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Minas cria taxa de cartório que vai para Colégio Notarial do Brasil de MG

Uma lei estadual de 2024 criou uma taxa inédita de cartório para transferência de veículos em Minas Gerais.

Os valores arrecadados com ela, porém, não ficam para os cartórios nem vão para os cofres públicos: são 100% destinados ao Colégio Notarial do Brasil - Seção Minas Gerais —entidade de classe que representa tabeliães de notas no estado.

O lobby de Minas Gerais, estado com o maior número de cartórios do país, influenciou a aprovação de uma série de leis recentes com "jabutis" (acréscimos que provocam distorções nos PLs originais).

Foi o que aconteceu com o projeto de lei 40/2023, que o TJMG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais) mandou para a Assembleia Legislativa do estado em dezembro de 2023.

O PL tramitou nas comissões de Administração Pública e de Fiscalização Financeira com relatoria dos deputados Roberto Andrade (PRD) e Zé Guilherme (PP), respectivamente.

Ambos são ligados ao lobby dos cartórios, revelou o UOL.

A taxa extra não estava prevista no PL original e foi incluída durante a tramitação do projeto na assembleia, em 2024.

Sancionada pelo governador Romeu Zema (Novo), a nova lei diz que é preciso consultar uma central eletrônica num cartório para fazer reconhecimento de firma autorizando a transferência de um veículo.

Antes, a consulta era facultativa e feita gratuitamente.

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BRASIL DOS PRIVILÉGIOS

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A central eletrônica, diz a lei, é administrada pelo Colégio Notarial do Brasil - Seção Minas Gerais.

Colégio Notarial do Brasil - Seção Minas Gerais divulga plataforma CNTV
Colégio Notarial do Brasil - Seção Minas Gerais divulga plataforma CNTV Imagem: Reprodução/CNB-MG

Mais privilégios

A central eletrônica é a CNTV (Central Notarial de Transferência Veicular), divulgada pelo CNB-MG (Colégio Notarial do Brasil - Seção Minas Gerais) meses antes da aprovação da lei, em julho de 2024.

Segundo Rogério Bacellar, presidente da Anoreg-BR (Associação dos Notários e Registradores do Brasil), a CNTV é "uma iniciativa pioneira de Minas Gerais, criada para desburocratizar, digitalizar e dar segurança jurídica à transferência de veículos".

Segundo documento acessado pelo UOL, cada consulta implica um repasse de R$ 4,80 para o CNB-MG.

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Além dos trâmites no Detran-MG (Coordenadoria Estadual de Gestão de Trânsito de Minas Gerais), que custam R$ 271, segundo a Seplag (Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão), é preciso pagar a taxa extra.

Embora seja uma taxa obrigatória aprovada pelo poder público, como se fosse um imposto, o beneficiário final é uma entidade de classe —que não precisa informar o quanto arrecadou e o que fez com o dinheiro.

O UOL apurou que o valor arrecadado pela CNTV não deve nem ser registrado nos livros de contabilidade dos cartórios: não conta como receita dos cartórios, vai direto para a associação.

Questionado sobre o número de consultas e o total arrecadado entre junho de 2024 e julho de 2025, o CNB-MG não respondeu.

Segundo dados da Seplag encaminhados ao UOL, ocorrem cerca de 2 milhões de transferências por ano no estado.

É possível estimar, então, quase R$ 10 milhões de repasses, por ano, para a associação.

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