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O 'brabo' do corte: o barbeiro Yuri Cedro faz a cabeça dos craques mineiros

O barbeiro Yuri Cedro, 24 - Gustavo Baxter/UOL
O barbeiro Yuri Cedro, 24
Imagem: Gustavo Baxter/UOL

Nina Rocha

Colaboração para o TAB, de Belo Horizonte

25/11/2021 04h00

Com navalha e tesouras em mãos, um rapaz de Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, assiste a suas criações ganhando a cabeça de fanáticos espalhados por todo o Brasil. Nos últimos meses, Yuri Cedro conquistou uma clientela distinta que lhe trouxe grande visibilidade: atletas dos principais times de futebol de Minas Gerais.

Aos 24 anos, o barbeiro faz com que chutes a gol, faltas bem cobradas e defesas milagrosas não sejam os únicos atrativos notados em campo. Além de se destacarem pelo futebol, jogadores desejam ser notados pelo visual, e Yuri contribui de bom grado nessa missão.

Vindo do bairro Amazonas — região onde cresceu e onde montou sua barbearia —, Yuri sonhava em ser jogador de futebol quando menino, mas sabia das dificuldades da carreira esportiva. Escutou certa vez de um fiel da igreja que frequenta que, um dia, ainda estaria "metido com futebol". Não botou muita fé. Assim que terminou o ensino médio, não teve interesse em fazer faculdade. Olhava os cursos disponíveis e nenhum chamava sua atenção.

Quando ainda jogava bola, comprou uma máquina para raspar as pernas. Aproveitava o aparelho para testar cortes nos colegas. "A gente ia jogar fora, eu levava a maquininha e fazia o cabelo dos meninos", conta Yuri. Exibindo um topete alisado e as laterais raspadas em degradê, ele conta que sempre teve cuidado especial com a aparência. "Já tinha um gosto por isso. Antes dos 18 anos, eu já escovava meu próprio cabelo."

A barbearia de Yuri Cedro, em Contagem, Minas Gerais (MG) - Gustavo Baxter/UOL - Gustavo Baxter/UOL
A barbearia de Yuri Cedro, em Contagem, Minas Gerais (MG)
Imagem: Gustavo Baxter/UOL

Corte por R$ 5

Foi fuçando na internet que Yuri encontrou um curso de barbeiro. Trabalhou na recepção de uma academia e fazia bicos no bar de um tio para bancar os estudos. Quando terminou, teve dificuldade de encontrar um lugar para colocar o que aprendeu em prática. "Ninguém dava oportunidade porque eu tinha acabado de me formar e não tinha experiência nenhuma", recorda-se. Assim, surgiu a ideia de cortar cabelos em casa.

Yuri fazia os cortes na varanda sem cobrar pelo trabalho, até a mãe sugerir que cobrasse ao menos um valor simbólico, afinal, os gastos com água e eletricidade acabaram aumentando. Por R$ 5, seu nome começou a se espalhar entre amigos e moradores da região — fotos e posts nas redes sociais também ajudaram. Logo, o entra e sai de desconhecidos em casa despertou a necessidade de montar um espaço mais adequado.

Uma loja de 15 m² na mesma rua onde morava com a família estava para alugar. Sem dinheiro para investir na mobília básica, Yuri improvisou: vendeu camas usadas, comprou um lavatório, uma cadeira e retalhos de espelhos.

O sofá e a bancada foram feitos de pallets encontrados na rua com ajuda dos primos. "Ficou muito bonitinho e começou a dar mais movimento." Yuri permaneceu no local de 2016 a 2018, quando mudou-se para uma loja maior e contratou um funcionário para ajudar nos atendimentos.

Yuri Cedro em sua barbearia - Gustavo Baxter/UOL - Gustavo Baxter/UOL
Yuri Cedro em sua barbearia
Imagem: Gustavo Baxter/UOL

Barbeiro dos craques

No mesmo ano em que expandiu a loja, Yuri teve a ideia de correr atrás de um nicho com grande potencial de visibilidade: jogadores de futebol que buscam, cada vez mais, se sobressair com barbas e cabelos ousados no replay dos melhores lances da partida.

Durante o Campeonato Mineiro de 2018, contatou os times do interior que vinham disputar partidas em Belo Horizonte apresentando seu trabalho pelas redes sociais. O convite colou: começou com a Caldense, URT e Boa Esporte. Não demorou para seu nome se espalhar entre os atletas das demais equipes mineiras.

Até times internacionais já receberam o tratamento capilar de Yuri: se algum jogador de fora vem a BH para disputar campeonatos como a Libertadores e a Copa América e busca uma recomendação de barbeiro, seu nome é naturalmente sugerido. Foi assim que atendeu clubes como o Zamora, da Venezuela, e o Emelec, do Equador. "Foi difícil porque eu não sabia falar espanhol direito. Mas pra mim, que sempre tive vontade de jogar bola, foi um sonho, né?".

Yuri começou a atender jogadores do Atlético-MG a partir de uma indicação de Pedro Henrique de Oliveira Correia, o Pedrão, que defendia o América-MG e hoje está no clube português Portimonense. Cliente fiel, o atleta passou o contato do barbeiro para Maílton Sá, que jogou pelo Galo na temporada de 2020, antes de seguir para o Coritiba.

