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O que esperar de eleitor 'cidadão de bem', como suspeito de ataque em MG
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No dia 15 de junho, durante um ato que reuniria o ex-presidente Lula e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil em Uberlândia (MG), um drone sobrevoou o local do evento e lançou sobre os participantes um material com cheiro e aparência de fezes e urina.
Policiais militares que faziam a segurança do evento interceptaram uma caminhonete, por onde o objeto era operado, e prenderam três pessoas em flagrante. O veículo levava na traseira um adesivo em homenagem a Jair Bolsonaro.
Embora não tivessem licença para operar o drone, os detidos foram liberados após a assinatura de um termo circunstanciado e seguiram a vida.
O caso, tratado como uma ação de alguns doidões dispostos a bagunçar o coreto das eleições, foi relegado aos rodapés do noticiário.
No mesmo dia, a quilômetros dali, um suspeito confessou sua participação no assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips. Eles foram mortos com armas de caça no Vale do Javari (AM).
A sujeira arremessada por um drone contra apoiadores de um ex-presidente fechava as notas de mais um dia normal em um país que aprendeu a mediar seus conflitos na bala.
Como diriam os gênios da liberdade de agressão, o país está há tempos muito polarizado e cada um tem seu direito de expressar sua insatisfação e preferência política. Até se essa expressão tiver o aroma e a consistência de um excremento.
O líquido, na verdade, era um veneno para matar moscas utilizado geralmente em estábulos da área rural. Ao menos ali ninguém morreu.
Três semanas depois, agentes do Ministério Público Federal bateram às portas do agropecuarista Rodrigo Luiz Parreira, apontado como um dos autores da molecagem com o drone em Uberlândia.
Descobriram na ação que o sujeito de 38 anos não era assim tão moleque. Ele tinha uma lista de condenações na Justiça por estelionato e roubo. Foi detido, dessa vez, por falsificar documentos a fim de conseguir seu certificado de colecionador, atirador esportivo e caçador. Um dos armamentos obtidos com a falsa licença seria um rifle, estranhamente registrado como "fuzil", de calibre 22.
Não se sabe de que maneira o armamento ajudava o agropecuarista a elaborar sua revolta com o mundo. O que se sabe, a partir do boletim de ocorrência registrado após o ataque com o drone, é que Parreira andava inconformado com a gestão de um ex-prefeito petista, Gilmar Machado, em sua cidade. Por isso contratou duas pessoas para que o ajudassem a espantar como moscas os ativistas e as personalidades políticas que nunca engoliu.
Após a prisão, seu advogado correu para sugerir uma suposta perseguição por questões ideológicas do cliente.
Ele também garantiu que o sobrevoo criminoso do drone não tinha motivação política. Ah, tá.
Parreira, ao que tudo indica, é um dos muitos eleitores que se autodenominam "cidadãos de bem" e se utilizam do título para fazer o que entendem por justiça com as próprias mãos — para limpar o país, vale tudo, inclusive agir à margem da lei. Fica para a imaginação do leitor a seriedade de quem quer limpar qualquer coisa que seja sujando quem ousa discordar de sua ordem.
O ataque a drone não tem nada de pitoresco. Serve para justificar a preocupação dos assessores da campanha com a segurança de seus pré-candidatos em um ano eleitoral.
Armado até os dentes e tomado de ódio, esse "cidadão de bem" não anda só e não deveria ser normalizado. Parreira é a parte mais visível de uma multidão.
Em março de 2018, quando Lula ainda não havia sido preso e impedido de concorrer, um ônibus da caravana de sua pré-campanha foi atacado a tiros em uma estrada do Paraná. A polícia concluiu que a ação foi premeditada. Os tiros partiram da fazenda pertencente a um homem que dizia ter ódio do MST e era investigado por ameaças de homicídio contra lideranças políticas locais. Ninguém foi responsabilizado desde então.
A impunidade é um lembrete e um convite a outros atentados.
Naquela ocasião, Bolsonaro correu para acusar a própria campanha do PT de promover os disparos para se vitimizar. Em setembro, ele mesmo foi alvo de um atentado a facas cometido por um sujeito perturbado e alimentado por ódio político.
Tirar esse ódio do palanque e desarmar o espírito de seus apoiadores é, ou deveria ser, um dos primeiros compromissos de qualquer candidato ou partido político antes do início oficial da campanha.
Enquanto isso não acontecer, fazer política no Brasil será sempre um risco de vida. O alvo do tiroteio somos todos nós.
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