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Um dos empresários mais influentes do Brasil, Rubens Ometto Silveira Mello, 74, nunca foi de rasgar dinheiro.
Dono de um patrimônio de US$ 1,9 bilhão, ele é conhecido no mercado por ser um investidor voraz, que não deixa as oportunidades passarem.
Seu grupo, a Cosan, reúne companhias como a distribuidora de etanol e açúcar Raízen, a gestora de ativos de gás natural Compass, a distribuidora de lubrificantes Moove e a operadora logística de ferrovias Rumo. Ao todo, emprega mais de 50 mil pessoas.
A Raízen, fruto de uma parceria comercial entre a Cosan e a Shell, tem sociedade com a Femsa, distribuidora da Coca-Cola no país, para o desenvolvimento da rede de lojas Oxxo no Brasil.
Trata-se de um "capitalista selvagem", segundo o já falecido Antônio Delfim Netto, ministro várias vezes durante a ditadura militar e com quem o empresário teve rusgas no governo Figueiredo (1979-1985).
Mas o empresário, que já foi um dos dez homens mais ricos do Brasil, vive um "inferno astral" —ele caiu para a 46ª posição entre os brasileiros mais abastados no ranking da Forbes.
Ometto mantém o título de "rei do etanol", mas a operação para viabilizar a entrada na Vale, sua grande jogada, acabou levando ao endividamento elevado de suas empresas.
Com a venda da participação na mineradora, estima-se que o prejuízo da Cosan —e dos bancos que a assessoraram— na operação tenha sido entre R$ 5 bilhões e R$ 7,5 bilhões.
Ometto admite que está "colocando o pé no freio" diante dos riscos de um cenário de juros altos.
"O que mais me frustra é ter de parar de investir. Eu vejo tantos ativos baratos que eu queria ter dinheiro para comprar, mas se tem que parar, é isso que vou fazer", afirma.
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A raiva passa, os acordos ficam
Ele credita a situação da economia ao que considera falta de empenho do governo com o ajuste fiscal das contas públicas, o que dificultaria o investimento privado em infraestrutura.
"Estamos 'ferrados' porque a alta administração do nosso país acha que está certo e não quer fazer nada", disse Ometto, em dezembro de 2024, num evento ao lado do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo.
O empresário contou ao UOL que recebe puxões de orelha de pessoas próximas quando faz declarações desse tipo.
"Disseram que eu não poderia ter falado isso ou aquilo, mas você conhece aquela música 'Na Hora da Raiva'? Na hora da raiva, as coisas saem", explica, em alusão à canção da dupla sertaneja Henrique & Juliano. "Ora, metade do meu sangue é italiano."
Ao mesmo tempo em que detona governantes, Ometto costura acordos —a Raízen acabou de receber empréstimo de R$ 1 bilhão do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Mas o investimento do qual Ometto não abre mão é o de construir relações com pessoas influentes, independentemente de qual for o humor do mercado ou do governo.
Essa foi uma lição que aprendeu primeiro com seu avô, Pedro Ometto (1893-1966), e depois com José Ermírio de Moraes Filho (1926-2001), quando trabalhou para a Votorantim nos anos 1970.
Ometto já foi chamado de "bolsonarista" por sua proximidade com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus ministros, como o atual governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Mas ele também foi o primeiro empresário a ser recebido em uma agenda privada por Lula e se diz amigo da ex-presidente Dilma Rousseff.
"[Ometto] Tem ousadia, coragem, conhecimento e paixão pelo país", afirma João Doria, ex-governador de São Paulo.
Em 2021, Ometto conseguiu antecipar em quase dez anos com o governo de São Paulo, à época administrado por Doria, a renovação da concessão da Comgás, empresa da Compass, para prestação de serviço no estado.
Esse negócio ligou Ometto à construção de um gasoduto entre São Paulo e Santos, o que provocou reclamação dos concorrentes. "Intriga da oposição", responde ele, ao ressaltar que o projeto está operando.
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Valeu a pena?
Ometto lamenta a venda da participação na Vale. Ele havia comprado 6,5% da empresa após a Cosan montar uma megaoperação de mais de R$ 20 bilhões com Bradesco e Itaú.
Com a queda do valor dos papéis e incertezas na economia, o empresário vendeu primeiro apenas uma parte das ações, mas acabou liquidando os 4,05% que restavam.
"Dói [ter de se desfazer das ações], porque sou empreendedor. Meus planos eram outros. Mas a economia mudou muito, com esses juros todos", afirmou ao UOL.
A saída da Cosan era recomendada por analistas, mas não houve como evitar o endividamento do grupo no processo —ao fim do terceiro trimestre de 2024, a dívida líquida era de R$ 21,7 bilhões.
Segundo fontes ouvidas pelo UOL, esse foi o preço pago pelo empresário para ter influência na Vale.
A dívida do grupo, na reestruturação feita por causa da Vale, chega a R$ 59 bilhões.
Com uma das 13 cadeiras do conselho de administração, a Cosan fez coro pela saída do CEO Eduardo Bartolomeo.
"O Eduardo não falava com ninguém. Ele tinha uma certa arrogância", reclama Ometto. "E o momento [da Vale] é de voltar a investir e de ter um relacionamento bom com o governo", completa.
Após sonhar com Luís Henrique Guimarães, ex-CEO da própria Cosan, à frente da mineradora, Ometto teve que lidar com nomes como o do ex-ministro Guido Mantega, lançado pela Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil).
O nome de Mantega foi mal-recebido pelo mercado e causou intrigas no conselho, além de frustrar os planos da Cosan.
