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Idoso preso 3 anos por crime que não cometeu: 'Tenho medo de sair na rua'

O aposentado Gerardo Rodrigues da Silva, 65, ficou mais de três anos preso, condenado a 15 anos por um assalto a banco ocorrido a quase 800 km de onde estava.

O UOL reconta a história do assalto e a reviravolta do caso de Gerardo em vídeo, com auxílio de inteligência artificial.

Com sua família, em Osasco, na Grande São Paulo, onde vive atualmente, Gerardo não consegue conter as lágrimas ao relembrar o que viveu na prisão.

Confira, abaixo, a entrevista que Gerardo cedeu ao UOL:

UOL: Há quanto tempo o senhor saiu da prisão?

Gerardo Rodrigues da Silva: Hoje está com um mês e onze dias. Graças a Deus que saí daquele lugar. É muita injustiça você deixar a família. Não sou envolvido com crime nenhum. Sempre trabalhei para cuidar da minha família. Nunca roubei um centavo. Trabalhei a minha vida toda: 38 anos de contribuição. E não me investigaram. Simplesmente me pegaram, sem investigação nenhuma.

Gerardo Rodrigues da Silva em entrevista ao UOL
Gerardo Rodrigues da Silva em entrevista ao UOL Imagem: UOL

UOL: Como foram os anos dentro do presídio?

Gerardo Rodrigues da Silva: Terrível. Foram três anos muito sofridos. Depois de me aposentar, financiei uma casinha e fui morar lá em Fortaleza. Dois anos depois, aparece a polícia do Maranhão, me prendendo, dizendo que eu era assaltante de banco, chefe de quadrilha. Nunca peguei uma arma na minha vida.

UOL: Você tentou falar que era inocente, né?

Gerardo Rodrigues da Silva: Falei para o delegado. Ele não quis saber, não quis me ouvir. Me levou direto para o Maranhão. De lá, me jogaram no presídio de Pedrinhas [MA]. Só um ano depois o delegado foi pegar meu depoimento. Emocionalmente ele me torturou, dizendo que eu tinha que assumir o crime. Que eu era um velho safado, ladrão, sem vergonha, ladrão de banco, que saía aqui de São Paulo pra ir roubar banco no Nordeste.

Me colocaram uns dez crimes. Quando terminou a audiência, ele falou que as minhas provas não serviam. Que não queria nem saber de prova. Eu tive nove testemunhas a meu favor. Meus vizinhos, que me conheciam, que me viam todo dia.

UOL: Você tinha outras provas, além das testemunhas?

Gerardo Rodrigues da Silva: Eu votei para prefeito no dia anterior. No dia do assalto lá do Maranhão [16 de novembro de 2020], fui no banco sacar dinheiro. Ia fazer aniversário dia 18 de novembro. Aí no dia 18 ainda fui no mercado comprar uma massa pra minha esposa fazer um bolo no meu aniversário. Não saí de casa.

UOL: O que o delegado dizia pra você apesar disso?

Gerardo Rodrigues da Silva: Dizia que eu era o Paulista [acusado de integrar o bando]. Eu estava pagando a cadeia de uma outra pessoa que eu nem conheço. O delegado me falou que o Justino [réu confesso] disse que eu era o chefe, que eu tava junto.

Quando cheguei na prisão, o agente chamou ele. Perguntei: 'Como é que tu vai falar pro delegado que eu tava junto?'. Ele falou: 'Mentira dele. Nunca falei pra delegado, rapaz. Eu nem te conheço'.

UOL: Como era a rotina na cadeia?

Gerardo Rodrigues da Silva: Lá, pra todo canto que você vai, você faz um procedimento, fica pelado. Tem dia que mandam você deitar, ficar no chão, pelado. Não deixam você levantar nem para tomar remédio. Uma cela para nove pessoas tem nove pedras, que eles chamam de comarcas. E tinha 15 presos morando. Num espaço de 9 metros quadrados. Você tinha um sol por semana.

Gerardo Rodrigues da Silva posa para foto com a família
Gerardo Rodrigues da Silva posa para foto com a família Imagem: UOL

UOL: Como foi o sentimento quando conseguiu sair de lá?

Gerardo Rodrigues da Silva: Foi a maior alegria da minha vida. Só quem passa por aquilo ali sabe o sofrimento, ainda mais sendo inocente. Você imaginar que passou um tanto de tempo daquele sendo tratado daquela forma, se alimentando daquela forma. E você ter a oportunidade de sair, sabendo que você não tem culpa nenhuma. Dói muito. Eu choro pela injustiça que me fizeram.

UOL: Ficou algum trauma depois de tudo o que passou, Gerardo?

Gerardo Rodrigues da Silva: Eu tenho medo de sair na rua. Tenho medo de polícia, medo de tudo. Sinto como se um agente tivesse me pegando. Agora me alimento melhor. Conviver com a minha família é muito bom, graças a Deus.

UOL: E para o futuro? O que o senhor quer agora?

Gerardo Rodrigues da Silva: O que mais quero é a acompanhar a criação do meu neto. Acho que eu tenho o direito, mas a Justiça não via isso. Meu neto ficou foi três anos sem me ver. Perguntando toda hora para a mãe dele: "onde é que meu vô está?". Agora estou muito bem, cuidando da minha saúde e da minha família, até quando Deus quiser.

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