CADA VEZ MENOS LILÁS

Ondas de calor e mudanças climáticas fazem a lavanda quase desaparecer da Provença, no sul da França

Paloma Varón (texto) e Gabriela Burdmann (fotos) Colaboração para o TAB, de Ferrassières (França)

Visitar a Provença no verão europeu é uma experiência sensorial inesquecível. A imensidão dos campos floridos não deixa ninguém duvidar: aqui é o reino da lavanda. Ou era. Esse reinado está em decadência.

O perigo não vem apenas da visitação dos turistas e dos ataques de insetos, principal inimigo dos agricultores, mas das secas e geadas cada vez mais imprevisíveis.

"Não sei se estaremos aqui em dez anos", declarou o agricultor Michel Blanc, 56, à reportagem do TAB. A frase espanta, não por seu sentido filosófico — afinal, ninguém sabe onde estará em dez anos —, mas porque a urgência climática ameaça seu modo de vida. Os "acidentes climáticos", como Blanc nomeia as geadas e as ondas de calor, têm feito estragos consideráveis na plantação mantida pela família.

A reportagem visitou os campos provençais no fim de junho. Fazia 37°C, temperatura extrema para a região, e a seca vinha desde maio. Resultado: plantações mais "peladas" que de costume.

De origem persa, a lavanda cresce naturalmente nas colinas da Provença e passou a ser cultivada no fim do século 19. O "turismo da lavanda", por sua vez, só surgiu mais de um século depois.

O cultivo sustenta centenas de famílias, que plantam para extrair óleo essencial e venda direta de flores. Entretanto, a área plantada está em constante declínio no país, que perdeu o posto de maior produtor mundial para a Bélgica.

Uma recente reportagem do canal de televisão France 3 afirmou que, nos últimos anos, os vastos campos de lavanda na Provença estão sendo substituídos por uma planta conhecida como "imortal" (Helichrysum italicum): amarela e com cheiro de curry, ela alcançaria melhores preços no mercado de plantas aromáticas.

Formado em agronomia, Michel Blanc tentou trabalhar na cidade, até voltar às origens e fazer do cultivo de lavanda seu ganha-pão a partir de 1993. "Quando se nasce num lugar como esse, a gente é naturalmente levado a isso, mas a lavanda é uma planta extremamente difícil. Ela pode trazer bastante felicidade e muita tristeza também", afirma o agricultor.

A lavanda não é uma cultura anual, como os cereais. "Se você perde um ano, é o fim de toda a plantação. E ela não se fixa em qualquer lugar; a gente não pode dizer: 'vou plantar aqui'. Não funciona assim."

Como outros agricultores de lavanda ouvidos pela reportagem, Alain Aubanel, 58, se preocupa com o futuro. "Este ano, estimo minhas perdas em 40%, 50%", diz ele. A produção vem diminuindo a cada ano, assim como o tempo de vida de uma plantação — antes era de 14 anos e agora baixou para menos de uma década. "Era bom quando nevava no inverno, porque a neve protege a lavanda do frio extremo, que, na minha região, chegava a -25ºC. Agora chega a -10ºC, mas com pouca ou nenhuma neve", conta.

Eliane Bres é presidente da cooperativa France Lavande, que reúne 120 agricultores de lavanda, e confirma o cenário. Produtora de lavanda fina em sua fazenda de 35 hectares, em Brette, diz que 2022 "não está bonito para a lavanda". Para Rudy Usseglio, produtor em Rebest-du-Bion, o desassossego é o mesmo. "O mais inquietante é que isso não vai parar, as mudanças climáticas vieram para ficar. E enquanto as pessoas não forem impactadas financeiramente [pelas mudanças climáticas], não têm consciência."

Aubanel trabalha com lavanda "desde sempre": terceira geração de agricultores — a produção começou com seu avô nos anos 1920 —, ele está formando a quarta: tem um casal de gêmeos de 23 anos e espera que ao menos um venha trabalhar na administração da fazenda. Aubanel tem 30 hectares em Chamaloc, nos quais planta lavanda fina (Lavandula angustifolia) e lavandim (Lavandula latifolia).

Margherita, mãe de Michel Blanc, nasceu em 1945 na Itália. A família pobre da região de Bérgamo imigrou para a França em busca de uma vida melhor.