O barbeiro Yuri Cedro, 24 - Gustavo Baxter/UOL - Gustavo Baxter/UOL
O barbeiro Yuri Cedro, 24
Imagem: Gustavo Baxter/UOL

"Fui à casa dele, e ele ficou apaixonado com o corte, era um mid fade [corte com degradê na lateral da cabeça]. Passou mais uns dois cortes, ele me mandou mensagem falando que um outro colega também queria cortar." O jogador era o lateral esquerdo Guilherme Arana, reforço que tinha acabado de chegar ao Atlético.

Enquanto fã de futebol e barbeiro antenado, Yuri já observava o estilo do atleta. "Acompanhei no Corinthians, gostava muito dele, e ele sempre foi de fazer 'coisa doida' no cabelo. Quando o Arana chegou, fiquei até meio sem graça, mas depois segui ele no Instagram. Na hora ele já me seguiu de volta e mandou uma mensagem falando que gostou muito e ia cortar mais vezes."

No final da temporada do campeonato de 2020, realizado no início deste ano, por conta da pandemia, Arana descoloriu o cabelo e balançou a rede para o Galo contra o Fortaleza. Em outubro, o jogador repetiu o visual e marcou de novo contra o mesmo time, dessa vez pela Copa do Brasil, competição na qual o Atlético é finalista.

Sorte ou superstição, o lateral vai manter o loiro até o fim da disputa. Para isso, recebe Yuri a cada duas semanas para descolorir e matizar o cabelo. Os cortes são mais frequentes: acontecem sempre às vésperas dos jogos, em média duas vezes por semana. O grau no bigode e na sobrancelha fazem parte do trato. Quando o Atlético joga fora, a manutenção é feita antes da viagem.

Para deixar os clientes mais à vontade, Yuri oferece cortes em domicílio. Os valores praticados são os mesmos que na barbearia: R$ 35 para o cabelo e R$ 30 para a barba, com um acréscimo de deslocamento. Com a carta de recomendação carimbada dentro do time alvinegro, o barbeiro também atende aos jogadores Everson, Guga, Keno, Junior Alonso, Alan Franco, Tchê Tchê e Vargas. Quase metade do elenco leva na cabeça um corte de Yuri.

E não é só no Atlético: o elenco do Cruzeiro e do América também costumam usar os serviços do barbeiro, que tem lugar cativo no centro de treinamento dos clubes, facilidade que ainda não foi adotada pelo Atlético por conta da pandemia. Yuri atende onde é chamado, independentemente do time. Sua única condição é não passar das 21h, escala reservada para estar com a noiva, Carla Rayssa, e o filho recém-nascido do casal, Valentim.

Retrato de Yuri Cedro, 24, barbeiro de anos que, desde 2018, corta o cabelo e faz a barba de jogadores de futebol dos principais clubes de Minas Gerais - Gustavo Baxter/UOL - Gustavo Baxter/UOL
Retrato de Yuri Cedro, 24, barbeiro de anos que, desde 2018, corta o cabelo e faz a barba de jogadores de futebol dos principais clubes de Minas Gerais
Imagem: Gustavo Baxter/UOL

De Contagem para o mundo

A Barbearia Cedro tem o ambiente típico dos empreendimentos do ramo: uma bancada com produtos de beleza, geladeira repleta de cervejas e uma televisão fixada na parede, sempre ligada no canal de esportes.

Na grade que divide a recepção e a barbearia, camisas autografadas do América, Cruzeiro e Atlético decoram o espaço. Em uma delas, a dedicatória que antecede a assinatura exibe um título especial: o brabo do corte, rabiscada pelo Arana.

É na loja que Yuri recebe seus demais clientes: a maioria são homens com menos de 30 anos. Os agendamentos são feitos por aplicativo e devem ser feitos com 3 ou 4 dias de antecedência. O movimento aumentou desde que começou a atender jogadores: muitos chegam pedindo para ficarem parecidos com os ídolos. Ao longo da semana de trabalho, que vai de terça a sábado, o barbeiro faz uma média de 40 cortes. Estima que, no mínimo, dez deles são inspirados em jogadores.

Platinados, risquinhos e degradês são os mais procurados: tudo depende de quem está melhor na temporada. "Quando o jogador tá mais em alta, a galera procura mais. Tem um cliente atleticano que pede o corte do jogador que está em melhor momento. Vamos fazer o do Arana, mas já fizemos do Zaracho [meio-campo] e do Vargas [atacante]."

Para o final de 2021, Yuri espera ajudar os clientes a cumprirem as promessas feitas caso o Atlético-MG levante a taça do Campeonato Brasileiro. "Tem cliente que já agendou para descolorir o cabelo se o Galo vencer."

Por ter feito amigos nos três clubes mineiros, o barbeiro diz torcer diplomaticamente para todos, mas não contesta a coincidência da trajetória do time ter esbarrado na sua. "Dei sorte pro Atlético. Comecei a cortar e eles vão ser campeões."