Com 2 anos no cargo, novatos do TJ-SP já ganham mais que ministros do STF

Ler resumo da notícia
Dos 99 juízes que entraram para o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) em 2023, pelo menos 93 já recebiam mais do que um ministro do STF dois anos depois de empossados.
O calouro que obteve a menor remuneração líquida, na média, recebeu R$ 39 mil por mês em 2024. O juiz iniciante com a maior média, R$ 75 mil por mês.
Para comparação, o ministro do Supremo com o maior contracheque, Gilmar Mendes, recebeu R$ 36 mil líquidos por mês em 2024, já considerando descontos como imposto de renda, previdência e abate-teto.
O cálculo para se chegar aos pagamentos aos calouros do TJ-SP e aos ministros do STF foi feito considerando as gratificações (como auxílio-moradia, auxílio por acúmulo de função, gratificação natalina, etc.) e também os descontos.
Magistrados recém-aprovados são, na maior parte, juízes substitutos. Vários estão em cidades pequenas do interior de SP, como Dracena (45 mil habitantes). Há também quem atue em cidades maiores na Grande São Paulo, como Guarulhos.
Procurado, o TJ-SP disse em nota que o órgão "efetua, regularmente, pagamentos a magistrados e servidores de valores em atraso".
Não explicou, porém, se valores em atraso também são devidos à turma de juízes que começou a trabalhar em 2023. Leia aqui a íntegra da nota.
Tribunal Militar de MG e juízes do 'vale-peru' lideram ranking
O salário dos ministros do STF é considerado o teto do funcionalismo público. Ninguém deveria ganhar mais que eles.
Mas, como o UOL já mostrou, receber mais que Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e companhia não é exclusividade dos novatos do TJ-SP.
Na série Brasil dos Privilégios, o UOL traça um panorama dessa elite do funcionalismo que tem ampliado seus rendimentos aceleradamente.
Assine a newsletter para acompanhar todas as reportagens da série.
O TJM-MG (Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais) é o que, desconsiderando distorções de salários muito altos, teve seus juízes mais bem remunerados em 2024.
O UOL calculou a mediana, o juiz que está entre o que mais recebe e o que menos ganha, em 57 tribunais. No TJM-MG, esse ponto médio entre as maiores e menores remunerações foi de R$ 123 mil por mês em 2024. É quase o quádruplo do que receberam os ministros do STF.
A maior parte da remuneração vem de pagamentos retroativos não especificados pelo tribunal em sua base de dados.
Em nota enviada ao UOL, o TJM-MG diz que há nos contracheques consultados "diferenças retroativas, indenizações de férias-prêmio e de férias anuais, além de compensações por saldo de dias de crédito". Leia aqui a íntegra.
No TJ-MT (Tribunal de Justiça de Mato Grosso), que ficou conhecido pelo caso do vale-peru, a mediana de remuneração foi de R$ 110 mil por mês. Os contracheques desses juízes indicam principalmente adicionais relacionados a acúmulo de processos.
O TJ-MT não respondeu à reportagem.
Veja a seguir o ranking dos tribunais que tiveram os magistrados mais bem remunerados em 2024. Na média, todos superam em valores líquidos o teto do STF.

Como revelou reportagem do UOL, nove em cada dez juízes do país, nas mais diversas cortes, receberam mais que os ministros do Supremo em 2024.
As altas remunerações ocorrem por causa de uma exceção à regra constitucional: verbas classificadas como "indenizatórias" não contam para o cálculo de estouro do teto.
Nos últimos anos, várias delas têm sido criadas e regulamentadas, como auxílio-moradia, auxílio-alimentação e gratificação por acúmulo de função.
Outra forma de expandir os salários é vender as férias.
"Os juízes não abrem mão de algo que é imoral: 2 meses de férias, que acabam sendo vendidas e, com isso, você multiplica o salário", diz o professor Conrado Hübner Mendes, professor de direito constitucional na USP (Universidade de São Paulo).
Levantamento do UOL com dados da Transparência Brasil mostra que, em 2024, a venda de férias custou ao menos R$ 1,1 bilhão aos cofres públicos.
Ministros do STF não acumulam penduricalhos
Ao contrário do que ocorre na maioria dos tribunais, STF e o STJ (Superior Tribunal de Justiça) não costumam acumular penduricalhos que fazem o salário dos juízes extrapolar o teto.
Mas isso não significa que sua renda seja menor que a de outros juízes, diz Hübner Mendes, que cita a possibilidade de renda dos ministros por aulas ou palestras.
O professor alerta para o risco de situações em que há chance de magistrados se valerem do poder do cargo para influenciar valores pagos por entes privados a si mesmos ou a familiares.
"É muito grave a não declaração de impedimento quando um advogado parente de ministro advoga num caso. A advocacia de elite paulistana, por exemplo, precisa fazer parceria [contratar] com parentes de ministros para ter um bom acesso no STF", critica o professor.
Avaliação do Supremo
O STF afirma, via assessoria de imprensa, que a participação do Judiciário sobre o PIB nacional vem caindo nos últimos anos e que "não apoia pagamentos ilegais ou ilegítimos, mas uma distinção é necessária a respeito de benefícios que podem ser legitimamente pagos acima do teto, como eventual acúmulo de varas ou acúmulo de acervo".
Diz ainda que "o Judiciário brasileiro é o mais produtivo do mundo" e que apoia a discussão de propostas no Congresso para estabelecer quais vantagens podem ser pagas ou não.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.