ARTE & DESIGN

DESLIMITES DA MEMÓRIA

O que acontece quando a modernidade da geração Z encontra a tradição da fotopintura

Cyro Almeida/ Mestre Júlio Santos

O projeto ‘Deslimites da Memória’ foi criado pelo artista visual Cyro Almeida, 36, em parceria com Júlio Santos, 76, um dos últimos mestres da fotopintura no Brasil

Divulgação

O conceito do projeto é o de encontro de temporalidades. Mostrar um rosto bastante atual, com traços de cabelos coloridos, tatuagem, piercing, alargador na orelha, mas com toda a plástica envolvida na fotopintura do século passado

Cyro Almeida, artista visual

A série de fotopinturas é fruto de uma amizade entre os artistas iniciada em 2011, após uma palestra do mestre Júlio Santos em Belém (PA). Desde então, Cyro e Júlio têm trocado conhecimento sobre a técnica

Cyro Almeida/ Mestre Júlio Santos

‘Deslimites da Memória’ foi feita em quatro etapas. Na primeira, Cyro Almeida mapeou em redes sociais fotografias, a maioria selfies, que demonstrassem traços contemporâneos no rosto da juventude

Cyro Almeida/ Mestre Júlio Santos

A segunda etapa envolveu a produção das fotos, tiradas por Cyro com câmera analógica dos anos de 1970, em película preto e branco de médio formato

Na terceira etapa, as fotos foram ampliadas em papel, em laboratório fotográfico analógico, em preto e branco. A única parte 'fotográfica' do negativo original reproduzida no papel foi o rosto

Na quarta fase, mestre Júlio finalizou as obras por meio da tradicional técnica da fotopintura, adicionando cor ao retrato e criando as vestimentas, acessórios e os cabelos

As obras foram produzidas seguindo o método original da fotopintura. Foi necessário importar papel fibra, feito de celulose com camadas de gelatina e sais de prata. Ele é o único fotossensível capaz de absorver as tintas necessárias na técnica

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Esse tipo de papel não se vende no Brasil desde o início dos anos 2000. A Kodak, por exemplo, fechou sua fábrica de insumos fotográficos analógicos em São José dos Campos, em 2005

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Mestre Júlio estava há quinze anos sem desenvolver a fotopintura do modo tradicional, com pigmentos (ele usa principalmente pastel seco). As obras dele, na atualidade, são feitas todas no Photoshop

Todas as peças foram pintadas à mão. Com esse papel, é a única forma de fazer hoje. Mas a gente vive de transição. Comecei a fazer fotopinturas na década de 1950 e agora estou no digital. A vida é assim, sempre de fazer transição

Mestre Júlio Santos

Foram 36 fotografados, desde 2016. Além das aparências físicas, interessou para os artistas as poses, o modo provocador e irreverente com que os jovens da geração Z se mostravam diante das câmeras

A livreira Bruna Tameirão, 25, foi uma das retratadas em Belo Horizonte. “Fui fotografada com um moicano laranja, cabelo que tinha na época, e não sabia como ficaria o resultado. Não conhecia a fotopintura. Me surpreendeu bastante ver essa mistura com as roupas antigas”, diz

Fiquei simplesmente apaixonada pelo resultado, para mim é um trabalho novo, nunca tinha visto nada parecido. Não sabia como era possível uma fotografia virar pintura. Hoje em dia é mais comum fazer o contrário

Emília Carmo, 20, operadora de telemarketing

'Deslimites da Memória' se transformou em uma exposição, inaugurada em março de 2020, no Museu Mineiro. A abertura teve palestra de Júlio sobre a produção das fotopinturas. Ficaria aberta até maio, mas  precisou ser interrompida em função da pandemia

Em 'Deslimites da Memória', brincamos com o olhar das pessoas. Ele deixa de ser frontal, como nas fotopinturas, e passa a ser oblíquo. A ideia era representar o modo como os próprios fotografados se expressavam na internet

Cyro Almeida, artista visual

A reabertura da exposição aconteceu em novembro de 2020, mas o Museu Mineiro voltou a fechar em janeiro por causa da pandemia. Há um tour virtual 360º disponível para ver as peças

Edição
Luiza Sahd

Reportagem
Alice de Souza

Publicado em 5 de março de 2021.