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Alain Delon e Bruce Willis, ícones do vigor, hoje ensinam sobre finitude
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"Acha que tem alguma chance contra nós, Senhor Caubói?".
Com um walkie-talkie numa mão e uma metralhadora na outra, a resposta de Bruce Willis (um uma espécie de "venha me pegar", seguido de um palavrão) mostrava por que o protagonista era duro de matar. Sozinho, ele rastejaria por todos os cantos do prédio invadido por criminosos para debelar sozinho um ataque terrorista. Vestia uma camiseta regata e tinha apenas um pequeno corte na altura da sobrancelha.
O filme que marcou as telas quentes da nossa infância viraria franquia ao longo dos anos. Bruce Willis manteria em fogo alto as cenas de tiro, porrada e bomba em "Duro de Matar 2", "Duro de Matar 3: A Vingança", "Duro de Matar 4.0" e "Duro de Matar 5: Um bom dia para morrer".
O espectador que conferiu os filmes um a um atravessou um quarto de século reclamando de dores nas costas, enxaqueca, indisposição gástrica e outros males da velhice, mas o Bruce Willis permaneceria ali, velho mas firme o suficiente para seguir pulando os topos de prédios em chamas contra tudo e contra todos.
Não mais.
Nesta semana, a família do ator de 67 anos anunciou, pelo Instagram, que ele fará uma pausa na carreira. Diagnosticado com afasia, doença que afeta a comunicação e suas habilidades cognitivas, ele decidiu cuidar de si ao lado da família. Para isso, "está se afastando da carreira que significou tanto para ele".
O anúncio, vindo de um ator que durante anos emprestou ao corpo não um personagem, mas o símbolo da potência humana, inquebrável e ilimitada, representou um baque. Uma projeção ao espelho se quebrava.
Esse baque só não competiu com a mensagem postada pelo ator francês Alain Delon, também em suas redes sociais, informando que o outrora homem mais bonito do mundo está se despedindo deste plano.
Aos 86 anos, ele comunicou o desejo de se submeter a um suicídio assistido, prática legalizada na Suíça, onde mora, após quase três anos de sofrimento decorrente de um acidente vascular cerebral.
A mensagem de despedida era também de agradecimento "a todos que me acompanharam ao longo dos anos e me deram grande apoio". "Espero que os futuros atores possam encontrar em mim um exemplo não só no campo do trabalho, mas na vida cotidiana entre vitórias e derrotas. Obrigado, Alain Delon."
Em seguida a rede social foi apagada.
Fica difícil ler a mensagem sem se lembrar do ator que outro dia mesmo (na verdade, já se passaram seis décadas) dava vida, corpo, bronze e vigor a figuras como Tom Ripley em "O Sol como testemunha". Nada parecia conter a fuga acelerada daquele personagem pela Riviera no comando de iates ou automóveis para encarnar, no lugar do seu oponente, o território do bon vivant.
Para fechar a semana, o cantor Phil Collins, de 71 anos, anunciou a uma plateia na Inglaterra que aquele seria seu último show. Collins já andava com a saúde debilitada há algum tempo. Não era exatamente um galã, mas no imaginário dos fãs sempre haveria entre eles, público e artista, um dia seguinte no paraíso, como em sua música mais famosa. A saída de cena, anunciada de forma clara e honesta, não deixa de representar um sinal dos tempos.
Nesses tempos, a ideia de longevidade é ainda um conceito a ser assimilado, principalmente por quem aprendeu a se despedir dos ídolos de forma brusca sem vê-los envelhecer.
Nas imagens guardadas para a posteridade, Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jim Morrison, mortos aos 27 anos num curto intervalo entre 1970 e 1971, serão sempre lembrados como velas que queimaram pelas duas pontas, num surto de criatividade autodestrutiva, e desapareceram no auge, sem rugas, cabelos brancos ou movimentos limitados. Em 2022, a imagem congelada do apogeu antes dos 30 ainda é o que aparece para quem se reencontra com eles toda vez que assiste a alguma apresentação histórica ou bota um velho e conservado álbum para tocar.
O showbiz (alguém ainda usa essa expressão?) nos ensinou a associar nossos ídolos a símbolos da eterna juventude.
A vergonha de serem flagrados longe desse esplendor durante anos condenou esses artistas a morrerem em silêncio, afastados, como animais que no fim da vida disfarçam a fraqueza com medo de se tornarem presas fáceis de outros animais.
Nas frestas de suas vidas privadas, pudemos em algum momento observar o ocaso de talentos como Christopher Reeve e descobrir que, longe da fantasia, o Super Homem era tão frágil e vulnerável aos acidentes como qualquer um de nós. Essa ferida narcísica quebrou um pacto e só se ampliou desde então.
Hoje é possível ver astros como Michael J. Fox, o menino de boné descolado que voava pelo futuro e pelo passado com um skate voador, engajados em financiar, com fundações próprias, pesquisas sobre males como a Doença de Parkinson, que o acompanha há mais de duas décadas e já foi motivo de bullying e piadas de paparazzi.
Ao assumir seus limites e anunciarem, de forma direta, que estão fora de cena para se dedicar a um fim de vida mais digno e acolhedor, os ídolos que já foram admirados pela força e pela juventude agora nos ajudam a encarar uma cena tão indesejada como inevitável: a nossa própria finitude.
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