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Tebet começou na política aos 5 anos ouvindo o pai atrás da porta

Simone Tebet declara apoio a Lula no 2º turno - Ronaldo Silva/Photopress
Simone Tebet declara apoio a Lula no 2º turno Imagem: Ronaldo Silva/Photopress

Claudia Castelo Branco

Colaboração para o TAB, de São Paulo

05/10/2022 18h06

Logo na segunda-feira (3), a socióloga Rosângela Silva, Janja, mulher de Lula, ligou para Simone Tebet (MDB). Passou o telefone para o marido e, desse telefonema, a conversa evoluiu para um encontro marcado. Nesta quarta-feira (5), Tebet reuniu-se primeiro com Geraldo Alckmin (PSB) para acertar detalhes; depois, Tebet almoçou com Lula, na casa da ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy.

Horas mais tarde, a senadora, que obteve quase 5 milhões de votos no primeiro turno, fez um pronunciamento em São Paulo, em defesa da democracia, declarando o apoio à candidatura do petista — a coletiva de imprensa aconteceu horas depois de o seu partido declarar neutralidade na disputa pelo Planalto.

"O que está em jogo é muito maior que cada um de nós", afirmou. "Depositarei nele [Lula] o meu voto, porque reconheço seu compromisso com a democracia e a Constituição, o que desconheço no atual presidente."

'Sem gracinha'

Tebet, 52, saiu maior do que entrou na disputa presidencial. Aparecia com 2% das intenções de voto. Ao longo da campanha, despontou em quarto lugar, atrás de Ciro Gomes (PDT), mas terminou em terceiro lugar, com 4,2% dos votos totais.

Sua candidatura nunca foi consenso dentro do MDB, mas a senadora vinha embalada pelo seu desempenho durante a CPI da Covid — o destaque no período cimentou seu nome no partido. No Google, ela perdia apenas para Luva de Pedreiro numa busca simples por "quem é", dias antes do primeiro debate presidencial.

A senadora Simone Tebet (MDB) anuncia apoio a Lula  - Ana Paula Bimbati/UOL - Ana Paula Bimbati/UOL
Imagem: Ana Paula Bimbati/UOL

Durante a campanha, Tebet teve um encontro com um grupo seleto de senhores de cabelos brancos no restaurante Varanda Grill. Broches nos paletós indicavam que o grupo pertencia à comunidade acadêmica e científica paulistana. Poucas mulheres circulavam por ali, mas o neurocirurgião Carlos Gilberto Carlotti Júnior, reitor da USP, garantiu que o grupo seria "metade, metade". Todos queriam conhecê-la melhor.

Às 15h10, Simone Tebet saltava de um carro blindado preto, cercada de policiais federais à paisana. De sapatos Oxford, conjunto de calça capri, blazer e blusa de gola alta, não levava bolsa a tiracolo — apenas um iPhone na mão direita. "Não vai entrar?", perguntou a um assessor. "Não? Então eu entro sozinha."

Sua maior preocupação era saber se Mara Gabrilli (PSDB), candidata a vice na chapa, já estava no local. Tebet não esconde a admiração pela senadora tucana. Admiração recíproca, conta Gabrilli, em conversa com o TAB. Na terça-feira (4), Gabrilli anunciou votar em branco para o segundo turno.

Ao longo de pouco mais de duas horas, Tebet manteve um ar sério, um meio sorriso, os olhos em movimento, sem se fixarem num ponto só. Na taça, água gelada. Não tomou — e não toma — café, tampouco refrigerante ou bebida alcoólica. Diante do grupo, falou sobre seus 20 anos de mandatos consecutivos e repetiu o discurso sobre ser a primeira mulher em muitas coisas. "Não preciso falar grosso, não preciso usar terno, não preciso deixar a emoção de lado."

Não é do feitio da candidata do MDB fazer analogias ou lançar tiradas para arrancar risadas. "Me chamam de chata porque pego no pé das coisas erradas. Na CPI [da Covid], para denunciar o esquema de corrupção, tive de ir com uma lupa para entrar em detalhes. Porque a corrupção sempre está escondida. Você é jornalista, sabe como é...", disse.

