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Anvisa vaza dados de desembargador a advogada condenada por caluniá-lo

Após seu casamento, o desembargador Héctor Valverde Santana, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, recebeu um SMS de parabenização: "Para completar a felicidade, só falta providenciar com Sua Excelência a sua internação [psiquiátrica]. Tomara que não demore".

Foi para a autora desta mensagem, a advogada Clarice Pinto, que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) forneceu dados sobre o consumo de medicamentos controlados do desembargador, sem o consentimento dele, em março de 2021. A agência tem obrigação legal de proteger os dados pessoais em seu poder.

Há dezenove anos, desde que invadiu uma audiência em Brasília e levou um pito de Santana, Clarice tenta afastá-lo de suas funções. Em ações que vão do Conselho Nacional de Justiça ao Supremo Tribunal Federal, a advogada insiste, sem prova ou indício, que o desembargador é "insano mental" e "esquizofrênico".

A própria advogada disse, em outro SMS enviado a Santana, que uma das ações que ingressou contra ele foi seu "presente de casamento": uma representação na Corregedoria do tribunal onde atua, "para que promovam exames psiquiátricos em vc".

Nenhum dos casos foi para frente. A advogada acredita em um complô de "gente poderosíssima" do Judiciário, inclusive ministros, para defender o desembargador.

Já Clarice foi condenada por seus atos em relação a Santana. Em 2007, por calúnia. Em 2015, por injúria e por perturbar a tranquilidade da vítima. As penas foram convertidas em medidas alternativas à prisão.

Detetive e Lei de Acesso

Derrotada nos tribunais, Clarice passou a usar a Lei de Acesso à Informação contra o desembargador. Perguntou à Anvisa quais "medicamentos controlados psiquiátricos" ele tomava, qual era sua "doença psiquiátrica" e quem eram os médicos que haviam feito as prescrições.

A Anvisa atendeu o pedido parcialmente. Informou a Clarice o número de vezes que o desembargador aparece no sistema nacional de remédios controlados como "comprador ou paciente". Mas se negou a dar informações que considerou "sigilosas", como os nomes dos remédios e diagnósticos.

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Em entrevista ao UOL, Clarice disse que também usou a Lei de Acesso para tentar obter informações do desembargador junto ao Ministério da Justiça, à Polícia Federal e à Abin. "Enquanto eu for viva, eu vou buscar e um dia eu vou ter a informação que eu pretendo ter", falou.

Relatou ainda que contratou um detetive e levantou o histórico de saúde dos familiares de Santana. De fato, em habeas corpus ao STF, após uma de suas condenações, a advogada lançou suspeitas infundadas de que mãe e irmãos do desembargador teriam esquizofrenia, "para a qual a predisposição genética é certa".

Além de enviar SMS, Clarice também deixou carta na casa do desembargador, o abordou no fórum e até na faculdade onde ele dá aula. Segundo ela, Santana se encontra atualmente em um hospital. "Até onde ele está internado eu sei". Mas o desembargador está saudável, trabalhando em seu gabinete.

Leo Índio e Lula

Além de advogar em causa própria nos processos contra Santana, Clarice tem uma atuação jurídica abrangente. Defende Leo Índio, sobrinho do ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de ter invadido os prédios dos Três Poderes na tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023.

Também já impetrou habeas corpus em favor do presidente Lula no STF, em 2018 — à revelia dele e de seus advogados.

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Atua também em pequenas causas, como dívidas de condomínio. Em alguns desses casos, diz ter tido julgamentos desfavoráveis por culpa de Santana, que teria influenciado juízes diversos contra ela.

É com base nessa alegada perseguição judicial que a advogada sustentou seu pedido à Anvisa: diz não precisar do consentimento do desembargador para acessar dados da saúde dele por uma questão de "direitos humanos" — no caso, o direito de ela "ser ouvida por juiz ou tribunal competente, independente, imparcial".

Procurada, a Anvisa confirmou ter enviado os dados de saúde que estão no nome de Santana. O desembargador não sabia que seus dados haviam sido fornecidos. Após contato do UOL, mostrou-se surpreso, mas disse que preferia não comentar.

Já Clarice segue em busca de provar que o desembargador tem esquizofrenia. "O exame de insanidade é só para aferir até que ponto as capacidades mentais dele estariam prejudicadas. Tenho a convicção", disse.

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