'A vida tá ótima': um dia com Igão e Mítico nos estúdios do podcast Podpah
Ouvir pessoas contando histórias pode parecer banal, mas foi assim que dois jovens construíram, em pouco mais de um ano, um império de influência. Realizando entrevistas com nomes graúdos do pop ou figuras menos consagradas, Igor Cavalari (o Igão) e Thiago Marques (o Mítico) não têm vergonha de dizer que hoje vivem um sonho.
Numa sala do 12º andar de um imponente prédio na Zona Oeste da cidade de São Paulo, Igão metralha palavras enquanto almoça um prato leve com pedaços de cenoura e alguns grãos. A dieta, brinca o jovem de 25 anos, é regrada porque ele "ainda quer viver muito". Do sofá, Mítico, 31, tira o olho do celular por alguns instantes para dar uma risada de provocação. Minutos depois, a campainha toca para anunciar que seu prato também chegou.
O ar-condicionado deixa o clima na sala congelante — diferente da hospitalidade dos jovens, um dos trunfos do Podpah. Com quase 5 milhões de seguidores e mais de 454 milhões de visualizações no YouTube, o projeto angariou fãs e, no último ano, se tornou um dos canais de comunicação mais influentes do país.
Quem vê os carrões na garagem, o apartamento na cobertura, os tênis coloridos e um boné da Gucci que, segundo Igão, custou 2.500 reais, pode esquecer a origem humilde dos dois. Igão se orgulha de já ter vencido a premiação de funcionário do mês sete vezes no McDonalds, e Mítico estudou pedagogia — mas tem até clipe produzido pela KondZilla em 2017, antes do Podpah.
Podpah x Flow
A dupla atribui o sucesso meteórico do Podpah à longa carreira prévia ao podcast. "Não partimos do zero, cada um já veio com a sua base", explica Igão, que em seu canal tinha o programa de entrevistas "De Frente Com o de Costas" — em que Mítico foi um dos entrevistados, num prenúncio do que estava por vir. O convite para a criação do Podpah partiu do Mítico e demorou menos de dois dias para ser aceito.
O combinado foi que o Igão financiaria tudo nos primeiros meses, pois Mítico estava sem dinheiro. Mas nada disso foi necessário: a dupla recebeu um convite para utilizar os estúdios do agora controverso Flow Podcast, fundado por Bruno Monteiro Aiub (Monark) e Igor Coelho (Igor 3K).
Foram três meses e 34 episódios gravados no local, até que eles recebessem uma proposta para vender uma porcentagem do podcast. Após negociação, Igão e Mítico optaram por se tornar independentes. A saída foi carregada de polêmicas e troca de farpas. O domínio www.podpah.com foi adquirido pelo Flow -- e vincula um vídeo onde os apresentadores do Podpah lançam críticas aos antigos colegas.
O rompimento com o Flow foi o estopim para o início de uma nova fase. Todo o dinheiro arrecadado durante o período -- cerca de 200 mil reais --, foi investido em equipamentos e estrutura do atual estúdio. Atualmente, apenas três pessoas além de Igor e Mítico trabalham no Podpah forma integral, mas a equipe completa é composta por 10 funcionários.
Escalada do sucesso
Decorado com as assinaturas e fotografias instantâneas de boa parte dos mais de 300 convidados do programa, o estúdio do Podpah tem dois banheiros, duas geladeiras — uma delas, recheada de cerveja —, pôsteres de grandes personalidades, computadores e uma estante preenchida por garrafas de vodca, action figures e diversos objetos de colecionador.
Os jovens não escondem o orgulho de terem construído algo tão grandioso. "Lembro de quando virei para minha mãe e falei 'agora vou pagar um convênio médico para toda a família'", relembra Igão. "É uma sensação muito gostosa quando o jogo vira, quando a gente pode dizer dar conforto e segurança para os nossos pais. Dizer: 'relaxa!'", complementa Mítico.
Apoiados por grandes marcas, entre elas bancos e empresas de tecnologia, o Podpah rapidamente se consolidou como um negócio rentável. No final de 2021, por exemplo, o Habbib's lançou uma linha de copos inspirada no podcast e, pouco depois, Igão e Mítico fecharam uma parceria exclusiva com o Spotify para inaugurar a função de videocast da plataforma na América Latina.
Mas não é só sucesso financeiro que faz os olhos da dupla brilharem. "O Emicida já veio aqui, o Gabigol, o Lula? Ontem, a gente descobriu que a Deborah Secco e o Vinícius Júnior estavam nos assistindo. Pensamos 'caralho, muito foda!'", comemora Igão.
Todos os convidados, aliás, são aprovados pelos dois. No começo, os convites eram feitos por WhatsApp ou Instagram, já que os primeiros entrevistados eram amigos pessoais da dupla. Hoje, muitas figuras públicas pedem para ir ao programa. "Quando a gente não quer, desconversa e fala que não rola no momento. Quando são pessoas muito controversas, eu simplesmente não respondo. Mas isso é raro. No geral, gente assim nem costuma se enxergar no programa", relata Igão.