A família colhia lavanda selvagem nas colinas provençais. A planta ia bem no terreno favorecida pelo clima seco, com invernos chuvosos e frios, com dias de neve (que já não cai mais, mas caía nos anos 1970 e 1980), e verões quentes — que não passavam dos 32°C e agora facilmente chegam aos 38°C.

"Atualmente, colhemos lavanda de 15 dias a três semanas antes do previsto, comparado a 20 anos atrás", explica Margherita. Casada com um francês, ela se mudou para um castelo do século 13, o Château de la Gabelle, adquirido pela família Blanc em 1838, depois da Revolução Francesa, quando muitos castelos estavam abandonados.

Na época ainda não havia os campos de lavanda, mas uma floresta em torno do castelo. Apenas no século 20, a área foi alugada a fazendeiros, que desmataram a floresta e começaram o cultivo.

O jovem casal se instalou no castelo em 1963, mesmo ano em que deram à luz o primogênito de sete filhos, Jean-Paul, que hoje trabalha com o irmão Michel nas terras da família, assim como seus três filhos, netos de Margherita.

Michel comanda a empresa familiar, que exporta o óleo essencial de lavanda para diversos países, como Estados Unidos, Canadá, Austrália e Japão. "Fui ninado pela lavanda. Esse cheiro, essa paisagem, esse cultivo, tudo isso faz parte de mim", resume ele, que nasceu num 14 de julho — dia da Queda da Bastilha e também o auge do florescimento da lavanda, pelo menos até tempos atrás.

Na propriedade dos Blanc, assim como em toda a Provença, são cultivadas as duas espécies de lavanda: a fina é usada em óleos essenciais, buquês para decoração e sachês com as flores secas. O lavandim é sempre transformado em óleo essencial e, por ter odor mais acentuado, aromatiza produtos de limpeza.

A plantação e colheita dos Blanc, antes totalmente manual, há alguns anos tornou-se 100% mecanizada. A produção, contudo, não aumentou, por causa das perdas sazonais cada vez mais frequentes. A família conta com a ajuda de uma cooperativa de agricultores para fazer a destilação da lavanda. Em seguida, o óleo segue para seus diferentes usos nas indústrias de perfume (a cidade de Grasse, no sul da França, recebe a maior quantidade), farmacêuticas e alimentícias.

Toda segunda-feira, às 8h da manhã, os Blanc fazem o planejamento da semana num escritório montado dentro do galpão das máquinas. O teto é forrado de painéis solares. "Se chover esta semana, a gente fica mais calmo, porque vai desacelerar a floração e melhorar a colheita", torce Michel, enquanto o sobrinho Rémy, 31, checa no celular a previsão do tempo.

"Aqui a gente não olha a probabilidade de chuva. O que nos interessa são quantos milímetros, porque se chover pouco não faz diferença, sobretudo se a chuva vier acompanhada do [vento] Mistral, que resseca tudo", completa Rémy.

Filho mais velho de Jean-Paul, Rémy conta que, quando era criança, gostava de ajudar na colheita. "Tenho boas lembranças. Um grupo de 30 espanhóis vinha no verão para isso. Agora não temos mais esse contato humano", reflete. Para a colheita dos buquês, em geral aparecem estudantes franceses para ajudar. "Recebemos muitos jovens que vivem de trabalhos temporários — depois da lavanda eles fazem a de maçã, de uva...".

Em junho, quando a reportagem do TAB esteve com os Blanc, o quilo do óleo essencial de lavanda fina valia 120 euros (cerca de R$ 670). O lavandim tem preço muito menor: 10 euros o quilo (cerca de R$ 55), por causa da superprodução de 2020 e 2021 (ao contrário de outros setores, a agricultura da região não sofreu com os anos de pandemia de covid-19). A má colheita de 2022 deve dobrar seu preço.

Uma coisa é consenso entre os produtores: a lavanda está em perigo. "Faz dois anos que pagamos caro pelas mudanças climáticas. As pessoas só vão mudar seus hábitos quando os efeitos da crise climática forem sentidos nas cidades, nos bolsos e geladeiras", reflete Michel, pensativo, olhando para o céu e para o horizonte.

Tem cada vez menos azul por aqui"

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