gates deve estar pensando em alguma coisa". Só que não. Isso é pensamento mágico, é como fazer jejum para o novo coronavírus ir embora. A ciência tem, sim, muitas maneiras de mitigar a velocidade do aumento da temperatura na atmosfera e podemos ganhar tempo, mas parece que não estamos suficientemente interessados no futuro.
TAB: Considerando o desrespeito do ser humano com os recursos naturais, podemos imaginar que outros vírus assim não tardarão a aparecer?
FM: E se o vírus for o anticorpo do planeta? Li essa pergunta em algum lugar e me pareceu fazer sentido nesse meu momento holístico. Gaia tentando se livrar de um patógeno, nós. Mas também já andei lendo que há grande possibilidade de esse vírus ter sido criado como arma biológica no laboratório do exército norte-americano em Fort Detrick, no estado de Maryland, nos Estados Unidos. Se for isso, a teoria do anticorpo contra o patógeno perde o sentido. Gaia pode ter enlouquecido alguns humanos intencionalmente, fazendo-os gostar de arminhas, incluindo as biológicas, para induzi-los a um erro autodestrutivo. Juro que também considero essa possibilidade.