Pegação e 'vagalumes' de bunda acesa: o 'cruising' e os labirintos do sexo

A primeira vez que foi a uma sauna gay, o carioca Guilherme Luz tinha 19 anos e um misto de curiosidade e medo. Mergulhar num lugar onde a pegação e o sexo eram o cardápio principal dava tesão, mas também alimentava uma fantasia misteriosa e até perigosa sobre um mundo desconhecido, pronto a ser devassado. Não demorou para se tornar assíduo frequentador dos bares de "cruising" — termo para sexo gratuito, consensual e anônimo, praticado entre homens em qualquer espaço público.

Shows interativos com modelos passaram a ser a atração principal dessas casas, não apenas no Rio.

A cada visita, ele interagia com os meninos que se apresentavam nesses shows. Ouvindo suas aventuras, escreveu uma história fictícia, onde um bar de cruising é o cenário onde personagens de diversas origens, amantes de vários fetiches, se entrecruzam e experimentam, quase como na primeira sensação do escritor na adolescência, o gozo e o medo. "É o que também instiga: o perigo do desconhecido."

Neste Aba Anônima, você pode ler com exclusividade um capítulo do livro "Casulo Cruising", segundo livro de Luz, lançado de forma independente. O modelo e acompanhante Max Loirinho foi um dos entrevistados para a pesquisa do livro — ele estampa as fotos que ilustram este texto.

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"A casa estava lotada.

O bar cheio de clientes fazia os atendentes correrem de um lado pro outro, entre drinques e cervejas. Os homens não paravam de chegar e, em cada novo ambiente que entravam, não conseguiam esconder a boa impressão.

...I don't wanna row, row, row the boat
Wrist full of rocks and I hope I float...

Um senhor de 60 anos e um novinho, ambos frequentadores assíduos desde a Hércules, conversavam na área de fumantes. (...)

O garoto de 20 anos sempre se referia a um suposto amigo ou conhecido que todos sabiam ser ele mesmo, embora fingisse acreditar para que o menino não se envergonhasse de perguntar coisas como "o que fazer depois de checar alguém", "como proceder quando gozar precocemente" e outras coisas mais. O senhor de 60 anos respondeu com pressa e foi ao banheiro aplicar o caverject, uma espécie de caneta para ereção, no pau para que ele ficasse rígido na hora do show, que se aproximava.

A meia-noite batia à porta. Os clientes bebiam e não paravam de perambular pelo local. (...)

Os meninos saíram do camarim e ocuparam alguns queijos espalhados pela área do bar principal, o "Le bar", em homenagem a uma das boates gays clássicas do Rio de Janeiro. Vestiam arreios pretos, com sungas em lantejoulas furta-cor e coturnos pretos.

... I'm a bitch, I'm a boss
I'm a bitch and a boss, I'ma shine like gloss...

Escondendo o rosto deles, uma máscara da cabeça de um vagalume em escala mega, na qual os olhos brilhavam verdes. O ambiente ficou escuro, apenas com a luz negra e os olhos dos quatro vagalumes acesos. O volume da música aumentou. A fumaça soltava cheiro de essência de baunilha.

... I'm a bitch, I'm a boss
I'm a bitch and a boss, I'ma shine like gloss...

— Bem vindos ao Casulo Cruising! Aproveitem nossos drinques no Le bar e nossos meninos, nossas esculturas, nossos vagalumes são todinhos seus — Jorginho disse no microfone enquanto o DJ soltava fumaça na pista onde os insetos gigantes e sarados dançavam.

Os clientes, ainda tímidos, começaram a se aproximar e passar a mão nos meninos.

* * *

Cláudio acabava de descer do táxi em uma rua na subida de Santa Teresa. Para evitar ser visto parando próximo ao "cruising bar", preferiu subir andando três lances de ladeira.

Verificou o endereço no celular e viu que estava exatamente em frente. Arfava um pouquinho devido à subida.

