Elvis no céu e Kassab na terra: vereadora Edir Sales é a festeira da Câmara
Passava das 19h quando a Câmara Municipal abriu oficialmente as comemorações do "Elvis Presley Day", no último 16 de agosto, data da morte do cantor incluída no calendário oficial da cidade de São Paulo por iniciativa da vereadora Edir Sales (PSD). Aos 71 anos — idade que não revela a ninguém, mas consta de seu cadastro eleitoral — esta fã do eterno Rei do Rock é a recordista em eventos na Casa e chegou vestida a caráter, num modelo tradicional dos anos de 1950.
Ao som de um dos maiores sucessos do astro — "Can't Help Falling in Love", tocada pela banda da Guarda Civil Metropolitana —, Edir desfilou pelo Salão Nobre do Legislativo paulistano cumprimentando covers do cantor e representantes de fã-clubes, que consideram a parlamentar a madrinha do rockabilly em São Paulo.
Sabe arroz de festa? Daquele que vai a quermesse de escola, visita bazar de igreja, assiste pelada em clube de bairro e aparece até em inauguração de farmácia? Esta é Edir Sales, vereadora em mandatos sucessivos, desde 2009, sempre cultivando uma rotina lotada de eventos dentro e fora do Palácio Anchieta, a sede do Legislativo paulistano.
Levantamento exclusivo feito pelo TAB mostrou que a parlamentar é mesmo recordista na oferta de homenagens aos mais variados setores da sociedade, como farmacêuticos, contabilistas e imigrantes chineses, além, é claro, dos fãs do Elvis. Tudo documentado em suas fervidas redes sociais.
Lenço das tigresas
De 2021 para cá, a pessedista organizou 32 solenidades na Câmara, sendo 16 só neste ano. O número representa 25% de todos os eventos promovidos no atual mandato. O segundo colocado no ranking, por exemplo, é o vereador Rodolfo Despachante (PSC), com minguadas dez reuniões.
"Eu gosto mesmo do Elvis, vou a caráter nos eventos. Tenho um vestido de bolinha dos anos 1950, de saia godê, que é uma delícia, e também o lenço das tigresas, que são as fãs do Elvis. É um pessoal muito animado, que faz festa o ano todo. E a minha lei é a única no Brasil. Só tem Elvis Day em SP e em Memphis (EUA), onde ele nasceu", orgulha-se Edir.
A paixão pela música vem dos tempos de rádio. Antes de entrar para a política, Edir foi radialista e chegou a ser parceria do locutor Barros de Alencar, sucesso dos anos de 1980 e 1990, nas rádios Tupi e Iguatemi. "Fiquei viúva com 41 anos depois que meu marido, que era médico, cochilou no volante e morreu depois de um plantão. Com dois filhos pequenos tive de ir à luta. Era professora de educação física e contabilista nessa época também. A política veio depois."
E veio como uma herança de família. Assim como muitos outros parlamentares no Brasil, Edir se candidatou para assumir o "legado" do irmão, o então vereador Eurípedes Sales, que deixou o posto para virar conselheiro do TCM (Tribunal de Contas do Município), um dos "empregos" mais disputados entre políticos de São Paulo, com super salários e benefícios.
A então professora duvidou da proposta no início, mas seguiu o chamado. E, de cara, foi eleita deputada estadual em 1998. Ficou na Assembleia Legislativa por dois mandatos até que, depois de não se reeleger para o terceiro, resolveu mudar de foco. "Faço uma comparação engraçada, mas verdadeira: a Alesp parece um convento e a Câmara, um campo de guerra. Como gosto mais de guerra, prefiro ficar na Câmara. Aqui as coisas acontecem mais rápido."
Com o estilo Kassab
Edir, confirmam os colegas, faz acontecer. A estratégia de estar onipresente — só neste ano ela foi a 26 festas juninas em seu reduto eleitoral — rende votos e garante o mandato. Fidelizar o eleitor não é plano inédito, mas foi ensinado passo a passo por seu grande "líder", o presidente de seu partido e ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD).
