'Sou fã e impersonator': a brasileira que vive na Europa imitando a Rihanna
A chamada de vídeo se inicia e surge um rosto facilmente reconhecível em qualquer canto do mundo: o formato oval, a boca pintada de vermelho num sorriso e os olhos verdes realçados pelo rímel. O ângulo dá um ligeiro bug no cérebro do outro lado da tela. Por um segundo, é como se a Rihanna estivesse ali.
Mas o rosto logo se mexe e a boca começa a falar em claro português, desmanchando a ilusão. Rose Cohen, 33, está acostumada com isso desde os 17 anos, quando amigos alertavam sobre a semelhança com uma cantora pop que tinha acabado de surgir. Já tinha ouvido a música "Pon de Replay" na rádio, mas precisou pagar uma hora na lan house pra checar na internet como era a artista. "Fiquei apaixonada, senti uma enorme identificação no jeito dela, mas eu não me via ali, não me achava parecida."
Hoje Rose é impersonator da Rihanna. Um trabalho que a fez viajar por países como França, Espanha, Itália, Alemanha, Bélgica e Colômbia ao longo dos últimos 12 anos, abrindo espaço para uma arte comum no Brasil, mas que não era tão bem vista na Europa: a de imitador de famosos.
Ela explica o conceito: "O sósia é uma pessoa que trabalha mais com a imagem, ela parece com alguém e faz uma coisa baseada na aparência. O impersonator é o imitador, que reproduz alguma coisa".
No caso dela, não basta realçar os traços parecidos com Rihanna em seu próprio rosto. Um impersonator deve ir além e criar a ilusão no palco: reproduz nos mínimos detalhes movimentos, figurinos, gestos, coreografias e até cenários de clipes e shows.
Por causa disso, Rose anda com o coração aos pulos. A artista que ela resolveu homenagear ainda na adolescência passou sete anos sem fazer show. O grande retorno de Rihanna tem data marcada: será com uma apresentação no intervalo do Super Bowl, neste domingo (12).
A volta de Rihanna é tratada como um grande evento pelos fãs e isso já se refletiu nos shows de Rose — já há datas reservadas na agenda dela para as semanas seguintes ao Super Bowl. Também há expectativa sobre como a brasileira vai reproduzir o grande retorno da artista, e esse trabalho minucioso deve começar exatamente quando o show for ao ar.
"Estamos engatilhados, com uma página em branco de caderno. No mesmo instante, nós vamos printar, tirar foto, vamos mandar para os costureiros, pra ficar o mais idêntico possível. Dois dias depois a gente já vai começar a ensaiar", explica Rose. "A gente está morrendo de medo, nem sei o que montar. Tem o lado fã, que está ansiosa pra ver, mas como impersonator vem a cobrança: 'Meu Deus, tomara que eu consiga fazer'."
É uma questão de profissionalismo — o trabalho hoje toma todo seu tempo e a fez se mudar há dois anos para Barcelona, na Espanha —, mas vai além: "Através da reprodução é que fazemos uma homenagem."
Rihanna de Osasco
Enquanto Rihanna despontava como uma revelação do pop, Rose mantinha a rotina diária no busão, que pegava do bairro do Veloso, em Osasco, na região metropolitana de São Paulo, até o centro da cidade para trabalhar no shopping. Passava a catraca chamando atenção. "Eu tinha 17 e na minha cabeça eu estava sempre estilosa, com meu chapéu pro lado, minha bota e passando a catraca", diz. "Eu levava muita bronca do gerente do McDonald's porque gostava de me maquiar."
Pouco tempo depois, em 2007, enquanto a Rihanna de verdade estourava mundialmente com o sucesso "Umbrella", Rose teria seu estilo e beleza reconhecidos como vendedora numa loja de roupa.
Ver as fotos da Rihanna na internet da lan house abria ainda mais as possibilidades para sua estética: o batom vermelho, por exemplo, passou a ser item essencial. "Eu achava que só combinaria com uma mulher loira, de olhos azuis. E quando vi a Rihanna assim eu achei ela maravilhosa", diz. "Isso faz muitos anos, estou falando de coisas que hoje já fazem mais sentido na nossa cabeça", reconhece.
Rose trabalhou também como modelo em eventos de marcas e ouvia os mesmos comentários — "você se parece com aquela cantora". Uma delas foi feita por uma conhecida, que queria abrir uma agência de artistas para festas e eventos. Chegou com a proposta para Rose assumir a semelhança e virar impersonator.
