Para lidar com sentimentos ruins e traumas, Laura Pini, 19, passa a agir como uma criança. Laura, que prefere ser identificado com o pronome masculino, realiza regressões infantis junto de um caregiver, Rodrigo*, amigo que conheceu pela internet e que assume a posição de cuidador e auxiliar.
A reportagem do TAB presenciou o episódio. Por uma chamada de vídeo, víamos Laura sobre a cama, de pernas cruzadas, usando um macacão jeans e uma tiara no cabelo. Na boca, revezava três mordedores infantis coloridos, emitia sons guturais e gargalhadas.
Minutos depois, apareceram na tela outros objetos que Laura ia garimpando, na ânsia de distração: mamadeira, urso de pelúcia, boneca, chocalho. Como um bebê, mexia as mãos de forma desengonçada e mantinha os olhos arregalados enquanto explorava os detalhes do que tocava.
Durante mais de uma hora, seu cuidador ficou pouco em silêncio. Mesmo distantes fisicamente -- Rodrigo mora no Rio; Laura, em Valinhos (SP) --, o caregiver de 18 anos agia como um pai orgulhoso que ri das traquinagens do filho e não pode desviar a atenção. "Cuidado para não se machucar"; "não bota o mordedor muito fundo senão vai passar mal"; "não pode colocar a boneca na boca, só o tetê". Laura soltava palavras indistinguíveis quando incentivado. "Consegue falar buraco?" -- "o caco". "Qual música está cantando?" -- "vilaéamo", o que Rodrigo traduziu como Vila Sésamo.
Os sinais de que estávamos diante de um adulto apareciam na destreza ao segurar os objetos; na tatuagem de Hello Kitty na mão de Laura, ou no piercing medusa no lábio superior, que brotava quando a chupeta escorregava.
A chamada chegou ao fim quando os bocejos se tornaram constantes. "Tem certeza de que não está com sono?", indagou Rodrigo, enquanto Laura balançava a cabeça negando, ao mesmo tempo em que deixava uma fralda de pano passear pelo rosto. Resistiu por pouco tempo. Logo dormiu.