Papel de Janja para evitar golpe é gentileza de Lula, dizem aliados
O protagonismo atribuído a Janja na decisão de Lula de não decretar GLO (Garantia da Lei e da Ordem) durante os atos golpistas de 8 de janeiro é "uma gentileza" do presidente com a esposa, dizem aliados e integrantes do governo.
Para o advogado Wilson Ramos Filho, o Xixo, um dos fundadores do PT no Paraná, a "grande influência" de Janja sobre Lula é "lenda".
Ele é um dos entrevistados do segundo episódio de Janja, podcast original UOL Prime, disponível nesta segunda-feira (2) no YouTube do UOL Prime para assinantes e, na terça, em todas as plataformas de podcast.
"[O presidente] Teve a gentileza e a honestidade de atribuir a ela uma frase que era dela. Ele nunca disse: 'Eu queria ter a GLO, só não tive porque a Janja não deixou'."
Xixo foi um dos apoiadores de Lula enquanto o presidente esteve preso em Curitiba. Após a saída de Lula da prisão, o casal passou a primeira noite junto, no apartamento dele.
'Entregar aos militares'
Edinho Silva (PT), ex-prefeito de Araraquara (SP), afirma que Janja teve papel decisivo no 8 de janeiro. Ele estava com o presidente e a primeira-dama quando os atos se iniciaram. O casal visitava Araraquara, atingida por fortes chuvas.
Em entrevista ao podcast, Edinho Silva relatou que Janja, ao ouvir a sigla GLO, disse que isso significava "entregar o poder aos militares".
Lula, então, teria dito: "Se quiserem poder, que disputem eleições".
A mesma história foi contada pelo ex-prefeito no documentário "8/1, a Democracia Resiste", de Julia Duailibi e Rafael Norton, da GloboNews.
No documentário, Lula afirmou: "Foi a Janja quem disse, não aceita GLO, GLO é tudo o que eles querem".
Ela teria feito esse comentário após Flávio Dino, então ministro da Justiça, apresentar as opções para resolver a crise: intervenção federal, GLO, Estado de Defesa e Estado de Sítio.
No final, optou-se pela intervenção na segurança pública do Distrito Federal.
Como o papel de destaque de Janja no episódio é frequentemente mencionado por defensores da Janja para enaltecê-la, especialmente quando ela se envolve em polêmicas —como o xingamento a Elon Musk durante o G20 -, integrantes do governo evitam refutá-lo abertamente.
Em caráter reservado, dizem que Lula, com a experiência política de dois mandatos presidenciais, não cometeria o erro de decretar a GLO.
Reconhecem que Janja foi contra o decreto, mas não foi a única — Alexandre de Moraes, então ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral); Rosa Weber, então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal); o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também eram contra a GLO.
Emídio de Souza, deputado estadual (PT-SP), era a favor da GLO. Em entrevista ao podcast, Souza afirma que, durante os ataques, telefonou para Janja —Lula não tem celular— e defendeu seu ponto de vista, que foi refutado pela primeira-dama.
"Hoje vejo que ela estava absolutamente certa", disse o deputado.
Ministérios
Se a influência de Janja sobre Lula em relação à GLO é relativizada por integrantes do governo e gente próxima ao presidente, há um consenso de que ela emplacou três nomes na Esplanada dos Ministérios.
Foram três mulheres: Anielle Franco (Igualdade Racial), Margareth Menezes (Cultura) e Ana Moser (Esporte), que depois seria demitida para dar lugar a André Fufuca, do PP.
Indagada pelo UOL sobre a influência de Janja na sua indicação ao ministério, Anielle Franco disse: "Não descarto".
"Tanto ela quanto o presidente sempre tiveram muito respeito pela minha família, muito carinho pelos meus pais. E, acima de tudo, muito carinho e respeito com a história da Mari" [Marielle Franco, de quem Anielle é irmã].
Janja, porém, não conseguiu emplacar uma antiga amiga, Maria Helena Guarezi, na pasta das Mulheres. A vaga foi oferecida a Cida Gonçalves, mas Guarezi foi acomodada na secretaria-executiva do órgão.
As duas se conheceram na Usina Hidrelétrica de Itaipu, onde trabalharam juntas.
Em entrevista ao podcast, Maria Helena Guarezi disse que Janja "sabe qual é o espaço político dela no governo".
"Ela dá sugestão, diz o que pensa. Mas, ao fim e ao cabo, quem toma as decisões é o presidente Lula. Quem toma as decisões aqui [no ministério] sou eu", disse.
Janja também indicou o número dois do Ministério da Cultura, Márcio Tavares dos Santos.
Comício matrimonial
O episódio também contará a influência de Janja na campanha presidencial, na qual ela agia por conta própria, como revela Edinho Silva. Ele foi coordenador de comunicação da campanha.
"Quem tentou dizer a ela o papel que tinha que cumprir na campanha se deu muito mal", afirma Silva.
Janja, porém, disse a Lula o que ele não deveria fazer: por exemplo, repetir a frase "tenho tesão de 20", considerada machista.
"Ela transitou na campanha de forma autêntica. Agregou figuras importantes, incorporou aspectos culturais", disse Edinho Silva.
A regravação do jingle "Sem medo de ser feliz" foi uma das iniciativas de Janja. O jingle foi cantado na cerimônia de casamento entre Lula e Janja, em maio de 2022, o que rendeu ao evento o apelido de "comício matrimonial".
A lista de convidados para a cerimônia privilegiou amigos em comum do casal, como a turma que apoiou Lula em Curitiba durante o período em que ele esteve preso, e celebridades, como o humorista Paulo Vieira e o ex-BBB Gil do Vigor.
Antigos amigos de Lula, como Frei Betto, o deputado estadual Eduardo Suplicy (PT-SP) e o jornalista Ricardo Kotscho ficaram fora da lista.
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