Líder do Centrão fez lobby por empresa condenada por lesar aposentados

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O deputado federal Ricardo Barros (PP-PR) fez lobby junto ao Banco Central (BC) e a três bancos comerciais em nome da financeira Sudacred. A empresa é alvo de milhares de ações contra cobranças indevidas de seguros nas contas de aposentados do INSS, via débito automático.
Conforme o UOL apurou, Barros --que foi ministro da Saúde de Michel Temer e líder do governo de Jair Bolsonaro na Câmara-- tentou evitar que os bancos interrompessem os débitos automáticos da Sudacred, após reclamações de clientes.
A Sudacred pertence a Luciano Fracaro, empresário que ostenta uma vida de luxo, com carros de alto padrão, jato particular e um iate (leia mais aqui).
Em 2023, Fracaro foi condenado a três anos de prisão por integrar uma organização criminosa que fez descontos indevidos de idosos no DF. A pena foi convertida em medidas alternativas. O empresário recorreu e aguarda julgamento.
Em 2024, a Sudacred e outras empresas do mesmo grupo foram condenadas a pagar R$ 1,5 milhão por débitos automáticos indevidos de aposentados em SP.
Empresas ligadas ao empresário também foram processadas mais de 15 mil vezes nos últimos quatro anos, principalmente por aposentados que negam ter contratado os seguros.
Veja o que disseram Barros, Sudacred e Fracaro.
Reuniões de Barros em defesa da Sudacred
Barros atuou em defesa da Sudacred em pelo menos quatro reuniões presenciais com representantes do BC, de 2023 a fevereiro de 2025.
Em 2023, Roberto Campos Neto, então presidente do BC, esteve em uma dessas reuniões, com a presença de Barros e Fracaro. Campos Neto também participou de outra reunião, apenas com representantes da Sudacred.
Barros também defendeu interesses da Sudacred junto ao Banco do Brasil, em 2022, e à Caixa, em 2025.
Em pelo menos duas ocasiões, o deputado primeiro solicitou que diretores dos bancos atendessem representantes da Sudacred.
Depois, uma vez que as reuniões com a Sudacred não tiveram o resultado esperado pela empresa, Barros foi aos bancos falar diretamente com os presidentes das instituições.
Em 2022, tratou com Fausto Ribeiro, então presidente do Banco do Brasil, indicado ao cargo por Bolsonaro. Em 2025, se reuniu com Carlos Vieira Fernandes, presidente da Caixa, indicado pelo PP de Barros.
O deputado também fez contato com a diretoria de um dos cinco maiores bancos privados do país, em agosto deste ano, levando o mesmo pleito. A instituição financeira decidiu parar de fazer débitos automáticos para a Sudacred.
Em todo o período em que atuou em nome da Sudacred, Barros ocupou cargos políticos.
Em 2022, era deputado federal —posição que reassumiu em 2025. No meio tempo, de 2023 a 2024, foi secretário da Indústria, Comércio e Serviços do Paraná, no governo de Ratinho Júnior (PSD).
Em 2022, Fracaro doou R$ 300 mil para a campanha de Ratinho Júnior. Foi a maior doação realizada para a campanha por pessoa física, sem cargo eletivo.
O que dizem Barros, Sudacred e bancos
Barros disse ao UOL que defendeu os interesses da Sudacred "porque é uma empresa paranaense que buscou o apoio para assegurar sua capacidade de concorrência no setor que atua".
O deputado afirmou que não foi remunerado pela Sudacred e que não sabia das condenações contra a empresa e Fracaro.
A Sudacred afirma que "sua atuação é 100% regular, sempre em conformidade com a legislação vigente".
Acrescentou que "busca diálogo com representantes do legislativo para tratar de suas demandas e os direitos de seus clientes". "Trata-se de uma prática legítima e comum no sistema democrático".
A empresa disse ainda que alguns bancos "passaram a impedir novas inclusões [de débitos automáticos da Sudacred]" e que "esse tipo de restrição infringe as normas do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional e os princípios constitucionais de liberdade de comércio e de escolha do consumidor".
O Banco Central afirmou que "realiza reuniões com representantes de diferentes segmentos da sociedade".
Acrescentou que "tais encontros frequentemente abordam temas técnicos, como supervisão, ou questões protegidas por sigilo empresarial, razão pela qual os conteúdos específicos não são detalhados nas agendas públicas".
Caixa e Banco do Brasil se recusaram a fornecer as atas das reuniões.
A Caixa afirmou que, nas agendas entre Barros e o presidente do banco, "foram tratados temas gerais sobre o estado do Paraná, cenário econômico e político nacional".
O Banco do Brasil se negou a divulgar até datas de agendas com Barros —obrigação prevista na legislação de transparência. Disse "não divulgar reuniões realizadas com intuito negocial".
Campos Neto e Fausto Ribeiro, que deixaram os cargos de presidente do Banco Central e presidente do Banco do Brasil, respectivamente, não se pronunciaram.
Sudacred se beneficiou de mudança feita pelo BC
Como o UOL mostrou em agosto, o Banco Central modificou as regras do débito automático a partir de 2021.
Desde então, os bancos não precisavam mais de autorização dos clientes para fazerem débitos automáticos em nome de outras empresas financeiras.
A reportagem descobriu que, após a mudança, alguns clubes de benefício e seguradoras passaram a usar pequenas empresas financeiras, como sociedades de crédito (do tipo SCD e SCMEPP), para solicitarem débitos automáticos aos bancos.
Dessa forma, os bancos não confirmavam se o cliente autorizou o desconto.
É o caso do grupo Suda, de Curitiba. Formado inicialmente por uma corretora de seguros e um clube de benefícios, iniciou expansão em 2018, criando sua própria seguradora, a Sudaseg.
Em 2021, logo após as novas regras do Banco Central entrarem em vigor, o grupo Suda se expandiu novamente, com a compra de uma pequena financeira do interior de São Paulo.
Rebatizada como Sudacred, a financeira passou a intermediar cobranças em débito automático das demais empresas do grupo, principalmente a seguradora Sudaseg.
Dessa forma, os bancos apenas acatavam o pedido de débito automático da Sudacred, sem pedir autorização dos clientes.
Mas, em 25 de setembro, o Banco Central mudou as regras do débito automático mais uma vez, determinando que os bancos peçam autorização de clientes para cobranças como as feitas pela Sudacred, em nome de terceiros.
Baixo pagamento de sinistros
Os dados da seguradora Sudaseg chamam atenção.
A cada R$ 100 recebidos em pagamento de apólices no ano passado, a Sudaseg pagou menos de R$ 3 em sinistros. A média do mercado é de R$ 42.
Já se considerados apenas os seguros pessoais, principal modalidade vendida pela Sudaseg, o mercado paga R$ 30 em sinistros, em média, a cada R$ 100 em apólices.
Isso mostra que as pessoas estão pagando, mas não estão utilizando os seguros. É um indício de cobranças indevidas.

Além disso, a seguradora teve um crescimento de mais de 700% entre 2021 e 2024, muito acima da média do mercado (67%).
A Sudaseg disse que seu crescimento "decorre do processo de gestão eficiente, com práticas internas sólidas e pautadas em processos técnicos".
Sobre a baixa sinistralidade, afirmou que tem "uma carteira diversificada de clientes de 18 a 85 anos", o que "gera equilíbrio e sustentabilidade à empresa".
A Susep afirmou que "não pode antecipar informações sobre planos ou ações de supervisão em curso".
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