No Cemitério da Consolação, o ex-coveiro Francivaldo Gomes, o Popó, circula pelas ruelas enquanto cita de cabeça fatos históricos sobre os ilustres mortos que moram no cemitério mais chique da cidade. Durante aquele passeio, no entanto, Popó nos levou até dois jazigos: Maria Judith de Barros, a milagreira dos universitários, e Antônio da Rocha Marmo.
Antônio Marmo, o Antoninho, ocupa outro patamar. O menino católico, levado pela tuberculose aos 12 anos em 1930, está em processo de canonização desde 2007. Atualmente, ele é definido como "servo de Deus" pela Igreja Católica.
"Tá vendo aquela placa ali?", apontou Popó para o túmulo de Antoninho. "Sabe quem é B.B.? É Beto Barbosa, o cantor".
Sim, o Rei da Lambada confirmou as placas de agradecimento. "Hoje não frequento tanto, mas em todas as cidades em que fui, procurei um cemitério. Na Consolação procurei as almas mais antigas, espíritos de luz e iluminados, já purificados, para sentar perto e rezar", conta.
A relação do músico com milagreiros começou em Belém nos anos 1980. Beto era jovem e estava sofrendo por amor — a ponto de cogitar dar cabo à própria vida. Até o dia em que resolveu entrar no principal cemitério da cidade. "Eu tinha medo até de passar perto, mas foi o único lugar em que me sentia bem."
Foi assim que deparou com um túmulo recente, com a foto de uma jovem bonita que aparentemente morrera de amor. Ela não era uma milagreira, mas causou impacto em Barbosa. "Naquele momento, pedi a Deus para que aquela angústia saísse de mim. E ela se foi, junto com a vontade de morrer. Passei a visitar constantemente o cemitério", relata.
No mesmo cemitério, Barbosa também virou devoto de Josephina Conte, jovem morta em 1937 que ficou conhecida como "a Moça do Táxi". Esta também foi responsável por dar rumo à vida do cantor. "Pedi muito que ela mostrasse uma nova profissão, um novo caminho. Quando ganhei meu primeiro disco de ouro, o deixei na secretaria do cemitério como agradecimento", conta.
Um fato difícil de ignorar: foi por causa da devoção à jovem que o Rei da Lambada compôs o hit "Adocica". Nas visitas ao jazigo, o jovem Beto conheceu a irmã da falecida, que virou sua namorada logo em seguida. "Fiz a música pensando nela", revela.
Mais uma graça alcançada, então, tem que entrar na conta dos milagreiros do cemitério do Brasil: o sucesso estrondoso da lambada.