TV, 70 anos

O Brasil que passa
nas novelas de TV

Por Tiago Dias

Há 70 anos, a TV serve de espelho para o Brasil. “Ela capta, trabalha, devolve para sociedade e capta de novo”, diz Esther Hamburger, professora de Cinema e Audiovisual na USP

Seu crescimento e influência começa mesmo em 1968, ano em que “Beto Rockfeller” enterrou a ideia de adaptações literárias e propôs retratar as mudanças urbanas de São Paulo, com uma história original

'Beto Rockfeller' 

Com linguagem coloquial, a novela fez grande sucesso. “Pegou um formato 'feminino', num horário pensado para esse público, mas falando de todo mundo. A partir daí, a novela incorpora a ideia de modernidade”, diz Hamburger

Novela 'Beto Rockfeller', da TV Tupi

Em 1969, as transmissões de TV alcançam todo o país. A partir daí, as novelas passam a disseminar imagens de como as pessoas viviam em SP e no Rio, onde se concentravam histórias e produções

Todo mundo assistia e achava que aquilo que a telinha revelava era o Brasil moderno. “O Brasil sempre quis ser o país do futuro e a  televisão deu uma alavancada muito forte nessa ideia”

Cena do documentário “TV Olho”

Personagens andavam de escada rolante pela primeira vez e as mulheres eram retratadas como independentes -- fumavam, bebiam, usavam decortes e cabelos soltos

Em “Irmãos Coragem” (1970), primeira novela a alcançar o topo de audiência, há uma série de imagens que contrastam comportamentos.

Novela 'Irmãos Coragem', da Rede Globo

Não à toa, novelas sempre apresentaram novidades e tendências, como a moda disco em "Dancing Days" (1978)

Essas tensões representavam o movimento inexorável em direção ao moderno -- por aqui, um conceito bastante despolitizado e muito concentrado no consumo 

Novela 'Dancing Days', da Rede Globo

O milagre brasileiro está muito ligado à televisão, disseminando imagens de novos itens de consumo, mas também de comportamento

"Passa a mostrar mulheres que podiam trabalhar, que tinham sua vida amorosa independente, que estavam livres da autoridade do pai”, diz Hamburger

São apenas mãos, mas esta é considerada a primeira cena de orgasmo feminino da TV. “Ma-ra-vi-lho-so”, repete a personagem de Regina Duarte

A série “Malu Mulher” (1979) gerou polêmica, ao mostrar a personagem divorciada reivindicando seu prazer.

"Armação Ilimitada" (1985), com linguagem jovem e edição experimental, misturava repertórios e colocava no centro uma família heterodoxa: dois amigos surfistas, uma namorada em comum e uma criança

Os atores cadu Moliterno, Andrea Beltrão, André di Biasi e Jonas Bloch

“Relações entre os gêneros, estrutura familiar, o divórcio, o direito ao prazer da mulher. Isso tudo foi acontecendo na novela também", diz Hamburguer

Vera Fisher e Reynaldo Gianecchini, em 'Laços de Família', da Rede Globo

A pesquisadora cita “Vale Tudo” (1988) e a personagem Odete Roitman, vilã de cabelos curtos, figurino masculinizado, viajada, independente, que manipula os filhos e tem um gigolô

Beatriz Segall, em 'Vale Tudo', da Rede Globo

“Antecipam-se temas que depois viriam a ser tratados na conjuntura política, o que eu chamo de ‘consequências não antecipadas da modernização’”, diz Hamburger

Na novela de 1988, imagens da implosão de um prédio em SP, captadas pelo Jornal Nacional e comemoradas como grande feito técnico, são deslocadas para a abertutra no momento em que Gal Costa canta: “BRASIL”

"Pantanal" (1990) quebra o paradigma da novela urbana: produzida pela TV Manchete, chama atenção para o "coração do Brasil" e o ecossistema que hoje arde em chamas

Cristiana Oliveira, em 'Pantanal', da TV Manchete

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"Mostrou o subúrbio com cores positivas, um povo alegre que ia conquistando coisas na vida e fazia pouco de muitos hábitos estabelecidos na zona sul”, diz Hamburger

A tensão entre ricos e pobres é uma das convenções clássicas que foram subvertidas em "Avenida Brasil" (2012), sucesso dos últimos anos

 A sociedade foi transformada pelo que a gente viveu nos últimos 30 anos. As melhorias foram muito grandes. A TV atravessa esse período e vai mostrando -- e também puxando -- essas mudanças

Esther Hamburger, professora e pesquisadora de telenovelas

Murilo Benício, em 'Avenida Brasil', da Rede Globo

Os efeitos das imagens são permanentes, por isso é necessário tratar bem a memória. “Para sabermos mobilizar a TV para coisas mais interessantes e tentar inventar um futuro que leve em conta os desafios do Brasil", diz a pesquisadora.

'Amor de Mãe', da Rede Globo

Edição
Olívia Fraga

Capa
Carol Malavolta

Reportagem
Tiago Dias

Publicado em 19 de setembro de 2020.

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