Guardas municipais querem o nome, o porte de armas e a aposentadoria da PM

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As guardas municipais de todo o país querem o nome, a aposentadoria especial e o porte de armas de fogo concedidos aos policiais.
O lobby das associações de classe tem como foco a PEC da Segurança, proposta do governo Lula que sugere alterações nos artigos da Constituição Federal que tratam de segurança pública e defesa social.
Após pressão política, o ministro Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) incluiu as guardas na lista de órgãos responsáveis pela segurança no texto encaminhado ao Congresso.
A previsão é que a votação ocorra ainda este ano e seja o primeiro passo para a mudança.
Mas, por enquanto, a proposta não prevê mudar o nome da corporação para Polícia Municipal —como defende parte dos prefeitos— nem dar aos mais de 100 mil guardas do país o direito de se aposentarem mais cedo.
"A palavra polícia por si só não traz direitos para a categoria. As Guardas não foram contempladas na reforma da Previdência e é por isso que os prefeitos deveriam trabalhar. Queremos isonomia em relação à Polícia Militar, já que fazemos o mesmo trabalho", diz Reinaldo Monteiro, presidente da AGM Brasil (Associação dos Guardas Municipais do Brasil).
A aposentadoria especial dos policiais assegura salário integral desde que cumpridos 30 anos de serviço, sendo 25 deles em atividade militar, independentemente da idade.
Hoje, os guardas só podem se aposentar pela regra geral do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), que exige idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.
Por iniciativa da AGM Brasil, o debate sobre a concessão do benefício chegou ao STF (Supremo Tribunal Federal).
Em março, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista no processo, que já teve o voto contrário do ministro Gilmar Mendes.
Para o coronel da reserva da PM de São Paulo e ex-secretário nacional de Segurança Pública, José Vicente da Silva, as reivindicações das guardas não devem ser atendidas durante a tramitação da PEC da Segurança.
"Representantes das polícias militar e civil já se articulam no Congresso para barrar. Esse é um movimento sindical que não interessa à população. A maioria das cidades não tem recursos nem para arcar com as despesas ordinárias. O impacto cairia sobre o INSS, já bastante sobrecarregado", diz.
Parlamentares ouvidos pelo UOL ressaltam a dificuldade que os guardas enfrentarão para emplacar suas demandas —com exceção da questão da troca de nome, que pode vingar mediante pressão política de prefeitos.

Porte de arma estendido e piso nacional
Além de poder ostentar o nome de policial e compartilhar dos mesmos direitos previdenciários da categoria, os guardas também pleiteiam a ampliação do porte de arma de fogo e a instituição de um piso nacional.
A autorização deles para carregar armas é limitada hoje ao estado de atuação.
Guardas municipais do estado de São Paulo, por exemplo, não podem portar armas no Rio de Janeiro, Goiás ou em qualquer outro estado —e vice-versa.
Já os PMs usufruem de porte de arma nacional e ainda estendido para os inativos, outra diferença em relação aos guardas.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 30% das guardas municipais utilizavam armas de fogo em 2023. O índice aumentou se comparado a 2019, quando 22,4% das instituições estavam nessa condição.
O mesmo estudo mostrou que 1.322 municípios já têm sua própria tropa de segurança, em geral caracterizada por uniformes, viaturas e equipes semelhantes às da Polícia Militar.
Juliana Martins, coordenadora institucional do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirma que a reivindicação das guardas por aposentadoria e porte de arma nacional é só mais um sintoma da mimetização das forças.
"A organização mais nova tende a usar as corporações mais antigas como o modelo a ser seguido. E nesse processo há um entendimento que o modelo a ser seguido é o da Polícia Militar", afirma a especialista sobre práticas do dia a dia e busca por isonomia de direitos.

Uso de fuzis aproximam guardas de policiais
Em Santana de Parnaíba, na Grande São Paulo, a Guarda Municipal é formada por 388 homens e mulheres com práticas totalmente militarizadas e armamento pesado, que inclui 35 fuzis.
O investimento em efetivo e equipamentos nos últimos 12 anos fez reduzir em 66% o número de homicídios na cidade —de 12 vítimas, em 2012, para 4, em 2024.
"Direcionamos o policiamento aqui de maneira científica, segundo o registro de manchas criminais. Esse planejamento faz com que o crime vá para outros locais", afirma o comandante Antônio Zinczynszyn, que deve contratar mais 90 guardas até 2028.
O salário médio inicial pago em Santana de Parnaíba é de R$ 3.800, que pode crescer com plantões extras.
Já na vizinha Barueri, esse rendimento mensal bruto chega a R$ 8.500, somados adicionais e diárias suplementares noturnas —quase o dobro do salário do Recife (PE), por exemplo.
As diferenças praticadas pelo país sustentam a reivindicação da AGM Brasil e da Fenaguardas (Federação Nacional de Sindicatos de Guardas Municipais) pela instituição de um piso nacional para a categoria. Pleito compartilhado, neste caso, pelos policiais militares, ainda sem sucesso.
E a formação?
Representantes da PM, aliás, afirmam acompanhar com preocupação o movimento das guardas.
Presidente da Defenda PM (Associação de Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar), o coronel Luiz Gustavo Toaldo Pistori afirma que a primeira mudança pleiteada pelas instituições civis deveria ser o aprimoramento da formação.
"A formação de um guarda civil, segundo o Susp (Sistema Único de Segurança Pública), é de cerca de 500 horas, enquanto o policial militar precisa estudar 2.500 horas, incluindo os estágios práticos."
Pistori destaca as diferenças conceituais nas disciplinas aplicadas pela maioria dos cursos de formação, que são municipais e não seguem um padrão.
"Para virar polícia, não basta o nome, é preciso uma reformulação na formação."