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'Menino da posse do Lula' quer bater o recorde de Cesar Cielo na água

Francisco Carlos do Nascimento, 10, que subiu a rampa com Lula, e seus prêmios de natação - Lucas Veloso/UOL
Francisco Carlos do Nascimento, 10, que subiu a rampa com Lula, e seus prêmios de natação
Imagem: Lucas Veloso/UOL

Lucas Veloso

Colaboração para o TAB, de São Paulo

06/01/2023 04h00

Em um sobrado de uma rua sem saída em Itaquera, na zona leste de São Paulo, mora Francisco Carlos do Nascimento, 10, o mais novo orgulho do bairro, da comunidade católica que frequenta e de eleitores petistas Brasil afora.

De óculos de aro preto, aparelho nos dentes, camisa do Corinthians — o time do coração —, shorts jeans e chinelos, ele recebe o TAB para uma conversa na sala da sua casa junto da mãe, a assistente social Telma Nascimento, 45. Nas paredes do cômodo, três quadros estão em destaque: a foto de Francisco vestido com a camisa do Corinthians quando tinha um ano; uma paisagem azul com árvores e barcos no contraluz; e a imagem de um trabalhador rural. A árvore de Natal ainda não foi desmontada.

Nesses últimos dias, os integrantes do clã Nascimento tiveram horas agitadas. Telma tem feito as vezes de assessora do filho, agendando entrevistas e organizando a rotina. "Só topamos falar hoje porque foram indicados pelo padre Paulo [pároco da igreja que frequentam]", comentou a mãe. Só naquele dia, tinham dado outras quatro entrevistas.

Apesar da correria, o sorriso no rosto e a expressividade quando fala do que gosta não somem de Francisco. Aparentemente ele curte responder perguntas e falar da vida, mas avalia quando os interlocutores não pensam como ele. A mãe comentou que, dia desses, ele soltou: "Mãe, acho que esse repórter é bolsonarista, pelo jeito que ele me olhou quando eu falei".

O anonimato de Francisco acabou em 1º de janeiro, quando ele participou da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), subindo a rampa do Palácio do Planalto e participando da passada "mão em mão" da faixa presidencial, até que ela fosse vestida por Lula.

No grupo da faixa, estavam presentes o cacique Raoni, 93, além da catadora de materiais recicláveis Aline Sousa, 33, o metalúrgico Weslley Rocha, 36, o professor Murilo Jesus, 28, a cozinheira Jucimara Santos, 45, o artesão Flávio Pereira, 50 e o influenciador digital Ivan Baron, 24, que luta contra o capacitismo.

Francisco Carlos do Nascimento, o garotinho que acompanhou Lula subindo a rampa - Lucas Veloso/UOL - Lucas Veloso/UOL
Imagem: Lucas Veloso/UOL

Presente de Natal

Telma é envolvida nos movimentos sociais e tem ligação com o PT, participando de ações públicas junto a minorias, como a população em situação de rua. Sempre dividiu com o filho quem era Lula e sua importância coletiva.

Francisco faz questão de lembrar de um arrependimento. Em 2019, o MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) organizou uma partida de futebol com aliados do movimento, como o atual presidente, o cantor Chico Buarque, artistas, políticos e juristas, tendo o jornalista Juca Kfouri como árbitro. No jogo na cidade de Guararema (SP), algumas crianças pularam as grades para abraçar Lula, mas Francisco não topou ser ajudado e fazer o mesmo. "Fiquei com vergonha e tal. Não quis ir, mas agora eu me arrependo muito, e queria ter ido", lembra.

Em dezembro último, Lula, já eleito, participou do Natal dos Catadores, no Armazém do Campo, na Barra Funda, bairro na zona oeste de São Paulo. Dias antes, sabendo que o ídolo estaria lá, Francisco decidiu escrever uma carta e levar até ele. Pedir para um segurança entregar seria o plano B, mas Francisco conseguiu dar a carta nas mãos do presidente, além de ganhar o abraço, "preso" desde 2019.