"Pra mim ele é o maior articulador político do país. Sou fã, sigo a linha dele, tenho o estilo dele. A gente se identifica muito. Foi ele quem me ensinou que quando uma pessoa vai ao meu escritório é porque ela já tentou todos os outros recursos e não deu certo. E é por isso que a gente tem de atender sempre com um sorriso, dar uma água, café e conversar", dá a receita. "Eu sou uma vereadora distrital. Aliás, se o voto fosse distrital, não precisava nem fazer campanha."
Kassab retribui a gentileza. "Quando prefeito, pude ver de perto por que a Edir é considerada a vereadora mais distrital da cidade. Ela está atenta a todas as demandas e necessidades da Vila Prudente, Sapopemba, Teotônio Vilela, Mooca, Belém, Tatuapé e todo o restante da zona leste", diz o ex-prefeito. "A atuação dela coincide com o desenvolvimento, com a melhora da qualidade de vida desses distritos", elogia.
Mais distante do dia a dia da capital após assumir o cargo de secretário de governo e relações institucionais da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), Kassab conta que ainda conversa com a colega de partido sobre seus projetos e mandato.
"Ela gosta de me ligar, me consultar sobre os projetos que apresenta na Câmara, o que me deixa muito feliz", completa ele, que recebeu das mãos dela, em 2022, a Medalha Anchieta e o Diploma de Gratidão da cidade, honrarias aprovadas em plenário.
Babá de vereador, não
O escritório político de Edir Sales ocupa o mesmo endereço há 20 anos no largo da Vila Prudente. Em sua rotina, a parlamentar atende de 8 a 10 pessoas pela manhã, duas vezes por semana. Anota as demandas e, de acordo com o caso, liga na hora para os secretários do prefeito Ricardo Nunes (MDB). "Eles não me aguentam, mas me atendem. Aliás, é por isso que nunca quis ser secretária, para não virar babá de vereador."
No último dia 25, Nunes passou o dia no bairro e foi ciceroneado pela vereadora desde o primeiro evento, um café da manhã. Edir é uma espécie de embaixadora da região e apresentou o prefeito a moradores e comerciantes e recebeu dele o anúncio da construção da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) Vila Prudente.
Colegas parlamentares destacam que a atuação distrital de Edir segue uma fórmula de sucesso adotada historicamente em São Paulo. "Esse é um modelo de mandato que tem se fortalecido em algumas regiões, como na zona sul", nota o ex-vereador e atual deputado estadual Paulo Fiorilo (PT). É o caso, por exemplo, do presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil), e do próprio Nunes, com redutos específicos na região de M'Boi Mirim e Santo Amaro, respectivamente.
O vereador Rodrigo Goulart (PSD) é outro que segue a linha distrital e diz ter em Edir Sales uma "professora". Mas o representante da Capela do Socorro, zona sul, ressalta que a parlamentar atende toda a cidade com seus projetos de lei. Entre eles, a lei que liberou a aplicação de vacinas em farmácias, que isentou do rodízio de veículos o pessoal que conserta elevador e que criou o "botão do pânico" para mulheres vítimas de violência doméstica.
"Mas isso só como vereadora. Quando fui deputada, batalhei por projetos emblemáticos, que me dão muito orgulho, como a USP Leste e o metrô da Vila Prudente. Colhemos mais de 100 mil assinaturas na época para levar transporte para uma região que era conhecida por sua favela, que sempre pegava fogo, aliás. Hoje, o bairro é parte importante da cidade."
Nem esquerda, nem direita
Assim como a vereadora não se importa em ser chamada de festeira, também não liga de ficar em cima do muro quando o assunto é a polarização esquerda versus direita. "Eu sou do centro. Não faço guerrinha ideológica, não é meu estilo. Aprendi faz tempo que quem mais grita é quem menos faz. Só entro em embate quando é para denunciar o machismo da Câmara, que é demais, viu? Este ano não tem uma mulher na Mesa Diretora", reclama ela.
Edir destaca ter aprendido em casa a escolher quais brigas travar — um ensinamento dos pais, o sapateiro Anedes Sales e a costureira Cherubina Pimenta de Oliveira Sales, que viveram juntos por 50 anos, parte deles na zona leste de São Paulo.
"Minha raiz está lá, é onde me sinto bem. E as pessoas pedem minha presença, sabe? Há uma carência muito grande de representatividade. Então, quando me convidam para um evento eu tento ir. Sou festeira mesmo, quero é estar com as pessoas."
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