A internet virou TV, e a transmissão não editada, feita ao vivo, encanta as massas desde a era do rádio. Antes de as gigantes de entretenimento e tecnologia entrarem de sola nesse mercado, o amadorismo e a zoeira (sempre ela) predominavam. Num tempo pré-banda larga, bandas de rock e gamers transmitiam suas performances pela internet, mas havia certos pudores, demarcações temporais — o tempo de uma canção, uma partida. Gilberto Gil, em 1996, tocou "Pela internet" no escritório da Embratel, no Rio, no que foi a primeira transmissão de áudio e vídeo ao vivo do país usando algo que não fosse o sinal de televisão. Hoje, transmitir a vida em tempo real (livestream) e em contínuo é o ganha-pão de muita gente.
A maior subversão de quem transmite a vida sem parar é borrar os limites entre trabalho e lazer. Para eles, tá tudo bem. "Posso dizer que faço o que amo", afirma Alexandre Borba, 36, conhecido na internet como Gaules, de São Paulo. Ele é dono de um dos maiores canais de livestream de jogos da plataforma Twitch e tem a atividade como profissão em tempo quase integral. "Você cria uma relação diferente com o trabalho, ele só depende de você. Quem ama 'streamar', não precisa de férias", diz.
No ramo desde o início de 2018, Gaules transmite de 10 a 14 horas do seu dia, em tempo real, pelo Twitch. Na maior parte do tempo ele joga Counter Strike ou outros jogos de tiro. Sua audiência: 88 milhões de espectadores, até o fechamento deste TAB (e contando). No chat à direita da página, as mensagens de internautas sobem rapidamente. Vez ou outra, um bom e velho anúncio publicitário aparece entre as risadas — essa é a forma clássica de ganhar dinheiro com conteúdo na internet.
Entre as plataformas de livestreaming, é possível lucrar dando espaço para anunciantes, fazendo parceria com o site e se tornando um produtor de conteúdo exclusivo dele ou por meio de pagantes fiéis. Na Twitch, há três tipos de assinatura, que vão de US$ 5 a US$ 25 (R$ 21 a mais de R$ 100, em valor corrente).
Livestreamers como Gaules fazem parte de um novo nicho de profissionais da internet. Assim como YouTubers têm movimentado o mercado publicitário e do entretenimento nos últimos anos, há cada vez mais interesse por esses incansáveis produtores de conteúdo. Como diz o apresentador dominical: quem sabe faz ao vivo. Uma das evidências é a quantidade e o tamanho das plataformas atuantes hoje na modalidade de livestream: YouTube, Facebook, Vimeo Livestream, Twitter, Twitch, Instagram e, de forma mais restrita, TikTok. Vale transmitir basicamente qualquer coisa: uma partida de videogame, uma viagem, um tutorial de maquiagem, sexo ou qualquer outra parte da rotina.