Disputa por herança: stylist acusa irmão de forjar dado em cartório
Herdeiro de uma família tradicional de Goiás, o personal stylist Ricardo Holzbach, 40, acusa o irmão, o empresário Carlos Antônio Holzbach, 42, de ocultação de patrimônio e falsificação de sua assinatura em documentos.
Segundo Ricardo, o 5º Ofício de Notas de Goiânia teria responsabilidade na falsificação ao reconhecer assinaturas "notadamente falsas".
Os pais de Carlos e Ricardo já morreram (ele, em 2012; ela, em 2021) e deixaram toda a herança para os filhos.
Ricardo afirma que Carlos se apropriou de parte dos bens da família e diz não saber qual o valor total da herança —nas ações, pede cerca de R$ 5 milhões.
Um dos imóveis herdados é a sede do Hospital de Acidentados na avenida Paranaíba, uma das principais de Goiânia.
O stylist, que é gay, também diz que é alvo de violência emocional. "Meu irmão é um narcisista", Ricardo diz ao UOL.
"Ele tirou quase tudo de mim: minha autoestima, joias da minha mãe, usou meu nome e meus cartões de crédito. Quando descobri que ele falsificou minha assinatura, minha identidade num cartório, decidi ir à Justiça."
Os advogados que representam Carlos dizem que já houve tentativa de acordo por parte do empresário, mas os pedidos foram "totalmente ignorados, diante de uma imposição de uma cifra milionária".
Procurado, o cartório 5º Ofício de Notas de Goiânia não respondeu à reportagem.
Porsche, joias e ações
Segundo Ricardo, os irmãos goianos passaram a pandemia juntos no bairro dos Jardins, em São Paulo, mas o relacionamento azedou no fim de 2023.
Segundo uma das ações de Ricardo contra o irmão, Carlos teria falsificado sua assinatura no documento de transferência de um Porsche Cayenne 2022, avaliado em R$ 750 mil, para o nome de sua esposa, Larissa Holzbach.
Ainda segundo uma das ações, Ricardo descobriu depois que outras assinaturas suas foram falsificadas. Uma delas em um contrato de R$ 1,5 milhão com a consultoria financeira Taipe, de Brasília.
Ricardo mandou uma notificação extrajudicial ao irmão em dezembro de 2023.
Depois, contratou um perito criminal para avaliar os documentos —a reportagem teve acesso aos laudos, que destacam divergências nas letras H e Z, entre outras, e atestam que as assinaturas são falsas.
Em março, o stylist viajou de São Paulo a Goiânia e abriu um boletim de ocorrência. Relatou ameaça física, apropriação indébita e falsificação de documentos.
"Meu irmão roubou 56% do meu patrimônio", diz Ricardo, durante sessão de fotos em Higienópolis, em que vestia paletó Ralph Lauren, corrente de ouro, brincos, boné Celine e tênis All Star.
Em julho, Carlos e Larissa foram prestar esclarecimentos na delegacia.
Ele confirmou que as assinaturas não são autênticas: quem assinou os documentos foi a analista financeira Sheila Sobrinho, funcionária de confiança da família, mas "com consentimento de Ricardo", segundo o termo de declarações da delegacia.
Larissa disse ainda que Ricardo teria um "quadro bipolar", que foi o stylist que lhe deu as joias da mãe e que quis lhe transferir o Porsche.
Sheila disse que não tem nada a declarar sobre o assunto.
O UOL procurou a financeira Taipe por telefone, mas ninguém atendeu.
'Ponta do iceberg'
Ricardo diz que investiu quase R$ 500 mil na batalha judicial com o irmão, entre honorários de advogados, laudos de peritos e outros documentos.
Segundo o advogado Philippe Lasmar, que representa o stylist, a briga inclui:
- Um inquérito policial, que espera outra perícia grafotécnica;
- Uma ação contra a financeira Taipe;
- Uma ação contra o 5º Ofício de Notas de Goiânia;
- Uma ação cível referente à herança dos Holzbach -Ricardo pediu auditoria dos inventários;
- Duas ações criminais.
Uma das ações criminais é um pedido de medida cautelar: Ricardo pediu em maio para a Justiça proibir o casal Carlos e Larissa e o filho deles, Davi, de se aproximarem dele.
Davi, diz ele, lhe deu uma gravata em sua casa para pegar seu relógio Rolex.
O juiz concordou e determinou um distanciamento mínimo de 500 metros entre eles.
A defesa de Carlos e família pediu a derrubada das medidas protetivas —um dos advogados é Rodolfo Caiado, sobrinho do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil).
Outro advogado do caso, Thales Jayme argumentou nos autos que o quadro de ansiedade de Ricardo não tem "absolutamente nada" a ver com a família, com quem costumava viajar e se encontrar para cafés.
"Ricardo nunca foi ameaçado por nenhum dos peticionantes", escreveu Jayme.
Também afirmou que eles moram perto, nos Jardins, e frequentam os mesmos lugares, "como academia, padarias, restaurantes, de modo que acidentalmente pode ocorrer de Carlos ou Davi estarem em algum desses lugares, e serem obrigados a sair com a chegada de Ricardo sob pena de prisão".
Em novembro, a cautelar foi prorrogada pela Justiça até fevereiro de 2025.
A ação criminal que tramita na Justiça está sob sigilo desde julho.
Os advogados de Carlos afirmaram que o empresário trabalha na venda de móveis para grandes concessionárias de carros e que ser vinculado a um processo "pode lhe causar transtornos e prejuízos inimagináveis".
O Ministério Público foi contra o sigilo, mas o juiz decidiu a favor.
O stylist conta que quis contar sua história para ajudar "outros Ricardos": segundo ele, vítimas de violência patrimonial e gays alvos de abuso físico e psicológico por parte de familiares.
"Eu sou só a pontinha do iceberg", diz.
Ele acrescenta que se indignou especialmente com a falsificação de assinaturas num cartório, onde deveria valer a máxima "certifico e dou fé".
Cartórios ganharam mais de R$ 23 bilhões com registro e autenticação de cópias e certidões em 2022, segundo o livro "O país dos privilégios", de Bruno Carazza.
"É o preço pago pelos brasileiros em nome da garantia da fé pública dos documentos emitidos no país. Para muitos, não vale a pena", diz o livro.
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