-- Boa noite, eu quero uma cabine.
-- Boa noite, senhor. Na área Palace ou salão?
-- Qual a diferença?
-- O palace é VIP, atendimento no quarto, privacidade especial e cama king size. No salão é a cabine, com cofre e cama de solteiro. Tem também o vestiário coletivo, que você tem direito a um armário para deixar seus pertences. Todos os clientes têm direito a duas toalhas e, caso precise de mais, basta pedir na lavanderia, custa R$ 10.
-- Vou querer a Palace.
-- Identidade, por favor -- disse o atendente com voz de pressa, por conta da fila, empurrando a gaveta por baixo do vidro do guichê. A gaveta de ferro fez um barulho forte que o atendente parecia gostar, pois fechou e abriu pegando o cartão de Cláudio, devolvendo com a maquininha e pegando de volta com uma força que aquele estrondo do metal batendo no metal e o consequente susto dos clientes pareciam deleitá-lo.
-- Senhor -- completou, empurrando o guichê pela última vez, pelo menos com esse cliente --, são R$ 350 a cada seis horas. A renovação é automática pelo seu celular e o QRcode que tem na chave. Seu quarto é o 1008 -- apontou para o número grande do cartão. O cartão, além de chave, também é sua comanda pra consumação no bar e pagamento na saída. O senhor pode pagar direto no aplicativo e passar aqui só pra entregar o cartão e ser liberado, ok? É só o senhor apontar a câmera pro QRcode aí do cartão que as opções já aparecem direto no seu telefone, tudo bem?
-- Tudo bem, obrigado.

Pequenos pisca-piscas amarelos pendurados nas árvores clareavam o caminho, com degraus de gnaisse, ladeado por um jardim de folhas grandes. Grandes costelas-de-adão, palmeiras, coqueiros, samambaias, bananeiras.

O homem de 40 anos foi subindo e de repente deu com uma parede falsa, cuja porta requeria que o cartão magnético fosse aproximado ao sensor para a liberação da entrada.

Uma luz verde piscou no sensor, seguida de um estalo — clac! — e a porta abriu.

Mal entrou, Cláudio espantou-se com o jardim dos salgueiros chorões, iluminado por milhares de micro leds verdes, fosforeando aleatoriamente, presos pelos ramos longos e pendentes nos arbustos. Nesse ponto, um holofote destacava uma placa que indicava que, seguindo reto, daria no vestiário; para a direita, entraria no jardim dos vagalumes, onde, em meio às árvores, havia camas, cabines, colchões e os mais diversos espaços para os clientes ficarem à vontade.

Percebeu que tinha bastante movimento lá dentro. Mas conteve a curiosidade e foi em direção ao vestiário. No caminho encontrou o bar principal, em que dançavam os meninos, e pediu informação sobre onde era seu quarto.

Subiu mais dois pequenos lances de escada, chegou à piscina dourada e finalmente, após atravessar o bar da piscina, chegou à área Palace, onde os quartos VIPs ficavam. Assim que entrou no 1008, sentou na cama e enviou mensagem pro amigo.

— Rodrigo, cadê você? Isso aqui tá lotado. Vou tomar um bom banho e vou descer. Meu quarto é o 1008 na área Palace. Tenta pegar um por perto.

Antes de ir pro banho, olhou a foto de divulgação no perfil da casa para ver exatamente o "vagalume" que o havia atraído. Na verdade, queria dois: Yago e Farley. Com a foto dos dois rapazes e letras garrafais "SEXO INTERATIVO", os meninos serviam de chamariz para clientes como Cláudio. Correu para o banheiro, não queria perder mais tempo.

Meia-noite e meia começava o primeiro show.

Jorginho, pontual como de costume, estava com tudo pronto e os meninos devidamente enfileirados dez minutos antes do horário combinado. Aproveitou para ter uma última conversa com eles.

— Amados, olha, hoje estamos voltando, tá tudo lindo, já deu certo, mas ainda pode dar mais. Tem que dar mais! Eu conto com vocês, vocês sabem que somos uma família, com brigas, desentendimentos, e por isso mesmo uma família. Mas também por ter muito amor, muito cuidado um com o outro e união. Hoje é dia de brilhar e eu vou parar de falar senão choro de novo.

— Ahhhh, maricona safada! — Yago brincou. Os outros riram, se abraçaram e deram um abraço conjunto em Jorginho.

— Chega de zona, amados. Se organizem na filinha indiana que a tia gosta, que vou lá anunciar vocês. Façam valer a pena o cachê, hein, meninas?

Jorginho subiu próximo ao DJ, que diminuiu lentamente o som para o anfitrião falar.

— Boa noite, Casulo! — disse, com voz que misturava animação e emoção — é com muito orgulho, muito mesmo, e com muita felicidade que eu anuncio pra vocês que a nossa casa, a casa mais iluminada, e escurinha também, a mais safada do Rio de Janeiro, a Casulo Cruising, está oficialmente aberta!

Gritos e palmas do público.

Jorginho respira, agradece com a cabeça e continua.