Começaram a ensaiar numa garagem, uma vez por semana, dissecando clipes e shows, num eterno pausar para entender como a Rihanna de verdade se mexia, respirava se comportava. "O meu problema era a coreografia, eu não dançava nada."
Ela conta ter aprendido a arte da imitação com os maiores artistas pop desse mundo invertido. "Tinha a impersonator da Beyoncé, da Britney Spears, da Katy Perry e da Lady Gaga. Todos tinham como foco prestar homenagem e trocar com outros fãs. Ver os figurinos iguais, a performance idêntica, é uma coisa mágica, ainda mais no Brasil, onde é mais difícil. Esses artistas vêm pra cá de cinco em cinco anos, e às vezes não se tem o dinheiro para ir ao show", explica.
Os primeiros shows de Rose como Rihanna cover aconteceram em 2009, e todo o visual que ela levava aos palquinhos nascia em Osasco. "Minha casa parecia um ateliê. Minha mãe na máquina, fazendo o figurino pra mim e mais seis bailarinos, eu fazendo colares colando pedras e meu pai pintando uma bota em cima de um cabo de vassoura." O cenário da turnê "Loud", que Rihanna fez em 2011, foi recriado ali, com canos de PVC e luzes de LED.
Naquele ano, Rose foi para a Itália para pequenas apresentações em restaurantes e abertura de lojas, e foi contratada pelo Rock in Rio, para tirar foto com o público, no dia que a americana se apresentaria pela primeira vez no Brasil. Um trabalho de sete dias que ela encarou ao lado dos sósias de Stevie Wonder e Freddie Mercury.
A partir daí, emendou suas próprias turnês no Brasil e na Europa, tocadas por uma equipe com coreógrafo, agente e produtor. Se apresentou em baladas, eventos e muitas paradas LGBTQIA+. Era praticamente um campo novo a ser explorado.
"Na nossa cultura, a coisa do sósia e do imitador é algo comum, mas lá eles tinham isso como uma coisa meio brega. Estavam acostumados a ver impersonators só de Elvis Presley, algo ultrapassado. A gente teve que trabalhar pra mostrar que era uma coisa fresca, atual. A gente conquistou esse mercado aos poucos."
A viagem mais memorável foi justamente para Barbados, nas ilhas caribenhas, país de origem de Rihanna. Se apresentou em um evento e foi visitar a casa onde a artista viveu, um patrimônio da capital Bridgetown. Rose conta que uma vizinha ficou impressionada com com ela e sacou logo um álbum de fotos com a cantora ainda criança. "Tinha o autógrafo da Rihanna e a vizinha pediu pra que eu assinasse embaixo."
O retorno de Rose
Enquanto aguarda o retorno de Rihanna para definir seus próximos passos como impersonator, a Rose vive ainda seu próprio "comeback", após um período difícil durante a pandemia.
Ela vinha de uma série de shows na América Latina quando tudo parou. "Sofri muito bullying de escola. Por mais que a gente ache que está tudo bem, isso refletiu na minha autoestima. Na pandemia, piorou", lembra.
"Eu achava que não conseguia fazer nada direito, principalmente fazendo Rihanna no palco, uma pessoa que faz coisas tão perfeitas. Eu não queria mais aparecer na câmera, me achava feia, achava que não conseguia me expressar bem."
Durante um tempo, deixou claro para os mais próximos que a carreira de impersonator da Rihanna tinha chegado ao fim. Só se reconectou quando voltou aos palcos, em 2021, no Emirados Árabes Unidos. Eram só 15 minutos de show, com cachê e viagem toda paga. "Eles estavam fazendo questão. Foi um renascimento. Eu tinha na minha cabeça que eu não ia mais voltar, até por não me achar boa o bastante pra aquilo."
Mais do que a agenda de shows, o retorno da autoestima ainda está em processo. "Porque a Rihanna eu sou só no palco, quando eu saio eu sou a Rose desastrada, que desce do palco e já começa a tropeçar."
Rose deve assistir ao retorno da diva na sua antiga casa no Brasil, cercada de amigos e outros fãs de Rihanna. "Pra chorar todo mundo junto e no dia seguinte, ir à rua 25 de março comprar todo os balangadãs para meu show."
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