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'Faca na caveira, aleluia': quem é André Valadão, novo líder da Lagoinha

O pastor André Valadão, novo presidente da Lagoinha Global, durante culto na igreja em Orlando (EUA) - Reprodução/Facebook
O pastor André Valadão, novo presidente da Lagoinha Global, durante culto na igreja em Orlando (EUA)
Imagem: Reprodução/Facebook

Do TAB, em Orlando (EUA)

24/03/2023 04h01

Na noite de 20 de novembro, às vésperas do Dia de Ação de Graças, André Valadão, 44, subiu mais uma vez no palco da Igreja Batista da Lagoinha em Orlando, na Flórida (EUA), como um pop star. Era dia de gravação de novas canções da banda Lagoinha Music.

André pediu para os fiéis "pelo amor de Deus" esquecerem os smartphones durante o show e, antes dos primeiros acordes, orquestrou a gravação de brados de louvor, salves e salvas — pedia palmas, o público aplaudia efusivamente; pedia adoração, o público gritava "glória" e dizia "amém".

Único filho homem do pastor Márcio Valadão, 75, André herdou do pai a presidência da Lagoinha Global, a convenção que reúne as cerca de 700 Lagoinhas espalhadas pelo mundo.

A igreja, que nasceu no bairro belo-horizontino da Lagoinha, continua se expandindo: no culto de 26 de fevereiro, ele anunciou a abertura de novas unidades em Port Saint Lucie, na Flórida, em Nova York e em Atlanta. "Já vamos chegar chutando a porta, pá, faca na caveira, aleluia", declarou.

André é um homem não muito alto, nem especialmente atlético. É carismático e bem-humorado, com um sotaque mineiro e um tipo de humor que arranca gargalhadas nos cultos — e que às vezes viraliza na internet.

Entre show e stand-up, o culto de Orlando mobiliza milhares; já André, como influencer, mobiliza milhões. No Instagram, responde a perguntas dos fiéis que passam por "pastor, é pecado ver filme pornô?" (spoiler: sim), "é pecado ouvir Iron Maiden?" (sim, "você não vê anjo" no disco, diz) e "crente casado pode ir no motel?" (não, "é trem feio, [é] para quem tá traindo"). Uma igreja inclusiva?, questionou um seguidor. "Né crente, não", respondeu o pastor, citando seu bordão. É bom viver em Orlando?, perguntou outro. "Melhor cidade do Brasil", devolveu, com um risinho.

Nos bastidores da Lagoinha, imaginou-se que o novo líder iria "chegar chegando" e "passar o trator", rachando a igreja. Isso porque André, instalado na Flórida, é descrito por interlocutores como um "playboy", "impulsivo", mais interessado em camisetas Polo Ralph Lauren e "fotos de jet-ski", ultraconservador e bolsonarista "apaixonado pela direita americana".

Não foram considerados outros integrantes do clã para a sucessão, como o casal Gustavo Bessa e Ana Paula Valadão — ela, a primogênita de Márcio, foi quem popularizou a igreja no fim da década de 1990 e, desde 2018, lidera outra igreja na Flórida, a Before The Throne ("diante do trono", em tradução literal).

O pastor André Valadão, em Orlando (EUA) - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Imagem: Reprodução/Facebook

'Dedé' no poder

Se a sucessão na Lagoinha fosse uma temporada de "Game of Thrones", André seria Joffrey Baratheon, o jovem rei que mal assumiu e atiçou disputas. "Até agora, ele está sendo surpreendentemente maduro", uma fonte ponderou, no dia 8 de fevereiro. "Mas posso estar enganado: daqui a 20 minutos, ele pode postar uma bobagem."

Pois foi: seis dias depois, no Instagram, André disse que batizaria o presidente Lula (PT) deixando-o submerso por 30 segundos para limpá-lo "com força". O reel viralizou e, na sequência, o pastor publicou no Twitter uma foto fazendo o "L", mas ironicamente: "PT não, Lula não. Que que o batismo do mula tá rendendo", dizia a legenda.

Só no Instagram, André tem mais de 5,5 milhões de seguidores — mais que, individualmente, os pastores Silas Malafaia (Assembleia de Deus), Marco Feliciano (Catedral do Avivamento) e Edir Macedo (Igreja Universal do Reino de Deus).

Os caminhos dos Valadão e dos Bolsonaro já se cruzaram várias vezes. Em junho de 2022, por exemplo, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) viajou a Los Angeles para participar da Cúpula das Américas, depois foi inaugurar um vice-consulado em Orlando, onde subiu ao púlpito da Lagoinha, a convite de André, dizendo que o Brasil enfrentava uma guerra "do bem contra o mal". "Nós podemos até viver em oxigênio, mas jamais sem liberdade", bradou Bolsonaro.

André também convidou Bolsonaro para o culto que celebrou o jubileu de Márcio, na matriz da Lagoinha, em Belo Horizonte, em agosto de 2022. Foi o dia em que Michelle tomou a palavra e disse que o Planalto era "consagrado a demônios" antes da chegada de seu marido. "Dedé, cê é crente, viu?", brincou a então primeira-dama, em referência ao bordão do pastor influencer. "Não consigo ver um Brasil com amizades socialistas comunistas da América Latina", André escreveu na legenda de uma foto de 10 de outubro, junto a Bolsonaro.

Nove dias depois, o pastor publicou um vídeo dizendo, com voz embargada, que estava se retratando, por "intimação" do ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), sobre afirmações falsas publicadas por ele contra a campanha de Lula: retificou, por exemplo, que o petista não é a favor de liberar pequenos furtos. Entretanto, acrescentou: "Os trombadinhas entrarão na sua casa, roubarão sua TV. Você correrá risco de vida e nada acontecerá com eles". O vídeo viralizou, mas a premissa era falsa: o TSE não tinha mandado nenhuma intimação.

Twitter e Instagram suspenderam os perfis de André no dia 11 de novembro, após o segundo turno da disputa presidencial de 2022. No perfil "reserva", onde tem mais de 1,1 milhão de seguidores, ele continuou postando até a reativação da conta oficial, no dia 27 de dezembro. "Eu voltei", brincou, como se fosse Roberto Carlos, autor dos versos "Eu voltei agora pra ficar, porque aqui, aqui é meu lugar".

Na tarde de 30 de dezembro, um dia antes de deixar a Presidência, Bolsonaro viajou à Flórida, rompendo o rito da passagem da faixa presidencial. Instalou-se na casa de férias do ex-lutador de MMA José Aldo na região metropolitana de Orlando, a poucos minutos dos parques da Disney. Desde então, o ex-presidente não se encontrou com aliados e apoiadores famosos, como André, segundo reportou a Folha de S.Paulo.

Apesar de ter alfinetado Lula, André não postou nenhuma foto recente ao lado de Bolsonaro. Na Lagoinha, agora a dúvida é por quanto tempo ele vai se segurar.

*Procurado pelo TAB, André Valadão não retornou os pedidos de entrevista.