"[Ometto] não queria que eu me tornasse o CEO porque ele queria comandar. Era a formiguinha querendo controlar o elefante", diz Mantega.
Ometto negou o desejo de assumir a mineradora. "A gente enxergou na Vale uma empresa que é uma corporation, com sócios que não tinham perfil de dono", afirma.
Gustavo Pimenta, que era diretor financeiro da Vale, substituiu Bartolomeo em outubro de 2024.
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Venda de ativos
Principal negócio de Ometto, a Raízen tem deixado investidores apreensivos. A dívida da empresa cresceu 19,5% em um ano, para R$ 35,9 bilhões.
Após um pacote inicial para venda de ativos, o mercado espera medidas mais duras, como a saída da rede de lojas Oxxo, que tem dado prejuízo milionário.
Ometto admitiu ao UOL a possibilidade de saída da Oxxo, negócio tocado em parceria com a Femsa no Brasil.
"O investimento no varejo saiu um pouco do nosso foco. Isso é um problema", diz o empresário. "A Oxxo ainda não gera caixa. Um dia vai gerar", completa.
A dívida líquida do Grupo Nós, nome dado à sociedade entre Raízen e Femsa, era de R$ 253 milhões até o primeiro trimestre de 2023.
Em novembro do ano passado, a Raízen anunciou a saída de Ricardo Mussa da presidência da empresa, cargo que ocupava desde 2020.
"Ele era muito querido, mas o problema é que era muito intelectualizado. Para você ser o CEO da companhia você precisa acompanhar tudo a fundo, não só a parte estratégica", diz Ometto.
Dezenas de executivos também deixaram a companhia em dezembro, o que gerou insegurança na empresa.
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Poder e doações
Nascido e criado nas usinas da família, em Piracicaba (SP), Ometto foi morar com familiares na capital paulista aos 16 anos. Dos primos, ouvia que era "caipira demais".
Ele passou no vestibular de Engenharia de Produção Mecânica na Escola Politécnica da USP e, com ajuda de amigos, conseguiu um estágio no Unibanco, hoje Itaú-Unibanco, em 1971.
Em uma festa de família organizada pelo sogro de Ometto, o banqueiro Guilherme Mellão, no Terraço Itália, conheceu Ermírio de Moraes Filho, que o levou para a Votorantim.
Com o novo parceiro, começou a frequentar ambientes com políticos e figurões da época da ditadura militar.
Sempre brigou por seus interesses junto a governantes, tanto que se tornou o maior doador do país para campanhas políticas —desde 2016, empresas são proibidas de fazer doações.
Entre as eleições disputadas nesse período, o empresário doou mais de R$ 37 milhões -o maior agraciado foi o prefeito reeleito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD), que ganhou R$ 2 milhões.
Somente em 2024, Binho, como Ometto é chamado pelos mais próximos, doou R$ 19 milhões para as campanhas de 189 candidatos de 102 cidades. O PSD, de Gilberto Kassab, foi o mais favorecido.
Em Igreja Nova (AL), Ometto financiou a campanha de sete dos 11 vereadores eleitos, além do prefeito Tiago Mateus (MDB). A região é conhecida pelo cultivo da cana-de-açúcar.
Questionado se haveria parceiros de negócios entre esses candidatos, ele diz que "tem de tudo".
"O meu partido político é o nosso país, o Brasil. E você tem que conversar com todos e trocar ideias com todos."
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Vícios e virtudes
Ometto conta que teve bronquite asmática na infância. Hoje, por causa da hipoglicemia, admite o vício em Coca-Cola.
"Eu preciso de açúcar e ando com Coca-Cola pra cima e pra baixo. Quando chego em casa cansado, tomo um banho quente e uma Coca gelada. Fico zero bala."
Frequentador de restaurantes como Ohka, Parigi e Tambiú, o empresário é fã de culinária japonesa e noveleiro contumaz.
Convidou o dramaturgo Aguinaldo Silva (autor de "Tieta" e "Senhora do Destino", entre outras novelas) para escrever sua biografia, lançada em 2022.
"Rubens é um homem extremamente seguro de si, com uma história fantástica. Ele conhece o seu valor e tem plena consciência da sua trajetória", disse Silva ao UOL.
Ometto também se envolveu com produção de cinema —mais especificamente da pornochachanda, gênero campeão de bilheteria no país nos anos 1970.
Junto de Ermírio de Moraes Filho, ele negociou com o ator David Cardoso, ícone do estilo, e financiou dois filmes do cineasta Jean Garrett: "A Ilha do Desejo" e "Amadas e Violentadas".
Em "Amadas e Violentadas", os empresários também participaram da produção. O filme foi rodado na casa do sogro de Ometto, Mellão, e contou com uma breve participação de sua mulher, Mônica.
Ometto é apaixonado por futebol. Seu pai e irmão foram presidentes do XV de Piracicaba, e ele, quando trabalhava com Ermírio de Moraes, que teve uma fase "cartola", arrumou as finanças da CBD, atual CBF (Confederação Brasileira de Futebol).
Hoje ele diz apoiar a administração do XV, apesar de sofrer com o time, desde 2016 fora da divisão principal do Campeonato Paulista. "Nós colocamos as finanças do clube em dia, só que não aprenderam a jogar futebol", reclama.
Ele diz que torce para o clube virar SAF (Sociedade Anônima do Futebol).
Caso a ideia vingue, Ometto promete entrar no negócio. "Posso entrar sim. Sou piracicabano."
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