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Os 71 terrenos que ligam Milton Leite a acusado de lavar dinheiro do PCC

O presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), e o dirigente da empresa de ônibus Transwolff, Luiz Carlos Efigênio Pacheco, fizeram ao menos 71 acordos imobiliários.

Pacheco, conhecido como Pandora, é investigado por elo com o PCC.

Investigação da Operação Fim da Linha, conduzida pelo MP-SP (Ministério Público de São Paulo), apura se Leite e Pandora são sócios. O presidente da Câmara nega essa relação.

A Transwolff é acusada de lavar dinheiro para o PCC.

O UOL fez um levantamento inédito de imóveis que vinculam Leite a Pandora. A reportagem teve acesso a matrículas e escrituras registradas em cartório.

Os 71 acordos referem-se a terrenos do loteamento Jardim Nathália, em Sorocaba, no interior de São Paulo.

As negociações ocorreram entre 2015 e 2023 e envolvem a Neumax, construtora da família de Milton Leite, e a LCP Empreendimentos e Participações, holding da qual Pandora é sócio.

O valor total dos lotes negociados é de R$ 8,37 milhões. Ao menos cinco deles foram bloqueados judicialmente — a pedido do MP, a Justiça bloqueou bens de Pandora, réu na Operação Fim da Linha.

Pandora foi preso em abril, quando a operação foi deflagrada, e liberado em junho, após um habeas corpus.

Procurada pela reportagem, a defesa de Pandora afirmou que não vai se manifestar pois a ação judicial da Operação Fim da Linha corre em segredo de Justiça.

Leite também é um dos investigados. Promotores afirmam no inquérito haver indícios de uma "relação de apoio" entre o político e a transportadora Transwolff.

Em entrevista ao UOL, em julho, o vereador classificou a relação com Pandora como "institucional", pois diz conhecer todos os empresários e sindicalistas do setor de transporte.

Em outra ocasião, em setembro, disse estar sendo perseguido politicamente pela reportagem.

Procurado novamente nesta segunda-feira (11), o vereador afirmou, via assessoria de imprensa, que não se vê "obrigado a responder a mais esses ataques sem fundamento algum". "Não há e nunca houve ilegalidade nos negócios da minha empresa", disse, em nota.

Milton Leite (União Brasil) na entrega de ônibus elétricos da Transwolff, em 2023
Milton Leite (União Brasil) na entrega de ônibus elétricos da Transwolff, em 2023 Imagem: Reprodução

Tudo acontece em Sorocaba

A LCP, holding que negociou os lotes no empreendimento de Leite, foi aberta em 2013 por Daniela Prado dos Santos, sobrinha do contador Carlos Eduardo Prado, que é amigo do vereador e foi contratado pela Transwolff.

Pandora entrou na empresa como sócio e administrador em 2015, conforme registro na Junta Comercial, ao qual a reportagem teve acesso.

No fim de 2023, ele deixou o cargo da empresa. Ficou no seu lugar o filho Matheus Magela Pacheco.

Pandora foi um tipo de investidor muito próximo do empreendimento Jardim Nathália, apurou a reportagem.

Fontes ligadas ao loteamento relatam que ele frequentava o terreno no bairro Éden, na zona industrial de Sorocaba, a cerca de 103 km de São Paulo.

Endereço indicado por Pandora é casa dos Leite na zona sul de São Paulo
Endereço indicado por Pandora é casa dos Leite na zona sul de São Paulo Imagem: Pedro Borges/UOL

Na documentação acessada pela reportagem, há diferentes tipos de acordo entre a LCP e a Neumax em Sorocaba.

Num deles, o endereço que Pandora indicou para receber os boletos da sua holding é o mesmo da casa dos Leite e sede da Neumax, situada no bairro Veleiros, zona sul de São Paulo.

Há escrituras assinadas por Pandora, como comprador, e por Neusa Leite, como vendedora em nome da Neumax — ela é casada com o político e sócia da construtora. Também há documentos assinados por Leite.

Em muitas das transações, foi usada a expressão "comprometeu-se a vender".

Isso significa que o proprietário assumiu o compromisso de vender o imóvel ao comprador após o cumprimento de condições.

"'Comprometeu-se a vender' é um contrato preliminar. Nesse compromisso há condições a serem cumpridas. Quando elas são cumpridas, celebra-se a escritura, registra-se num cartório de imóvel e aí, de fato, se transfere a propriedade", explica a advogada Kelly Durazzo, presidente da Comissão de Loteamentos da OAB-SP.

"Mas, no caso de um loteamento, a escritura pode ser substituída por prova da quitação do pagamento e simples ato de registro junto ao cartório de imóveis", completa.

Segundo uma das escrituras acessadas pela reportagem, entre as condições estava a conclusão da infraestrutura básica do lote (asfalto, água e luz, por exemplo).

Outro tipo de transação foi "permuta", com títulos de propriedades da Neumax sendo passados para a LCP.

"Permuta" é uma troca de um imóvel por outro, diz Durazzo.

Um dos negócios entre Neumax (construtora de Leite) e LCP (holding de Pandora)
Um dos negócios entre Neumax (construtora de Leite) e LCP (holding de Pandora) Imagem: Reprodução

O que é o Jardim Nathália

Iniciado em 2015, o Jardim Nathália ocupa uma área de 743 mil m².

De acordo com apuração do site Alma Preta, o loteamento tem 2.045 residências, de construções mais simples a casas de alto padrão, campo de futebol, quadra poliesportiva, duas quadras de society e academia ao ar livre.

Filho de Leite, o deputado estadual Milton Leite Filho (União Brasil) destinou emenda parlamentar de R$ 300 mil para reformar uma quadra a menos de 1 km do loteamento, em 2023.

Leite deslocou aliados de confiança de São Paulo para acompanhar de perto o empreendimento em Sorocaba, apurou o UOL.

Loteamento Jardim Nathália, na zona industrial de Sorocaba, a 103 km de São Paulo
Loteamento Jardim Nathália, na zona industrial de Sorocaba, a 103 km de São Paulo Imagem: Divulgação

Entre eles, Patrícia Araújo, que foi secretária da Presidência da Câmara e hoje é chefe de gabinete da Setram (Secretaria Executiva de Transporte e Mobilidade Urbana); Solange Gomes, assistente parlamentar e hoje tesoureira-adjunta do União Brasil; e Reonaldo Raitz Leandro, superintendente da Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo) até julho deste ano.

Patrícia e Solange foram citadas no inquérito da Operação Fim da Linha.

O UOL apurou que Patrícia também organizou churrascos e festas para funcionários, aliados e amigos de Leite nos finais de semana de plantões de vendas da Neumax em Sorocaba. Pandora era um dos convidados.

Fontes relatam que as festas ficaram famosas na cidade, pois chegaram a incomodar vizinhos pelo barulho.

Procurados, Patrícia, Solange e Leandro não responderam à reportagem.

Prado afirmou que qualquer relação com Leite e Pandora é "estritamente profissional". "Todas as minhas atividades profissionais e quaisquer relações que mantenho com a empresa Transwolff, ou com o senhor Milton Leite, são conduzidas dentro dos limites legais e regulamentares", disse, em nota.

Leite sempre negou ter negócios com Pandora e a Transwolff.

O UOL revelou que a Transwolff contratou o advogado e o contador amigo do político. Também revelou que Pandora assinou contrato de aluguel de mais de R$ 800 mil por mês por um conjunto industrial da Neumax, na zona sul de São Paulo. Hoje, o endereço é uma das maiores garagens da Transwolff.

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