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PF aponta participação de Elmar Nascimento em esquema de fraudes e desvios

A Polícia Federal apontou, em um pedido ao STF (Supremo Tribunal Federal), indícios de participação do deputado federal Elmar Nascimento (União-BA) no esquema de fraude a licitações e desvio de dinheiro público apurado pela Operação Overclean.

Na última fase da operação, em julho, o ministro Nunes Marques, do STF, negou um pedido da PF para busca e apreensão e bloqueio dos bens do deputado e afastamento do cargo de seu irmão, Elmo Nascimento (União), prefeito de Campo Formoso (BA), mas autorizou as medidas contra os demais investigados.

A defesa de Elmar nega a participação dele nos fatos e qualquer beneficiamento. Além disso, diz que eventuais contatos fazem parte da rotina de um parlamentar (leia mais abaixo).

A PF investiga um suposto esquema de fraude a licitações, superfaturamento, corrupção e desvio de dinheiro público em contratos de limpeza urbana e pavimentação, centrado em municípios da Bahia.

Em duas licitações suspeitas de fraude, a empresa Allpha Pavimentações, dos investigados Alex e Fabio Parente, ganhou contratos de pavimentação de R$ 51 milhões em Campo Formoso, cidade administrada por Elmo, com verba de emendas enviadas por Elmar.

O deputado Elmar Nascimento, do União Brasil (BA)
O deputado Elmar Nascimento, do União Brasil (BA) Imagem: Marina Ramos/Câmara dos Deputados

O então secretário-executivo da prefeitura, Francisco Nascimento, primo do deputado, hoje vereador, teria manipulado as licitações a favor dos empresários, de acordo com conversas encontradas pela Polícia Federal entre ele, o pregoeiro e os demais investigados.

Como mostrou o UOL no ano passado, um dos certames ficou entre a Allpha e a construtora Lumax, que fez uma proposta pior. O dono da Lumax também foi alvo da última fase da operação da PF.

O inquérito foi enviado ao STF após surgirem indícios de participação do deputado no esquema. Uma planilha apreendida com Alex Parente registra repasses de R$ 493 mil a um assessor e primo de Elmar, Amaury Albuquerque Nascimento.

Além disso, foi considerada suspeita a compra de um apartamento por Elmar da filha do empresário Marcos Moura, o "rei do lixo", por preço abaixo do mercado.

A PGR (Procuradoria-Geral da República), porém, apontou que os elementos contra o deputado ainda são circunstanciais e não justificariam as medidas contra ele. Nunes Marques seguiu esse entendimento e negou o pedido contra Elmar.

O ministro negou também os bloqueios pedidos contra Elmo Nascimento e seu afastamento do cargo de prefeito, que a PF havia pedido e com os quais a PGR concordou.

Ele autorizou, porém, o afastamento do cargo do então presidente da Codevasf -quando a decisão foi proferida, no entanto, ele já havia deixado a estatal.

Empresário Marcos Moura (segundo da dir. para a esq.) participa de evento do União Brasil junto do presidente do partido, Antônio Rueda, do prefeito de Goiânia, Sandro Mabel, de Elmar Nascimento e do deputado Fernando Coelho Filho
Empresário Marcos Moura (segundo da dir. para a esq.) participa de evento do União Brasil junto do presidente do partido, Antônio Rueda, do prefeito de Goiânia, Sandro Mabel, de Elmar Nascimento e do deputado Fernando Coelho Filho Imagem: Reprodução

Amizade com empresário

Um dos elementos apresentados pela PF são mensagens citando uma reunião de Elmar com os empresários investigados em Brasília em 28 de novembro de 2022, duas semanas antes de serem liberadas as emendas para uma das obras sob suspeita de fraude.

Procurada, a defesa de Elmar nega que o encontro tenha ocorrido.

Nessa passagem por Brasília, Alex Parente teria encontrado o senador Davi Alcolumbre (União-AP), hoje presidente do Senado, correligionário de Elmar, e Evandro Baldino do Nascimento, outro empresário investigado na Overclean.

A reunião está documentada em uma troca de mensagens entre Parente e Evandro Baldino, em um momento do dia em que Parente menciona que estava acompanhado de "Elmar" e "Davi Alcolumbre".

