Dias atrás, durante um evento musical no qual trabalhava como produtora, em Lisboa, a carioca Ana Paula Vulcão puxou conversa com uma colega portuguesa. Dirigiu-se a ela por "você", pronome de tratamento pouco usual em Portugal — prefere-se a segunda pessoa do singular, conjugada como determina a gramática, quase sempre na forma oculta. Gostas, dizes, andas.
"Ah, vócê", devolveu a mulher, pronunciando a palavra em tom anasalado e com as vogais abertas, na tentativa de imitar o sotaque da interlocutora. "És mesmo muito brasileira", prosseguiu, rindo.
"Por acaso nasci no Brasil", confirmou Ana Paula, já meio irritada com a imitação e desconfiada sobre aonde aquele papo iria chegar.
"Mas estás em Portugal", retrucou a lisboeta, recomendando que, por viver no país, a colega deveria falar em "português" e não em "brasileiro" — maneira como alguns referem-se à variante latino-americana do idioma.
"Estou em Portugal, mas não deixei de ser brasileira. E não vou deixar de falar do modo como nasci e cresci falando", retrucou Ana Paula. A conversa encerrou-se ali.