Banha de lagarto salvou a vida de Josias de Oliveira. Para transformar a gosma em remédio, é preciso arrancar a gordura da carcaça e cozinhá-la durante horas em banho-maria.
Josias não sabe que tipo de aranha o picou em um dos dedos da mão. Talvez tenha sido uma armadeira. Mas sabe a receita de banha de lagarto. Sua mãe o ensinou. Ela morreu faz tempo, mas ele nunca esqueceu. Já não ouvia nem enxergava direito quando se arrastara para dentro de casa. O veneno fazia efeito e rápido. Josias lembrou da gosma amarelada guardada em um potinho. Bastou lambuzar um pouco a picada.
"Era muita dor, muita dor. Pensei: 'vou morrer'. Aí passei a banha de lagarto assim, ó, e passou na hora", lembra ele, mostrando o potinho cheio de milagre viscoso. Um médico até já lhe encomendou banha de lagarto. Josias é grato por ter seguido as instruções da mãe. Não lhe restavam alternativas.
O hospital de grande porte mais próximo está a quase 90 quilômetros de distância, na cidade de Pariquera-Açu (SP). Quando a aranha cravou as presas no dedo de Josias, não havia sequer uma farmácia, posto de saúde ou vizinho onde pedir socorro. Josias tem apenas as memórias como companhia e, no último instante, foi a elas que recorreu.
Foi um episódio de justiça cósmica, o da aranha. Josias escolheu viver isolado para se sentir próximo à mãe, e sua mãe o salvou.
Ele foi, durante cerca de dez anos, o zelador de uma vila abandonada. Ararapira, no Paraná, na divisa com o litoral de São Paulo. Muitos a chamam de cidade-fantasma, mas Josias odeia que falem de fantasmas desde que uma equipe de TV desembarcou por lá, em 2018.
Em vez de contar a história da vila, a reportagem só falou de assombrações. Josias nunca viu uma. "Meu pai e minha mãe me criaram aqui. Eu amo Ararapira. Esse lugar é minha vida", explica Josias, enquanto come carne defumada com batatas feita no fogão a lenha. "Foi aqui que eu tive educação. Uma mãe que me deu carinho e conselhos muito bons. É o que me resta hoje, e não tem dinheiro que pague."