Guardiã ameaçada

Uma mulher preta propõe reflexões no meio do cinza da cidade, mas pode acabar sendo apagada por ação judicial

É difícil não ser impactado pelas obras da artista mineira Criola

Divulgação

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Através de grafites e murais em larga escala, ela joga, no meio da cidade cinza, reflexões sobre sua própria vivência. 

“É para retraçar um caminho imagético, de reconexão com a minha ancestralidade”, diz


Como neste mural de Nelson Mandela, no centro de São Paulo, colaboração com o artista Diego Mouro

Crédito da imagem, se necessário

“É sobre essa desconexão com a natureza, sobre a nossa falta de percepção de que somos a natureza, que a gente não é algo externo à ela”

Em tempos de pandemia, ela busca uma reflexão bastante atual em traços e colorido exuberantes

Madeira_photos/Divulgação

Suas obras começam sempre pela escolha das cores

“A arte urbana causa esses choques, quebra o cinza dos centros urbanos, faz com que as pessoas reflitam sobre seus papéis no mundo agora"

Área de Serviço/Cura

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Trata-se de uma mulher negra envolta numa cobra coral, segurando um útero na fachada de 1365 m² do edifício Chiquito Lopes

Desde 2018, sua maior obra, em termos de tamanho, tem causado esses choques no centro de Belo Horizonte

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Na época eu estava refletindo sobre o Brasil ser um país muito diverso, confluente de várias ancestralidades. A gente tem um pouquinho do mundo aqui e isso é bonito. A gente tem que tomar posse desse poder de ser uma mistura e curar aquilo que precisa ser curado que é nossa história feita a base de sangue de pessoas pretas e indígenas

Criola

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A mulher estampada no prédio
 é uma guardiã

“É um ser interdimensional que já chegou nessa compreensão de que nós somos a natureza, algo que estamos patinando para alcançar, muito por conta de um egoísmo enquanto ser humano”, diz a artista

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O útero na mão representa a natureza, o feminino. “É pra emanar essa energia que precisa ser firmada, e da qual a gente está distante.”

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A presença dessa guardiã híbrida espalha beleza no centro de BH, mas também fez com que o racismo de muitos viessem à tona

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“Híbrida Ancestral” corre
 o risco de ser apagada

Pelo menos é esse o pedido de uma ação ajuizada por um morador do prédio. Em suas próprias palavras: “Não é uma simples pintura, é uma decoração de gosto duvidoso"

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O autor da ação utiliza uma lei do regime militar (Lei nº 4591/1964), já superada pelo Código Civil de 2002, para sustentar que a realização da obra precisaria da aprovação unânime de todos os condôminos

“Só no final do processo de pintura que fiquei sabendo que corria o risco de ser embargada a obra”

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"Isso escancara o quanto o Brasil é extremamente racista, colonizador e atrasado, com uma autoestima extremamente baixa. Quem dita o que é gosto duvidoso? Muitos diziam que o cabelo de uma pessoa preta é ruim. Quem determina isso?", questiona Criola

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“Eu recebi muitos comentários dizendo que a obra era demoníaca. Falavam ‘o’ artista, nem enxergavam que uma mulher podia fazer uma obra dessa”, diz

Recentemente, em São Paulo, recebeu uma negativa de um condomínio por motivos semelhantes

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À espera de uma decisão da justiça, Criola segue pintando por aí, explodindo em cores,  ensinamentos e ancestralidade

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Mas de olho em sua guardiã:

“A minha expectativa é de isso gerar discussões de maneira positiva. E de que o mural fique”

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Edição
Luiza Sahd

Reportagem
 Tiago Dias

Publicado em 11 de janeiro de 2021