Um dos piores dias da vida de José da Conceição cheira mal. Foi no fim da década de 1980, quando andava pelo pátio de uma das Colônias do Hospital Psiquiátrico do Juquery, em Franco da Rocha (SP), onde trabalhava como auxiliar de enfermagem havia quase 20 anos.
Conceição tinha acabado de ser transferido do Manicômio Judiciário para uma das Colônias Masculinas — que ficava afastada das demais unidades do hospital — e testemunhava o começo do desmonte do Juquery, que entre os anos 1960 e 1970 chegou a ter mais de 15 mil internos.
Naquele mundaréu de gente, seus olhos miraram um homem nu em um canto imundo. O paciente o reconheceu e veio ao seu encontro, com as mãos cheias de fezes. O homem era Zé Carlos, ex-auxiliar de serviços gerais e cantineiro informal. Vendia quitutes para os funcionários e visitantes do Juquery em época de festa junina.
Não são poucos os funcionários do Juquery que viraram pacientes, mas a imagem ficou marcada à brasa na memória de Conceição. O ex-colega falava e agia como se ainda fosse cantineiro, e apontava para um montinho de fezes no canto. Eram os "doces" juninos que estava preparando, como nos velhos tempos.
De imediato, o capa-branca (apelido dos funcionários do Juquery, por causa do uniforme) se afastou de Zé Carlos e abandonou o plantão. Não queria mais voltar. Foi quando percebeu até que ponto o ambiente pode mexer com a cabeça de quem entra ali.