A questão que se apresenta ao se aprofundar no assunto é: se as substâncias psicodélicas são tão eficientes assim, por que são tão marginalizadas? Para Sidarta Ribeiro, uma das respostas pode estar na falta de interesse da indústria farmacêutica. "Essas substâncias vão agir a partir de uma, duas ou três doses, então não há um negócio da China aí. Quem vai ganhar dinheiro com isso não são as grandes farmacêuticas, mas sim, no máximo, alguns poucos terapeutas. Será que interessa para a indústria que as pessoas parem de se tratar com remédios diários?", questiona o neurocientista.
Junta-se a isso a eficiência ideológica da guerra contra as drogas, que colocou substâncias do tipo ao lado de narcóticos destruidores como a cocaína e o crack. Mas o preconceito não é recente. "Muitos povos antigos já se entregavam a longos períodos de êxtase, ao dançar e cantar para viajar no tempo e no espaço aos reinos profundos e além da imaginação", explica o xamã Léo Artese, que há 28 anos desenvolve trabalhos na área, em eventos e festivais.
Ao longo da história, esse estado de êxtase guiado pela música foi interpretado como ameaça por muitos governos, com menção especial aos colonizadores europeus que viam com escárnio qualquer manifestação "não civilizada". No livro "Dançando nas Ruas" (Ed. Record), a escritora Barbara Ehrenreich lembra que, em 1884, por exemplo, autoridades britânicas baniram o uso dos tambores em Trinidad e Tobago, por considerarem-no subversivo, proibindo também a dança, as procissões e as assembleias com mais de 10 pessoas "munidas de paus ou outras armas". Em 1902, as forças de ocupação americanas vetaram os tambores de origem africana em Cuba, ampliando o veto a "todas as danças cerimoniais afro-cubanas" por "serem símbolo de barbárie e perturbadoras da ordem social".
No fim do século 18, os taitianos usaram uma de suas festas tradicionais para zombar de padres que haviam tentado convertê-los. Décadas depois, eram os padres quem comemoravam a contenção da "leviandade natural dos nativos". Em 1820, os taitianos já usavam roupas europeias e não dançavam, nem cantavam. A eles, só restava beber licor, que também tinha sido oficialmente proibido. Eram os tristes trópicos lamentados pelo antropólogo Claude Lévi-Strauss, nos anos 1950. "Um cenário de culturas rotas, economias arruinadas e populações melancólicas dispostas ao suicídio e entregues ao alcoolismo", escreveu Ehrenreich.