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Titulares não concursados de 276 cartórios faturaram R$ 1,5 bi em 20 anos

Mais de 500 cartórios de Minas Gerais foram "dados" por governadores até 1997. Hoje, 276 ainda são comandados por titulares que não passaram por concurso público.

As serventias arrecadaram R$ 8,4 bilhões nos últimos 20 anos. Cerca de R$ 1,5 bilhão desse dinheiro ficou com os titulares.

Desde a Constituição de 1988, cartórios são considerados serviços públicos delegados a particulares mediante concurso público.

No entanto, 273 serventias foram dadas a não concursados depois da determinação constitucional.

Dessas outorgas, muitas foram perdidas por renúncia, morte ou outros motivos.

Documento de setembro de 2024 citado em processo do TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais) mostra que 276 cartórios continuam sob responsabilidade dos indicados pelo governador.

As outorgas foram contestadas na Justiça em Belo Horizonte, mas a ação foi julgada improcedente no fim de 2024, após mais de uma década de trâmite.

Já em Brasília, o STF (Supremo Tribunal Federal) considerou, também no fim de 2024, que a situação é inconstitucional.

Entretanto, os oficiais não perderam as delegações.

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A arrecadação de R$ 8,4 bilhões (em valores corrigidos pelo IPCA) foi identificada a partir de levantamento do UOL com dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

Não há dados para o período anterior a 2005.

Documento "Cartório em Números 2024" da Anoreg-BR (Associação dos Notários e Registradores do Brasil) mostra que os titulares de órgãos em Minas Gerais ficam atualmente com 17,5% do dinheiro arrecadado, descontadas as despesas da operação, repasses a órgãos públicos e o Imposto de Renda.

Usando esse percentual como parâmetro, o grupo de 276 privilegiados ficou com cerca de R$ 1,5 bilhão dessa arrecadação no período.

Entre os 276 estão dirigentes das principais associações de classe do setor.

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No topo da remuneração está Walquíria Rabelo, que preside o Sinoreg-MG (Sindicato dos Notários e Registradores de Minas Gerais) e comanda o 9º Tabelionato de Notas.

Seu cartório arrecadou R$ 446 milhões desde 2005 (em valores corrigidos pela inflação) —cerca de R$ 78 milhões líquidos para a titular.

Darlene Triginelli, ex-presidente do Sinoreg-MG (2009-2013), tem o segundo cartório com maior remuneração do grupo.

O 3º Ofício de Notas de Belo Horizonte arrecadou R$ 363 milhões em valores corrigidos, ficando cerca de R$ 63 milhões para a titular.

Marco Paulo Guimarães Amaral, da diretoria do Sinoreg, comanda um cartório em Nova Serrana que arrecadou R$ 208 milhões nas últimas duas décadas.

Estima-se que R$ 36 milhões desse dinheiro ficaram com o titular no período.

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Amaral também foi indicado, neste mês, para assumir interinamente outro cartório da cidade.

No top 10 de faturamento individual ainda está o deputado Roberto Andrade, presidente da Associação dos Notários e Registradores do Estado de Minas Gerais entre 2007 e 2018, onde hoje é conselheiro.

Andrade é titular de um registro de imóveis em Viçosa. Seu cartório arrecadou R$ 161 milhões em 20 anos. Estima-se que R$ 28 milhões ficaram com o titular.

Procurados para comentar o assunto, Rabelo, Amaral e Andrade não responderam à reportagem.

Triginelli respondeu por email.

"Importante salientar que assumi a serventia antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, período em que não havia exigência legal de concurso público para a outorga. Minha nomeação ocorreu em estrita conformidade com a legislação vigente e com os procedimentos administrativos regulares da época", escreveu.

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