— Espero que vocês aproveitem bastante nosso espaço, feito com muito carinho e trabalho, com piscina aquecida, quarto sensorial, sala de sexo online e ao vivo, sala de cinema, o glory hole pros bezerrinhos, o majestoso jardim dos vagalumes, cabines pra quatro, cinco, dez, trinta pessoas, dois bares, área de fumante com sofá e todo conforto, a área Palace, pros nossos mais VIPs dos VIPs e que necessitam de uma privacidade exclusiva e, interligando tudo isso, nosso "dark room" gigante, o maior da América Latina.

A plateia delira.

— Então, amados, se joguem e lembrem-se: sempre que virem um "vagalume" com o rabinho aceso, significa que ele está inteirinho à sua disposição. Sua e de quem mais quiser. Podem chegar mais perto, que nossos insetinhos gostam e precisam de calor humano para reproduzir — a plateia ri.

— Nessa noite de estreia, recebam nossos melhores besourinhos do rabo aceso: Farley e seu fuzil carioca; Yago, o príncipe gaúcho do cuzinho rosa; Wallace Wu, o japa paraense mais feroz do Brasil e, nossa mais nova aquisição, escolhido por vocês na enquete do Twitter: o ruivo cabeludo de Brasília: Ícaro, nosso anjo nerd dos cabelos e pentelhos de fogo, vinte e quatro aninhos, 21 centímetros, magro, alto, tatuado no corpo todo e peludo, do jeito que as safadas gostam. Aproveitem pra ficar bem pertinho do seu ator pornô favorito. E claro, como eu sempre digo, o show só é interativo porque vocês participam! É com vocês, meninos. Solta aí, DJ!

...Cocaine and drinkin' with your friends
You live in the dark, boy, I cannot pretend...

O DJ começou apenas com o vocal por alguns segundos, emendando um remix eletrônico da música enquanto a pista se enchia de fumaça e os meninos caminhavam lentamente até o palco no centro da pista do bar.

...Call me when you want, call me when you need
Call me in the morning, I'll be on the way...

Os quatro estavam vestidos com arreios de led verde, uma haste fina envolvendo a cintura na altura do ilíaco também em led verde, como um cinto, sustentando um ponto de luz verde mais forte no ar, como se voasse. Nos olhos, grandes óculos estilo nadador, verdes e acesos. O pau e a bunda completamente de fora. Nos pés, coturnos pretos e meias fluorescentes, onde os garotos aproveitavam para guardar camisinhas, lubrificante e drogas, caso precisassem durante a performance. Não havia luz acesa no ambiente além da que emanava dos "vagalumes", cujo rastro clareava o caminho por onde passavam em direção ao palco.

..Mmm, mmmm, mmm Mmm, mmmm, mmm...

Os quatro começaram a se beijar, se esfregar. Yago chupava Wallace, que chupava Farley, que beijava Ícaro. Os clientes foram se aglomerando, aglomerando, aglomerando. Eram abelhas nos jardins de primavera e, de insetos, os meninos pareciam ter virado néctar, tanta era a quantidade de boca tentando sugá-los o pau, a bunda, a barriga, os mamilos e o que mais fosse possível.

...I wanna sell what you're buyin'
I wanna feel on your ass in Hawaii
I want that jet lag from fuckin' and flyin'...

O senhor de 60 anos, conhecido antigo dos meninos, de outros trabalhos, e que tinha o maior pau já visto nas saunas, era obcecado em Yago. Colocou o gaúcho de quatro no queijo e começou a comê-lo ali mesmo. Isso deu margem para que os que ainda estavam com algum pudor se soltassem. Inclusive o novinho de 20, que costumava ir aonde o senhor ia. A putaria começou a ficar generalizada.

...Bate perna, bate o pé
Sacode o corpo, mulher
As tchutchucas pede agora
A montagem do atola...

Com o tempo, os quatro foram se espalhando pelos outros ambientes da casa para satisfazer os clientes. Eles basicamente ficavam parados ou dançando e tinham que fazer o que os fregueses que se aproximavam quisessem. Com algumas restrições. Farley, por exemplo, só fazia ativo no show — machismo, uns reclamavam.

?Então atola, atola, atola
Requebra pra chuchu, vai
Atola, atola, atola na
Montagem canguru...

Cláudio bebia uma piña colada e relaxava na água quentinha da piscina dourada quando Yago se aproximou. O garoto sabia que todos os quartos começados com 10 eram os da área Palace, ou seja, onde os mais ricos ficavam. Reparou no cartão pendurado por um cordão de borracha transparente no peito do homem. Não precisou de muito papo: o loiro fez uma rápida massagem no ombro do potencial freguês, que logo sugeriu que fossem ao quarto dele."