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bebÊS CHORÕES

Como a internet ressuscitou a lenda urbana dos quadros com crianças tristes?

G. Bragolin

Se você estava por aí nos anos 1980 e 1990, deve se lembrar de ver pinturas melancólicas como essa na casa de parentes e até em sala de espera de consultório médico. Crianças choronas eram um hit da decoração

G. Bragolin

Desde essa época, os quadros têm má fama. São várias as histórias: a de que as crianças choram porque teriam sido mortas pelo pintor; a de que uma delas era amaldiçoada; e a mais forte, surgida na Inglaterra, de que os quadros causavam incêndios

G. Bragolin

Em 1985, o tabloide inglês The Sun publicou a história de um incêndio na casa de Ron e May Hall, na cidade de Rotherham. O casal atribuiu o fogo ao retrato de uma criança chorando, que permaneceu intacto no meio das cinzas 

Reprodução/The Sun

Na ocasião, o bombeiro Alan Wilkinson afirmou já ter visto incêndios assim, com um quadro de criança chorando preservado, se repetirem pelo menos 50 vezes desde os anos 1970. 

A maldição se espalhou feito fogo.

Reprodução/The Sun

O tabloide explorou a história a valer, e recebeu tantas mensagens que organizou, no Halloween daquele ano, uma queima coletiva de pinturas enviadas ao jornal pelos leitores

Reprodução/ The Sun

A maioria dos quadros era assinada por G. Bragolin (1911-1981), suposto pseudônimo de Bruno Amadio -- italiano ou espanhol, ninguém sabe sua nacionalidade. Franchot Seville é outro pseudônimo atribuído a ele

Massimo Polidoro

A escocesa Anna Zinkeisen (1901-1976) também produziu quadros do tipo. Reproduções eram populares em lojas de departamento inglesas, o que explica a presença dos quadros em tantas casas

Anna Zinkeisen

Reprodução/BBC

A história seguiu no imaginário até voltar nos anos 2000. Em 2011, o programa de rádio "Punt PI", da BBC, tentou incendiar um dos quadros. E ele não queimou!

Há duas especulações para a resistência das pinturas: eles eram impressos em compensados grossos que demoravam mais a queimar. Além disso, a camada de verniz tinha efeito anti-inflamável

Verity Holloway

Aqui no Brasil, a lenda não envolvia incêndios domésticos, mas chegou a rolar uma versão de que o pintor teria dado uma entrevista ao "Fantástico" revelando a maldição e pedindo para as pessoas se livrarem dos quadros

Massimo Polidoro

Ou seja, o pintor teria que ter voltado das cinzas para se pronunciar sobre a maldição... Anna Zinkeisen também morreu antes de a maldição se popularizar

A reportagem do The Sun, estopim da lenda urbana, foi publicada quatro anos depois da data a que da morte de G. Bragolin.

Ettore Chiereguini/Agif/Estadão Conteúdo

Um desdobramento do telefone sem fio é a narrativa de que um dos retratados era um garoto de rua adotado pelo pintor. Segundo um padre, o nome da criança era Don Bonillo, e ele teria visto seus pais morrerem em um incêndio. O apelido do garoto seria "Diablo"...

G. Bragolin

Segue a lenda: o ateliê do pintor teria sido destruído e Bonillo fugiu. Em 1976, um carro teria pegado fogo próximo a Barcelona. Na carteira do motorista carbonizado havia a identificação de Don Bonillo, 19 anos...

G. Bragolin

Segundo versões , a coleção de pinturas malditas tinha 27 quadros. Mas, numa busca rápida pela internet, é possível encontrar pelo menos 80 -- inclusive este, que parece ser o único Bragolin de uma criança sorrindo

G. Bragolin

A lenda ficou tão pop que foi uma das inspirações para o filme "Velvet Buzzsaw" (2019), com Jake Gyllenhaal, Rene Russo e John Malkovich -- disponível na Netflix

Divulgação/Netflix

Parte dessa história apareceu em uma thread de @arinoert. Se você já conhecia a lenda, fique tranquilo. Mas, se quiser passar para frente, saiba que estará espalhando algo que teima em não se apagar…

Reportagem
Tiago Jokura

Edição
 Luiza Sahd

Publicado em 4 de dezembro de 2020.

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