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Rival do Tik Tok, Likee atrai jovens ligados em redes sociais e monetização

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Imagem: Reprodução

Daniela Paiva

Colaboração para o TAB, de Londres

20/08/2020 04h01

Em julho, o Likee, aplicativo criado em Singapura e pertencente à chinesa Joyy, completou três anos de existência. No "antigo normal", a empresa provavelmente estaria se saindo, digamos, OK na briga por uma fatia do mercado global. Os 150 milhões de usuários registrados no primeiro trimestre de 2020 seriam motivo suficiente para comemorar a caminhada na guerra contra a gigante do mercado, TikTok, com 2 bilhões de downloads.

Mas a banda não anda mais tocando no ritmo a que estávamos acostumados. Tomados de supetão pela Covid-19, seguimos cheio de incertezas sobre se voltaremos a perambular, abraçar e beijar livre e presencialmente. E, se já estávamos hiper conectados antes da pandemia em nossas redes sócio-virtuais, agora precisamos — e, ao que parece, ainda por um bom tempo — interagir mais pela tela do celular ou do computador.

Em termos de experiência, o Likee é uma mistura de Tik Tok com a ferramenta de live do Instagram (transmissão ao vivo) e salas de chat do Zoom. Tem crescido nos últimos meses, embora em ritmo menor. Nos EUA, seu crescimento acelerou, nos últimos meses.

Ao abrir uma conta e criar um perfil, ganha-se acesso a criação e postagem de vídeos, fotos e mensagens, além de espaço para chats privados e de livestreaming. O pacote é completo e tem ares de gamificação, com uma wallet (carteira) prontinha para guardar diamonds (diamantes) e beans (feijões). Essas "moedas" podem ser trocadas por dinheiro mesmo (210 feijões a 1 dólar americano) ou por outros elementos do jogo. Trabalha-se com recompensas.

O que acontece nas lives? Qualquer coisa. Tutorial de maquiagem, gente falando sem parar, selecionando música, comendo, dançando, trabalhando ou simplesmente à toa. A audiência interage enviando presentes, que podem ser rosas, coroas, diamantes, cupidos etc. Quem acumula mais presentes, feijões, estrelas etc, avança no jogo, eleva no ranking de streamings mais badalados da hora, e sobe de nível.

Campanha e recrutamento

O processo de seleção para quem quer fazer parte de um time de influenciadores, os chamados Broadcasters, inclui um formulário e um teste de vídeo. Depois de receber o sinal verde, recebe-se o contrato e um breve manual de instruções com informações limitadíssimas. "É preciso experimentar", dizia o tal guia, a certa altura.

As batalhas, por exemplo, ainda são um mistério. Como usuária, perdi quase todas. Elas acontecem com dois competidores na disputa em uma tela dividida, num bate papo — podem ser pré-agendadas ou ocorrerem espontaneamente. A audiência atua diretamente no resultado final enviando presentes para o favorito. Sagra-se vencedor aquele que coletar mais presentes.

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Vamos de tecnologia?

Divulgadas pela assessoria de imprensa, as informações oficiais dão conta de que o Likee faz parte da BIGO Technology Pte. Ltd., empresa de tecnologia que usa inteligência artificial e tem sob seu guarda-chuva, além do Likee, Bigo Live (de transmissão em tempo real) e imo (aos moldes do WhatsApp).

"O Likee está comprometido em ser uma plataforma para que os usuários possam explorar seu potencial e expressar suas paixões, o que está alinhado ao slogan 'deixe-se brilhar'", afirma a empresa por e-mail.

Ainda segundo a empresa, o time de pesquisa e desenvolvimento trabalha com foco em machine learning, o que potencializa e transforma os meios de criação de conteúdo interativo. Estão incluídas outras tecnologias, como computer vision (CV, visão de computador) para compreensão de imagem e vídeo e implementação local de realidade aumentada.

Um dos resultados que saltam na experiência do usuário é o cardápio amplo, variado e em constante transformação dos efeitos, como substituição de rosto, mudança no fundo de foto e de detalhes como cor de cabelo e pele, modificados em tempo real.

Cerca de 80 pessoas compõem o grupo de criadores de conteúdo do Likee na Inglaterra. Tonio O'Connor tem 26 anos e está há um ano no país. Ele diz que paga as contas com um trabalho regular, nas palavras dele, "super chato", no mercado financeiro. Sonha mesmo se tornar influenciador digital em tempo integral.

Tonio coleciona 2.500 seguidores no Instagram e mais 2.000 em dois canais no YouTube. Para ele, a parceria oficial paga é uma oportunidade. "Estou muito feliz. É a minha primeira", comemora. Ele confessa ser um "social media junkie", algo como um viciado em redes sociais.

Sobre sua experiência no Likee, faz um estilo vlogger, conversando diretamente com os usuários sobre diversos temas. O que o irrita mais no app são os robôs, que interferem na fluidez do chat. Também relata situações inesperadas. Certa vez, recebeu investidas um tanto diretas da audiência, inclusive com propostas de casamento.

Dentre os aspectos mais positivos, destaca o Match, combinação aleatória, em que o próprio sistema exerce o papel de conexão entre estranhos. "Adoro usar porque as pessoas são muito engraçadas. Muitas vezes, não falam inglês e mostram apenas as paredes."

Niladri Singh, 21 anos, mora em Cardiff, no interior do país, e tem origem indiana. Ela cursa jornalismo e enfrentava dificuldade para encontrar um estágio remunerado durante a pandemia. O trabalho temporário para o Likee aliviou a pressão. "O que me atraiu nesse trabalho foi a perspectiva de adquirir experiência e exposição e ser remunerada", diz.

Sobre a experiência no Likee, ela diz que está gostando. Assim como Vitale, reclama dos robôs. "Eles parecem demais com humanos. É chato!" Também revela comentários desagradáveis durante as lives. "O mais estranho foi de uma pessoa me pedindo para mostrar os pés", diz.

Também vivi situações esquisitas, principalmente no primeiro mês, de homens perguntando sobre meu status, pedidos de casamento. Depois de alguns bloqueios e passa-fora, o número reduziu. A chamada para entrar ao vivo na transmissão, que acontece frequentemente, é um pouco desconfortável. Nunca se sabe quem pode estar do outro lado.

Como se trata de tecnologia com potencial agressivo de massificação, a política acaba inserida no jogo. Em junho, a Índia baniu o Likee, junto com outras 58 empresas de origem chinesa. Nos últimos dias, o presidente Donald Trump assinou decreto que obriga a ByteDance, dona do Tik Tok, a vender suas atividades nos EUA. Tensões com a China estão na raiz da questão.