Turismo Xamânico

Indígenas usam turismo e espiritualidade da ayahuasca atrás de autopreservação e segurança

Hushahu se casou aos 10 e teve o primeiro filho aos 11. Sofreu com um marido violento. Para superar esse drama, buscou força dentro de si. Sozinha e escondida, tomou uni pela primeira vez. A experiência a levou querer se dedicar à espiritualidade. Mesmo com resistência da mãe e de parte da comunidade, conseguiu apoio do pai, que era o pajé

Índios que querem virar pajé precisam estudar a história, a língua e a cultura da tribo, mas também passam por outros tipos de provas: dieta restrita, isolamento, ingestão de substâncias sagradas, aprendizado dos cantos e rezas, além de rituais de força espiritual. O reconhecimento vem da comunidade. Matsini (abaixo à esquerda) é cacique e pajé da aldeia de Mutum. Rasu (abaixo à direita) é um jovem líder a caminho de se tornar um xamã

Consumidores habituais de ayahuasca, os pajés relacionam as visões provocadas pelo chá a elevação espiritual, previsão do futuro e poder de cura. Tambores e cânticos embalam "viagens" pessoais e coletivas, lideradas por pajés veteranos, nas cerimônias nas quais a substância é usada. E, sobre o poder de cura, funciona? Bom, estudos científicos já comprovaram os efeito benéficos do chá nas áreas da psicoterapia e do tratamento contra vícios

Os yawanawás estão em contato com o homem branco há um século. Eles se "apresentaram" durante o ciclo econômico da borracha. Os primeiros a chegarem na região dos índios, no início do século 20, foram os seringalistas. A etnia quase foi dizimada por causa das doenças trazidas e das agressões. Depois vieram os missionários cristãos, que queriam "evangelizar" e reprimir os cultos originais. Após a demarcação das terras, em 1984, pajés e caciques expulsaram os missionários e resgataram a espiritualidade ancestral. Os yawanawás contam a lenda de velhos pajés que, antes do encontro com brancos, previram a chegada do "povo de pedra". Isso desenvolveu entre eles a capacidade de conviver com estrangeiros

O nome "yawanawá" significa "povo do queixada". O motivo é que eles andam sempre em grupos, supostamente como os "porcos do mato" - aqui, no caso, também chamados de queixadas. Na etnia, é comum o conceito de grande família e a prática de casamento entre primos. Os casais podem se separar. Entre eles, todos se chamam de "txai", palavra que significa "primo". O hábito também se estende aos visitantes

O turismo xamânico, vivências de grupos e retiros individuais são os maiores fontes de recursos dos yawanawás. Eles perceberam que comercializar as tradições e sabedorias do seu povo é uma estratégia comercial bem sucedida e, como se não bastasse, é também a melhor proteção para a etnia, pois garante visibilidade. Três associações oficiais estabeleceram parcerias comerciais tanto com o governo do Acre quanto com empresas privadas. Todo ano as aldeias organizam, juntas, o festival Mariri, que atrai muitos turistas do Brasil e do exterior

Os yawanawás servem como um excelente exemplo de autopreservação. E eles estão cumprindo uma missão maior ainda: alimentar a crença de que o homem é parte de natureza, entidade/conceito que para eles é viva e divina. Eles entenderam que a natureza e sua sabedoria formam um tesouro que pode ser comercializado de maneira sustentável, e que esse processo pode trazer mais segurança contra as ameaças à floresta

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