Apps influenciam arquitetura comercial e experiência em lojas físicas
Estamos acostumados a resolver a vida com poucos cliques. A transferência de dinheiro, o pedido de comida, as compras do mercado, chamar um carro para te levar a um lugar, adquirir uma nova roupa. Tudo é feito diretamente nas telinhas que cabem dentro dos nossos bolsos, sem precisar sair de casa.
Aos poucos, a facilidade e instantaneidade dos apps nossos de cada dia alteram as expectativas que temos sobre como organizamos nossas casas, como funcionam os ambientes de trabalho e até a arquitetura dos espaços que frequentamos, como aeroportos e centros comerciais.
Para Guilherme Wisnik, arquiteto e professor da USP (Universidade de São Paulo), todo tipo de mudança tecnológica impacta na vivência dos espaços urbanos. "É uma dinâmica muito presente no mundo contemporâneo, onde mais do que construir o espaço público, se pensa em usá-lo, se apropriar dele de uma forma mais efêmera", explica.
"As inovações vão mexer com as estruturas e levar a repensar o espaço urbano", concorda Stella Hiroki, consultora de mobilidade e especialista em cidades inteligentes. "Prédios e locais públicos precisarão se organizar para melhor receber esses novos serviços que facilitam o fluxo no espaço urbano."
Pequenas caixinhas, grandes negócios
Além dos pontos de parada específicos para carros de aplicativos, outras modificações chegam a escritórios e áreas de grande circulação de pessoas: caixinhas para retirada de encomendas. O conceito não é tão diferente da caixa postal dos Correios, disponível há mais de dois séculos (desde 1801!), mas agora vem com tecnologia embarcada.
Quem já apostou nas caixinhas high tech foi a Amazon, que instalou armários com portinhas em locais de grande circulação nos EUA. Chamados de Amazon Lockers, eles já estão disponíveis em mais de 900 cidades para facilitar a retirada de encomendas: através de um monitor central, o comprador informa uma senha e automaticamente uma das portinhas se abre.
O iFood se inspirou na proposta para criar armários semelhantes e um toque de isolamento térmico. Batizadas de iFood Box, as caixinhas estão sendo instaladas em parceria com prédios corporativos, que costumam concentrar um "engarrafamento" de entregadores em suas recepções. "O cliente também ganha um tempo para ir buscar seu pedido - se estiver em uma reunião pode esperá-la acabar para buscar o pacote", explica Fernando Martins, gerente de inovação logística da iFood.
Um dos prédios que já conta com um iFood Box é o Cubo Itaú, na capital paulista. Com um fluxo diário de mais de 3.000 pessoas na sua recepção, a novidade também trouxe eficiência para os funcionários do edifício. "A recepção agora não precisa mais se dividir entre os visitantes e os entregadores, porque o app já faz esse serviço", relata Danilo Picucci, gerente de comunidades do Cubo, satisfeito com a maior eficiência.
O revival dos armários de entrega também trouxe fôlego para a própria caixa postal dos Correios, que no ano passado lançou uma versão mais tecnológica. Focada no atendimento de condomínios residenciais que não contam com portaria, ela tem um monitor central pelo qual o morador se identifica e destranca as portas que contêm suas encomendas.
Novas expectativas para as lojas físicas
Diante do aumento da expectativa dos consumidores, as vitrines das lojas físicas precisam ter um propósito maior do que só exibir os itens disponíveis. A Nike, por exemplo, tem uma loja-conceito em Nova York onde oferece imersões com produtos da marca. Lá você pode correr em uma quadra conectada que reconhece o movimento dos pés e indica o melhor tênis para seu tipo de pisada, por exemplo.
A marca de luxo Tiffany's decidiu que as pessoas não precisavam ir até as lojas só para conferir as joias de valores astronômicos e montou uma cafeteria dentro de uma das suas unidades, também em Nova York, em uma referência ao filme "Bonequinha de Luxo" (o título em tradução direta seria "Café da manhã na Tiffany's"). A oportunidade de um café da manhã mais luxuoso do que o degustado por Audrey Hepburn, com muita decoração em tons de azul bebê, causa filas e muitas postagens no Instagram.
Até marcas originárias do mundo digital também estão investindo em lojas físicas, como a própria Amazon, que desde 2015 passou a abrir suas livrarias físicas, as Amazon Books. Em vez de uma seção de mais lidos, há uma com os livros que os leitores de Kindle terminaram em menos de três dias. Outra tenta imitar no mundo físico a proposta dos algoritmos de recomendação: "Se você leu tal livro, talvez possa gostar destes", diz a indicação na prateleira.
E não é preciso ser um titã do digital para ver oportunidades nas lojas físicas. A marca de e-commerce de vestuário masculino Bonobos também passou a apostar em lojas físicas, em um conceito conhecido como guideshops. Nessas unidades, os compradores podem experimentar todo o catálogo disponível online, contando com a assessoria não de vendedores, mas de consultores de moda. Com uma ajudinha para encontrar o melhor caimento e combinação das peças, podem fechar a compra online para receber o pedido em casa.
O mesmo conceito de "comprar roupas sem sair com sacolas nas mãos" já é possível no Brasil nas lojas da Amaro, que inaugurou seu primeiro guideshop em 2015 e hoje conta com 13 unidades entre São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Belo Horizonte. "Estamos vivendo um novo momento para o varejo, repensando como ele funciona. Integramos o benefício do contato offline [com o cliente] e a facilidade da compra online", defende Dominique Oliver, CEO da Amaro.
Seja para pedir um carro, encomendar o almoço ou fazer suas compras, as facilidades do digital vão alterar as nossas expectativas e desejos para a vida ao vivo e a cores. "Hoje a tecnologia permeia todos os espaços como uma característica fundamental e onipresente, mas o culto pelo objeto tecnológico deve acabar", prevê Jaakko Tammela, diretor da consultoria Accenture, que apontou a modificação dos espaços arquitetônicos como um destaque no seu Fjord Trends Report 2019. "A tendência é que a tecnologia esteja presente, mas se torne invisível e discreta, ao invés de intrusiva. Essa mudança de mentalidade vai redefinir a função dos objetos e das coisas que nos cercam nos ambientes urbanos, seja na esfera do convívio público ou privado", prevê.
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