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Além do fio-terra: meu dia no curso de pegging ao vivo e explícito nos EUA

Adams Carvalho/UOL
Imagem: Adams Carvalho/UOL

Bia Lee*

Colaboração para o TAB, de Austin (EUA)

09/05/2023 22h00

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Considerada a segunda melhor cidade dos Estados Unidos para os liberais, Austin é um oásis no religioso estado do Texas.
Foi ali que participei de um curso de "pegging", a atividade heterossexual em que homens são penetrados por mulheres.

Permeada por tabus e curiosidade, a prática atrai cada vez mais adeptos. O que vem mudando é a abordagem, hoje em dia menos sadomasoquista — o que segundo muitos praticantes estava um tanto equivocada. "Pegging", afinal, é pra todo mundo.

A chamada para o curso veio no final de um seminário online, divulgado por um fórum do Reddit dedicado ao "pegging unkinked", ou seja, sem fetiche. A grande maioria dos frequentadores eram casais em relacionamentos estáveis que praticam o "pegging" há anos, mas também há espaço para iniciantes. Em comum, todos têm dúvidas genuínas, que vão desde recomendações sobre o melhor equipamento (cintas, dildos, lubrificantes) até conselhos amorosos. Muitas curiosas tentam entender a predileção dos homens pela prática, enquanto os homens pedem dicas sobre como trazer o assunto à tona sem chocar a parceira.

Pesquiso o tema há pouco mais de dois anos, e só poucos meses atrás coloquei minha própria experiência em prática (nota pessoal: nunca tive uma vida sexual tão saudável e feliz como a atual), mas o tema aqui é outro. Ao receber o convite para um curso "ao vivo, in loco, com prática demonstrativa explícita de 'pegging'", aceitei e viajei a Austin.

Muitas mulheres, alguns casais

Na sala bem decorada, contavam-se seis mulheres desacompanhadas, dois homens sozinhos e três casais. No prédio de três andares funciona uma produtora musical e um espaço de coworking. Cafezinho, chá, cookies e água ficavam numa mesa de canto; cadeiras foram dispostas como em uma arena, e numa parte mais baixa da sala havia uma cama, uma mesa e uma parede cenográfica - tudo bem iluminado.

A bonita instrutora se apresentou: Annie, na casa dos 50, cabelos castanhos ondulados na altura do ombro e óculos de aro escuro. Instrutora de "pegging" há quase uma década, oferece o curso ao vivo há 2 anos na companhia do marido James. Estão juntos há 16 anos.

Ela falava do assunto com a naturalidade com que discutiria um papai e mamãe. Como se trata de um ato sexual entre um homem e uma mulher ("não é apenas sobre prazer anal, mas sobre receber esse prazer de uma mulher", diz), reafirmou que dúvidas sobre a sexualidade do parceiro eram desnecessárias.

"Muitas mulheres são abertas à bissexualidade de seus parceiros, mas outras precisam ter certeza de que estão com um homem hétero. Elas precisam se sentir como objeto de desejo, mesmo que passem a assumir uma posição de dominância no ato, ao mesmo tempo em que muitos homens precisam deixar claro que não têm tesão por outros homens, e nem por um pau da vida real. Eles querem dar o cu, sim, mas para a parceira, e só para ela", disse Annie.

Hora da chuca

É preciso ser realmente liberal e ter a mente aberta para participar do curso. Annie e James começam vestidos e depois se despem na frente dos participantes. Era tudo bem natural e ninguém parecia nem constrangido, nem com tesão (ainda).

Apresentando os materiais, eles explicavam "a chuca perfeita" (higiene anal). Deve ser feita no banho, de preferência, com um tipo de garrafinha adequada para garantir a limpeza do reto, mas sem exageros: água demais ou um jato forte demais podem gerar desconforto gastrointestinal e impedir a brincadeira, antes mesmo de ela começar.

James já estava preparado "porque o curso é curto [a aula tem duas horas] e o ideal é esperar 1 hora depois da chuca para começar", disse, mas demonstrou ao vivo como acoplar a garrafinha (vazia) no ânus. Em seguida, falou sobre a pressão correta do jato d'água e ficou de cócoras para mostrar a melhor posição para deixar a água escoar.

Hora do 'pega'

O casal foi para a cama. Annie colocou o parceiro de quatro e, com muito lubrificante à mão, começou com um dedo a fazer nele um fio-terra delicado e lento. Depois, botou dois dedos. Mais uma vez, nenhum desconforto, nem entre o casal anfitrião, nem entre os participantes.

Annie, então, pegou um dildo médio e começou a introduzi-lo devagar, enquanto James demonstrava os primeiros sinais de prazer. Uma gemida aqui e outra ali, até que ela vestiu a cinta e acoplou o dildo, pronta para começar.

A primeira posição foi a do cachorrinho, "a melhor para iniciantes", disse Annie. Ela ensinava como a mulher deve manter os joelhos firmes, segurando o quadril do parceiro, para facilitar o vai e vem. Nesse momento, o controle de velocidade, intensidade e profundidade é todo dela.

Foram uns bons seis minutos assim (fica difícil se concentrar em contar o tempo), até o casal passar para a mesa, onde curtiram mais duas posições: ela por trás ("uma das melhores posições para o homem gozar sem tocar o próprio pau", diz) e de frente, quando se consegue ao mesmo tempo continuar o sexo anal e masturbar o parceiro.

Aí a coisa toda ficou intensa e o tesão foi se espalhando pelo ambiente. A cena se tornou extremamente erótica, como se saída de um pornô bem feito. O casal passou para a parede: Annie, de salto alto (por ser mais baixa do que James), segurava as mãos do parceiro enquanto metia vigorosamente por trás; em seguida trocaram de posição, com James de costas para a parede e de frente para nós, ávidos espectadores, cavalgando a parceira - e enlouquecendo de tesão.

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Imagem: Adams Carvalho/UOL

Pausa para o libera geral

Annie e James deram um tempo e instigaram os participantes com um convite: quem estivesse com tesão, ficava liberado para se masturbar. Pode parecer bizarro, mas o ambiente continuou leve. Não tinha clima de suruba, mas de envolvimento com o espetáculo. Na mesma hora, um dos casais partiu para a pegação e a mulher caiu de boca no pau duríssimo do parceiro. Duas das moças desacompanhadas mandavam ver na siririca. No cantinho, alguém batia uma punheta discreta. Tudo isso enquanto o casal anfitrião voltava a trepar livremente, dessa vez sem explicações, curtindo um sexo bonito e gostoso, alheio ao público.

James gozou, Annie também, os gemidos ao redor indicavam que tinha mais gente gozando ao redor. Uma espécie de transe baixou no lugar durante uns minutos, e depois foi a hora dos agradecimentos, de mais um cafezinho, abraços e todo mundo saindo do local entre extasiado e extenuado.

Um dos casais me disse que aprendeu muito e entendeu melhor a prática depois do curso, e que achava que dali em diante a vida sexual, meio caída, ia melhorar. Uma das meninas ligou na mesma hora para o namorado contando tudo, animadíssima.

Saí de lá com uma sensação de descoberta e liberdade, e muito repertório para explorar — além de estar com um tesão louco. Corri para o hotel para curtir uma sessão de masturbação solo. Inspirada pela menina do telefonema, mandei mensagem para o marido, dizendo que tudo correu bem, e avisando: se prepara, porque chego amanhã cedo e vou te comer.

*Bia Lee é jornalista, mora nos Estados Unidos desde 2015 e está casada há seis anos.