O encontro é tratado como uma indicação de que Elmar teria participado da combinação com os empresários para que eles ficassem com o contrato em Campo Formoso, financiado com emendas enviadas por ele à Codevasf.

Em junho de 2022, Elmar pediu que fossem enviados R$ 40 milhões a Campo Formoso via emendas de relator ("orçamento secreto"), pleito atendido em dezembro pelo Ministério do Desenvolvimento Regional.

O município usou o dinheiro para duas licitações de pavimentação em convênio com a Codevasf, com valor inicial de R$ 45 milhões e R$ 12 milhões, no final de 2023 e início de 2024, respectivamente.

Em 16 de maio de 2023, antes de a primeira licitação acontecer, o prefeito de Campo Formoso, Elmo Nascimento, foi com Alex Parente, Evandro Baldino e Lucas Maciel Lobão Vieira, outro investigado, a uma reunião na Codevasf em Juazeiro. Antes de a prefeitura fazer a primeira licitação, pediram que a estatal aumentasse o valor da obra.

Segundo conversas obtidas pela PF, Elmar teve conhecimento dessa reunião -sua defesa negou ao UOL que isso tenha acontecido.

Além disso, o deputado teria uma relação de amizade anterior com Alex Parente, já que, em novembro de 2022, quando estava a bordo de um navio, convidou o empresário para uma festa.

Em 2024, Elmar também negociou com Alex Parente qual seria a data de entrega da primeira obra da Allpha em Campo Formoso, evento ao qual ele compareceu.

A PF analisou também pagamentos realizados por Amaury, assessor de Elmar, à empresa Campo Esmeralda Participações, da qual a esposa de Elmar, Luciana de Olivaes Lacerda Nascimento, é sócia, o que pode ser uma forma de "repasse indireto de valores ao parlamentar, mediante utilização de terceiros para mascarar a origem dos recursos."

De acordo com um relatório do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), Amaury Nascimento movimentou quantias incompatíveis com sua capacidade econômica entre abril de 2024 a janeiro de 2025, com transações imobiliárias e negócios realizados com dinheiro "sem origem lícita aparente".

Esses são os indícios de que Elmar, segundo a PF, participou de uma "articulação voltada ao favorecimento da empresa posteriormente identificada como beneficiária de práticas fraudulentas".

Elmar Nascimento ao lado de Arthur Lira (PP-AL), quando este era presidente da Câmara
Elmar Nascimento ao lado de Arthur Lira (PP-AL), quando este era presidente da Câmara Imagem: Michel Jesus/Câmara dos Deputados

Outro lado

A defesa de Elmar disse que o contato com Parente para combinar a data de entrega da obra faz parte da rotina normal do parlamentar.

"Nada mais é que um diálogo regular sobre o dia ideal para que o maior número de autoridades pudessem estar presentes no evento de inauguração de obra já concluída."

A defesa afirmou também que os indícios contra o deputado são "tão frágeis que, após meses de investigações e vazamentos seletivos à imprensa, a PGR se manifestou contra qualquer diligência contra ele".

Além disso, a defesa nega "veementemente" ter ocorrido qualquer reunião em 2022 com Alex Parente em Brasília, como o empresário disse em mensagens naquele dia.

Sobre os pagamentos à empresa de sua esposa, Elmar alega que "a empresa a que se refere a polícia ainda estava em fase de constituição e sequer possuía conta corrente. Não assumiu qualquer tipo de despesa para além das taxas burocráticas cobradas para seu estabelecimento."

"O apartamento negociado com o empresário Marcos Moura é assunto antigo e já esclarecido. Trata-se de negócio regular, registrado em cartório e objeto de financiamento bancário", afirmou.

Por fim, "o deputado Elmar Nascimento desconhece qualquer relação de Amaury com os fatos objeto de investigação".

Já a Codevasf informou, sobre a quinta fase da Operação Overclean, que "mantém compromisso com a elucidação dos fatos e com a integridade de suas ações -e que continuará a prover suporte integral ao trabalho das autoridades policiais e da Justiça".

O UOL também procurou a Prefeitura de Campo Formoso, a defesa da empresa Lumax e do vereador Francisco Nascimento desde a última quinta-feira, mas não obteve resposta.

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