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'Punidos' com aposentadoria, estes juízes ainda recebem penduricalhos

Eles foram acusados de vender sentenças, beneficiar traficantes, usar a posição em benefício da família e até de abuso. Receberam a pena mais grave da magistratura, a aposentadoria compulsória.

Esses juízes, apesar de tudo isso, permanecem com remuneração elevada.

O UOL analisou informações de 25 magistrados que tiveram suas punições determinadas ou confirmadas nos últimos cinco anos pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Seus contracheques mostram que a média de remuneração líquida após a aposentadoria foi de R$ 39 mil, em valores corrigidos pela inflação.

É mais que os valores líquidos recebidos em 2024 pelos juízes do STF, cuja remuneração deveria ser o teto do funcionalismo.

Isso acontece em parte porque muitos continuam recebendo penduricalhos retroativos, referentes ao período em que exerceram a magistratura, como "adicional por tempo de serviço", "abono de permanência", "licença compensatória" e "gratificação de acervo", entre outros.

Desde 2020, foram gastos R$ 7,3 milhões, em valores corrigidos pela inflação, apenas com o pagamento desses penduricalhos (entenda o cálculo no fim deste texto).

Quem recebeu

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O UOL tentou contato com todos os juízes citados. O único que respondeu com uma manifestação foi Pedro Cansanção.

Ele afirma que já tinha tempo de magistratura suficiente para se aposentar quando veio a decisão da aposentadoria compulsória. E que, por isso, seus vencimentos são integrais.

Sobre a sua punição, diz que "o Judiciário está passando por uma tendência de endurecimento punitivista, na qual interpretações políticas acabam por se sobrepor à legalidade estrita".

Leia aqui a manifestação completa de Pedro Cansanção.

Por que ainda recebem

O UOL entrou em contato com o CNJ e com 4 tribunais que pagaram adicionais a 5 magistrados punidos com a aposentadoria compulsória.

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Todos argumentam que os pagamentos são retroativos, referentes ao período em que os juízes estavam em atividade.

Leia aqui a íntegra das respostas.

Há casos em que os benefícios foram reconhecidos depois da punição dos juízes e começaram a ser pagos retroativamente. É o caso de pagamento de licença compensatória.

O benefício que dá 10 dias de folga (que podem ser convertidas em dinheiro) por mês a juízes que acumulam funções e trabalho extra foi instituído na maioria dos tribunais em 2024.

Juízes punidos com a aposentadoria muito antes, no entanto, têm recebido o benefício. O UOL identificou R$ 600 mil pagos nesse adicional.

O TJ-SP pagou em dezembro de 2024 e janeiro de 2025 um total de R$ 125 mil desse benefício a Otavio Henrique de Souza.

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O desembargador havia sido aposentado compulsoriamente em 2016, acusado de libertar ilegalmente um traficante de drogas de São Paulo.

O mesmo acontece com o pagamento retroativo, pelo TJ-AL, de gratificações de acervo e adicional por tempo de serviço.

O tribunal diz que "referem-se a direitos adquiridos durante o período em que os magistrados estavam na ativa".

Na prática, quando tribunais instituem novas gratificações calculadas em relação a períodos anteriores, acabam beneficiando juízes aposentados, incluindo os penalizados com a aposentadoria.

Também é frequente a venda de férias desses juízes após terem sido punidos com a aposentadoria.

Como os magistrados têm direito a 60 dias de férias anuais (além das licenças), acabam acumulando dias. Quando são punidos com a aposentadoria, vendem os dias acumulados.

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O UOL identificou R$ 1,1 milhão gasto com o pagamento de férias não desfrutadas aos juízes aposentados compulsoriamente.

Como foi feito o levantamento

Dados do CNJ mostram que 31 magistrados tiveram pena de aposentadoria compulsória nos últimos 5 anos.

Em resposta a um pedido com base na Lei de Acesso à Informação, o órgão se recusou a enviar à reportagem a lista com nomes e detalhes dos casos.

O levantamento do UOL foi feito com busca ativa em notícias e processos do CNJ no próprio site da instituição.

Foram encontrados 25 magistrados para os quais foi divulgada a pena de aposentadoria compulsória.

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Em alguns casos, a aposentadoria era anterior, e o CNJ apenas manteve o entendimento ao julgar um recurso.

O cálculo dos adicionais foi feito apenas para os meses posteriores à aposentadoria compulsória e excluiu as seguintes verbas: auxílio-saúde, gratificação natalina e um terço de férias.

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