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Podcast sobre sons, música e o mundo da escuta


Ser Sonoro #11: Como o barulho de cidades mudou a música de Michael Jackson

Michael Jackson, em show de 1986, em Nova York - Kevin Mazur/WireImage/Getty
Michael Jackson, em show de 1986, em Nova York Imagem: Kevin Mazur/WireImage/Getty

Do TAB

08/05/2021 04h01

Desde o tempo das cavernas, o ser humano procura o melhor lugar na sala para ouvir os sons. Se hoje você instala uma caixa bluetooth high tech para escutar música como se estivesse em uma sala de concerto ou para assistir a um filme como no cinema, há mais de 40 mil anos nossos antepassados procuravam o local da caverna onde os sons reverberavam melhor.

A gente sabe disso porque pesquisadores de arqueoacústica identificaram que as pinturas dos homens e mulheres das cavernas estavam exatamente nessas áreas de maior definição de som. Quem conta essa curiosidade do mundo da escuta é Fernando Cespedes, no mais novo episódio de Ser Sonoro, podcast distribuído por TAB.

Mas, lá na Idade da Pedra, os sons emitidos pelas pessoas, pelos animais e o barulho da natureza tinham pouca concorrência — tudo era escutado em alta definição, ou hi-fi. Hoje, na esquina movimentada de qualquer metrópole, separar e identificar os sons é bem mais complicado. Vivemos em lo-fi.

"Essa escuta moderna se acostumou com a intromissão e a interferência de um som no outro. Foi ela que abriu espaço pras colagens sonoras da última fase dos Beatles, pras experimentações dos Beach Boys, pros ruídos dos Mutantes, pra barulheira dos Ramones, pro looping infinito da disco music da Donna Summer, pros sons eletrônicos do Kraftwerk, pras interferências da bateria do mestre Jorjão na Viradouro, pras colagens do DJ Kool Herc, pras batidas atrasadas do J Dilla, e até pros chiados de disco antigo no som dos Racionais", lista Cespedes (ouça a partir de 5:56).

A vida é mais barulhenta, e a tecnologia veio para nos ajudar a ouvir apenas aquilo que queremos (seja uma música ou a voz de alguém ao telefone). "Se os gramofones dos anos 1920 sequer tinham volume, os sistemas de som de ponta no final dos anos 1950 eram equipamentos cheios de potência e opções de regulagem de graves e agudos", observa Cespedes (a partir de 9:47). Mais tarde, caixas de som foram sendo adaptadas para reproduzir graves e agudos com mais precisão e a tecnologia estéreo foi incorporada, entre outras inovações.

Cespedes nos apresenta, no episódio, três mixagens da música "Thriller", de Michael Jackson, para mostrar como o aumento dos sons do mundo afetou o volume da música, ao longo do tempo. Quando comparamos a original, de 1982, com duas regravações, de 1995 e 2008, fica claro como a indústria musical precisou competir com as interferências de um mundo cada vez mais barulhento.

No fim das contas, nós queremos mesmo é nos refugiar em um universo sonoro de alta definição, e o mercado sabe muito bem disso. "Essas três características do sistema hi-fi — a dinâmica entre sons fracos e fortes, a presença de graves e agudos e o estéreo — servem pra criar uma ilusão. (...) A ilusão de que você tem os melhores lugares na sala de concerto, mesmo com a máquina de lavar ligada na lavanderia, as crianças brincando no quintal e um congestionamento na rua de casa. Essa ilusão do hi-fi é fazer o ouvinte mergulhar num mundo cada vez mais raro, no qual cada som pode ser ouvido com clareza e definição" (a partir de 18:50).

Que tal pegar seu melhor fone de ouvido, fechar as janelas, as cortinas, se refugiar da paisagem sonora lo-fi da cidade e conferir o episódio completo de Ser Sonoro?

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