Na rápida conversa, Lula disse ao menino que queria abraçá-lo novamente em sua posse, com a faixa. Na carta escrita à mão, Francisco disse que tanto o povo quanto as crianças acreditam no presidente. Ele mesmo já tinha ido a Curitiba gritar "Bom dia, Lula", cumprimento diário dos ativistas em apoio ao petista nos 580 dias em que foi preso na sede da Polícia Federal.

Presidente Lula sobe a rampa e recebe a faixa após posse na Congresso Nacional - Reproduçaõ/Reproduçaõ - Reproduçaõ/Reproduçaõ
Presidente Lula sobe a rampa e recebe a faixa após posse na Congresso Nacional; Francisco está ao centro
Imagem: Reproduçaõ/Reproduçaõ

Dias depois do evento, a assessoria do PT procurou a família para saber se realmente iam à posse. E eles iam. Esperançosa pela vitória nas urnas, a mãe já tinha comprado as passagens de avião para ela, o marido — o advogado Francisco Carlos da Silva, 58 — e o filho antes do primeiro turno. "Diante de tudo que vivemos nestes últimos quatro anos, achei que a eleição seria mais fácil do que foi, mas não dava para continuar como estava", justifica Telma.

O convite oficial para participarem da cerimônia veio quando já estavam em Brasília. No dia da posse, foram conduzidos a uma sala do Palácio do Planalto, onde ficaram sabendo que o menino faria parte do grupo a participar da entrega da faixa. A mãe, que já estava emocionada ao ver o cacique Raoni e imaginado que ele daria a faixa, ficou ainda mais feliz quando entendeu que o filho partilharia a função coletiva.

A família participou do jantar no Palácio Itamaraty, onde o menino encarou pela primeira vez a fama repentina. "Estava morrendo de fome, mas me pediram tanta foto que eu nem comi! Até a Fátima Bernardes veio", lembra, rindo.

Francisco Carlos do Nascimento, que estava na posse de Lula - Lucas Veloso/UOL - Lucas Veloso/UOL
Imagem: Lucas Veloso/UOL

'Quero bater o Cesar Cielo'

O maior sonho de Francisco está dentro da água. De segunda a sexta-feira, o menino treina nas piscinas do clube Corinthians, onde é um dos atletas inscritos. O interesse pelo esporte veio aos 6 anos de idade, quando começou a nadar em uma escola do bairro. A professora indicou à mãe que ele fosse para um clube maior.

Outra pessoa que o menino admira é o atleta Cesar Cielo, de quem espera bater o recorde nos 50 m livre — "de 20 segundos e 91 centésimos", diz ele de cor.

Com a fama também veio seu outro apelido, "Boca de 09". Francisco foi confundido com Vinicius Oliveira Santos, o Boca de 09, garoto de Salvador que viralizou ao simular, em um vídeo, uma conversa com a covid-19. Na ligação, Vinicius dizia ao vírus que ele atrapalhava a vida das pessoas, e emendava um "Se saia!".

"Essa confusão é o que mais aparece quando eu vou procurar coisas da posse no YouTube, mas estou feliz", afirma.

Nas redes sociais, o menino também foi comparado a Deivinho, personagem principal do filme "Marte Um", e a Lucas, por causa do personagem Lucas Charles Sinclair, interpretado pelo ator Caleb McLaughlin na série "Stranger Things".

'Gosta de ladrão'

De um lado, Francisco tem recebido elogios e declarações positivas. Um deles vem do pároco da Igreja Católica que frequentam na região, Paulo Sérgio Bezerra. "Francisco levou para o presidente Lula o sonho das periferias do Brasil", escreveu o religioso em suas redes sociais.

Por sua ligação com Lula, é na escola que o garoto mais lida com as diferenças políticas. "Tem bastante bolsonarista lá, mas a gente sempre discute também, conversa. Mesmo assim, teve gente que deixou de ser amigo por conta disso", explica.

Foi na escola, aliás, que ouviu que "gostava de ladrão" por ter uma família militante petista. Deixou passar.

Na cabeça de Francisco, apesar das coisas erradas que ouve, ele não acha que é só culpa dos colegas. "Igual quando falam que criança é racista, machista e tal. A criança não nasce assim, mas é conforme a educação que ela tem em casa. Se eles são pessoas bravas e se dão uma educação errada elas vão ser racistas e machistas", afirma, com jeito de gente grande.