A dupla acredita que chamar pessoas só para criar um embate ou provocar um confronto não faz parte do espírito do Podpah. "Isto é lá no Cabrini, no Datena, nos debates eleitorais", brinca Igão. "Claro que eu vou falar se eu discordo de uma opinião do convidado, é tranquilo. Mas trazer alguém que só fala groselha e que todos os ideais são contra os nossos, nunca vamos chamar. Mesmo que dê muitas views", adiciona.
Grandes momentos da podosfera
O Podpah não esconde que o propósito de ser um espaço de diálogo positivo, mais focado em provocar risadas do que tretas. Criado oficialmente em 28 de setembro de 2020, surpreende que mais de 300 pessoas já tenham sentado na mesa para bater um papo com os comunicadores.
Ao apontar o melhor episódio do programa, Igão lembra da entrevista com o apresentador e ex-jogador Neto. "Foi um mix de sensações. Me diverti e me emocionei", celebra o corintiano. Já Mítico cita os episódios com os rappers Ice Blue, Dexter e Sidoka.
Apesar de tanto prestígio, os apresentadores ainda aguardam seus convidados dos sonhos. Para Mítico, uma realização seria levar os ídolos Mano Brown e Marcos Mion ao Podpah. "O Mion é uma inspiração em tudo o que eu faço e tudo que fiz", afirma, categórico. "Os dois já até toparam gravar com a gente, mas não são pessoas com agendas fáceis, né? E claro que a gente quer usar esses coringas no momento certo", complementa Mítico.
Um dos maiores momentos de evidência do podcast no ano, entretanto, não foi um caso assim tão planejado. "O Lula é o político mais famoso do país e, depois de uma conversa interna, concluímos que seria legal tê-lo no programa. Mandei mensagem, mas nunca me responderam. Depois de um tempo, descobrimos que a prima de um produtor do programa namorava o filho dele. Foi ela que fez essa ponte. Umas três semanas depois, nos ligaram", narra Igão.
Publicado em dezembro do ano passado, o episódio já chegou a mais de 8,7 milhões de visualizações no canal do YouTube. Na semana de publicação, o ex-presidente teve um aumento de 102% nas interações no Facebook, 200% no Instagram e 845% no Twitter, segundo levantamento da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da FGV. Além do impacto nas redes sociais, o episódio simbolizou um momento de inflexão para a adoção do formato como peça-chave na próxima campanha eleitoral.
Apesar do impacto, a conversa com Lula é apenas a 6ª mais assistida do canal até o momento — atrás de Mc Kevin, Sidoka, Júlio Cocielo, Deolane Bezerra e Delegado da Cunha.
'A vida tá ótima'
Alcançando tanta gente, a dupla entende a responsabilidade que a influência traz consigo. Mítico conta que parou de beber durante as gravações dos episódios pelo cuidado com os ouvintes. "É para não gritar no microfone, nem fazer muita zona, mas vai além disso. Nas redes sociais, eu gostava de publicar fotos bebendo e aí um monte de gente repostava. Não quero que as pessoas achem que beber é sempre legal", explica.
Sobre eventuais haters, é categórico. "Não tenho medo de ser cancelado, tenho a consciência suave e a certeza de quem eu sou. Às vezes, tenho medo de ser mal interpretado, mas se isso acontecer, vou tentar me explicar. Se a galera comprar meu lado, comprou. Se não comprar, eu lido com isso."
Passando por tantos (e tão intensos) momentos juntos, a dupla afirma que as diferenças entre eles nunca se tornaram um problema. "A gente sabe se respeitar, sabe o limite de cada um", assegura Igão. Mítico corrobora e brinca: "Eu nunca briguei com ninguém quando as coisas estavam ruins, por que agora que a vida tá ótima vou querer brigar?"
Na visão sobre fama e sucesso, a dupla concorda que o período de fenômeno midiático é passageiro. "Não vamos acabar, mas esse lance de ser a novidade, a bola da vez, vai passar", admite Igão. "Neste momento, tem um moleque ou uma mina, em casa, pensando: 'se eu acertar isso daqui, eu sou o próximo'. Eu pensava isso antes e acertei", complementa. O importante, segundo Mítico, é não deixar subir à cabeça. "Estou há 10 anos na internet, já tive altos e baixos. Sei que tudo passa".
Com o propósito de se manter relevante, a equipe já pensa em expandir o Podpah para outros formatos, além do podcast. "A gente pensa em, por exemplo, fazer eventos, ser um grande leque. Mas são pensamentos embrionários ainda", diz Mítico. Enquanto isso não acontece, os dois jovens seguem abrindo espaço para ouvir pessoas contando histórias notáveis enquanto eles próprios fazem história.
"Se você for você mesmo, vai ter gente que vai se identificar contigo", orienta Igão, para quem, assim como eles, quer inspirar multidões.
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