A trilha na mata tem pirilampos, palmeiras e rumores de grilos e rãs. Já não se escuta o mar. A serra se vê ao longe, enquanto a noite adensa. De repente, um tumulto na vegetação interrompe a calma. Há alguém ali.
É uma multidão de urubus, que pousam e ficam empoleirados nas árvores. O matagal esconde mais seres: luzes andarilhas descem o morro vizinho. São catadores voltando do lixão.
"Não quero foto, não. Tenho vergonha de fazer isso", vai logo avisando Anderson, 22, com o rosto oculto pelo raio que emite da testa. Como outros trabalhadores, ele conta sua história, mas não quer dar a cara nem o nome completo.
Anderson vivia na Bahia colhendo maracujá. "Aí, meu tio me chamou para ajudar aqui. Tiro R$ 50 por noite, o dobro que recebia na roça", resume sua presença por lá, antes de pegar a bicicleta e sumir pelas ruas de terra e pelo acostamento da rodovia SP-55, até o bairro Jardim Caraguava, onde a maioria deles mora.
O aterro de Peruíbe, no litoral sul paulista, foi inaugurado em 1992, mas o descaso público comprometeu sua manutenção. O local chegou a ser condenado pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) em 2009. Reaberto e com administração privada, hoje recuperou sua infraestrutura, com impermeabilização do solo e coleta de líquidos e gases, como um aterro sanitário deve ter. Apesar disso, há ainda uma grande porção de lixo ao ar livre, como conferiu a reportagem do TAB.
Os lixões não deveriam mais existir no país desde 2014, data limite determinada pelo Plano Nacional de Resíduos Sólidos, aprovado em 2010 pelo Congresso Nacional. Mas essa sujeira continua, para a vergonha de Anderson e do país todo.