Devoto de Nossa Senhora Aparecida, seu marido, Eduardo Rocha, 55, confirma a fama de Simone. "Ela não é de gracinha, de piadinha. Ela é séria, mesmo. Não tenho a capacidade dela", afirmou. O casal tem duas filhas, Maria Fernanda e Maria Eduarda.

Infância silenciosa

Final da década de 1970, em Três Lagoas (MS). Ramez Tebet, deputado estadual da então recém-nascida Assembleia Legislativa do estado, participava dos trabalhos de elaboração da primeira Constituição. Era comum figuras políticas se reunirem na casa rosada de Taufic Tebet, avô de Simone, lembra José Rangel, 69, assessor de Ramez por mais de duas décadas. "De repente, escutamos um barulho na porta. Era Simone escutando as conversas", contou ele ao TAB.

A senadora confirma, lembrando que demorou para entender por que as conversas eram sussurradas: era o final do regime militar. "Escutava o tempo todo atrás da porta, mas não por causa da política. No fundo eu queria estar próxima dele. Quando tinha 5 anos, meu pai já era prefeito. Ele era um ser político 24 horas."

Simone Tebet, a mais velha de quatro filhos (duas mulheres e dois homens), morou até os nove anos em Três Lagoas. Estudou em escola pública e terminou o ensino médio em colégio de freira, em Campo Grande. Em 1984, pediu permissão para participar do movimento pelas Diretas Já. "Era um momento de exceção, e eu tive a liberdade de estar com meus colegas nas ruas. Foi um grande episódio da minha vida", lembrou-se.

Nesse período, viu o pai deixar o cargo de deputado para ocupar a vaga de vice-governador na primeira eleição direta desde 1964. Ramez assumiu o governo de Mato Grosso do Sul em 1986. "Minha infância foi no silêncio. Minha adolescência foi no grito. Acho que nunca falei sobre isso", contou ao TAB. "Eu era do interior e achava aquilo normal. Olhando para trás, parece que falta o ruído. Falta o barulho das ruas, o barulho do grito da resistência."

Sua participação nos debates presidenciais foi considerada a melhor entre os candidatos, mas Tebet fica mais à vontade fora das câmeras. Gosta de poesia e de música — é fã de Elvis Presley, adora Frank Sinatra, acha Edith Piaf o máximo e chama Freddie Mercury de fenômeno. No Brasil, suas referências são Elis Regina, "a maior voz de todas", e Legião Urbana, "imbatível".

11.set.2022 | Simone Tebet em ato de campanha na avenida Paulista, em São Paulo - Yuri Murakami/TheNews2/Folhapress - Yuri Murakami/TheNews2/Folhapress
11.set.2022 | Simone Tebet em ato de campanha na avenida Paulista, em São Paulo
Imagem: Yuri Murakami/TheNews2/Folhapress

'Nova cara' do MDB

Simone Tebet foi a primeira candidata ao Planalto de um partido que, em oito eleições presidenciais, só lançou cabeça de chapa três vezes — Ulysses Guimarães (1989), Orestes Quércia (1994) e Henrique Meirelles (2018). Fontes ouvidas pela reportagem defendem que seu nome é fundamental para legitimar a nova identidade do MDB — ela representaria a nova cara do partido, que também está dividido entre Lula e Bolsonaro.

A candidatura de Tebet não foi unanimidade no partido. O senador Renan Calheiros, que lidera a ala do MDB que apoia Lula desde o início, disse ao TAB que respeita a candidatura de Tebet, mas que a senadora não tinha chance e repetiria o feito de Henrique Meirelles (1,2% dos votos em 2018) — que também declarou apoio a Lula, de quem foi ministro, em 19 de setembro.

Após uma das falas de Tebet no primeiro debate presidencial, Jair Bolsonaro alfinetou o MDB. "Eu abalei a harmonia onde todos eram amiguinhos." Nem tanto. Em seu mandato no Senado, Tebet acompanhou o governo em 85% das votações, em particular nas pautas econômicas. Para outubro, entretanto, ela diz que estará em campanha em apoio ao petista — por ora, a partir da adesão da chapa a cinco pontos importantes num eventual governo.

"Até o dia 30 de outubro, estarei nas ruas, vigilante; meu grito será pela defesa da democracia e por justiça social. O presidente Lula precisa ganhar a eleição. Não quero ministérios. Ele ganhando, ele escolhe quem ele quer."