Mas como diversificar uma cultura se toda uma economia é baseada nela? Esse dilema permanece mesmo com a produção de gado sendo a principal causa de desmatamento da Amazônia. Em julho de 2018, o SAD (Sistema de Alerta de Desmatamento), apontou 778 quilômetros quadrados de desmatamento na Amazônia Legal, um aumento de 27% em relação ao mesmo mês do ano anterior. O Brasil é o sexto maior consumidor de carnes do mundo, de acordo com o levantamento feito em 2017 pela OCDE (Cooperação e Desenvolvimento Econômico). A posição é a mesma há quatro anos e marca o consumo de cerca de 78 quilos de carne per capita ao ano. A produção de carne bovina é a segundo maior no mundo, com 9,5 milhões de toneladas, ficando atrás apenas dos EUA, que produz 12,08 milhões de toneladas — os dados são do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos).
Em 2017, a agropecuária foi o segmento que mais cresceu no Brasil gerando empregos diretos e indiretos na indústria da carne. Erik Gargalis, 30, faz parte dessa cadeia. Vegetariano por quatro anos, voltou a comer carne e hoje administra o negócio da família. Trata-se da “Esquina do Grego”, em Guarulhos, cuja principal atração são espetinhos de carne. “Eu adoro carne! Vender espetinhos é a tradição da família. Meu pai ficou 14 anos nesse ponto que eu estou hoje. Ser vegetariano foi uma coisa de momento, uma experiência bacana, um teste, uma provação”, explica Gargalis.
“O churrasco é uma superinstituição brasileira. Seja o gourmet ou o feito na laje. É um momento de sociabilização e, mais do que isso, é um momento de compartilhamento de fartura”, lembra a antropóloga alimentar Paula Pinto e Silva, que ressalta: “Comer carne diariamente não é a realidade de toda a população brasileira. É a realidade de uma parcela. Tem gente que quer comer carne todo dia, pois entende que isso é um valor, e este é um valor dado por uma cultura. Quando se tem um pouco mais de dinheiro, compra-se mais carne”.
Quanto mais se ganha, mais carne se compra, explica Felippe Serigati, economista e pesquisador do FGV Agro. “Normalmente, um aumento de renda tende a aumentar a demanda de um bem. Dentro do universo agro, esse aumento da demanda se dá de forma mais intensa nas carnes”. Paula Pinto e Silva defende que há uma hierarquia de status na comida. “A ‘mistura’ do prato fala daquilo que eu posso comer e o outro não pode. Dentro da própria carne há essa hierarquia de valor. Há pedaços que são mais caros que outros. A picanha tem um valor de galgar posição. Se eu não tenho muito dinheiro, eu vou para a maminha, se tenho, vou para picanha. Nessa equiparação de valores, quem vai querer servir berinjela?”. No Brasil, veganismo pode não ser coisa de rico, mas comer carne segue sendo ostentação.