Direita avança, mas não ameaça em Niterói, reduto da esquerda no Rio
Pela terceira vez, Rodrigo Neves (PDT) é eleito prefeito de Niterói neste domingo (27), com mais de 57% dos votos. O pedetista já esteve à frente da gestão do município entre 2013 e 2020.
Neves enfrentou no segundo turno o deputado federal Carlos Jordy (PL). Foi a primeira vez em que houve segundo turno entre a esquerda e a direita na cidade, que fica na região metropolitana do Rio.
Durante a campanha, Neves apostou na imagem de uma candidatura de frente ampla, unindo aliados de esquerda e de centro contra a direita.
A estratégia foi semelhante a de Eduardo Paes (PSD), eleito prefeito da capital no primeiro turno enfrentando o candidato bolsonarista Alexandre Ramagem (PL).
Jordy, em Niterói, recebeu apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PL).
Apesar disso, ele evitou se associar publicamente à família Bolsonaro, apostando em uma aproximação de imagem com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Câmara dividida
O PL perdeu a prefeitura, mas se tornou o partido com mais vereadores eleitos para a Câmara Municipal de Niterói, com quatro nomes.
Um deles é Douglas Gomes, que se identifica como "o vereador de Bolsonaro", e foi o vereador mais votado da história da cidade, com 16.369 votos.
Além dos três vereadores do PDT, a Câmara de Niterói também elegeu dois vereadores do PSOL, dois do PT, e um do PCdoB, totalizando oito num bloco à esquerda.
Enquanto isso, além dos quatro eleitos pelo PL, também estarão na Câmara dois do União, um do Podemos e um do Republicanos, igualando a marca de oito à direita.
O bloco do centro terá dois vereadores do MDB e Cidadania e um do PSD.
Consolidação da direita no Rio
O cientista político Josué Medeiros, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e coordenador do Opel (Observatório Político e Eleitoral), acompanhou a campanha em Niterói de perto.
Segundo ele, o mapa do Rio de Janeiro todo mostra um avanço e uma consolidação da extrema direita no estado. O PL e partidos aliados ao governador Claudio Castro (PL) conseguiram eleger os prefeitos das cidades mais importantes do estado, à exceção da capital, Niterói e Maricá.
"Dentro desse contexto, Rio e Niterói foram cidades que resistiram, mas devido, também, aos sucessos dos grupos políticos vigentes, seja o Paes no Rio, seja Neves em Niterói", afirma o cientista político da UFRJ.
Entre os argumentos utilizados por Neves na campanha foi a defesa pela democracia. "Isso se deve ao fato de Jordy ser um dos envolvidos nas preparações e consequências de 8 de janeiro", diz Medeiros.
"Niterói nunca teve milícia de fato e as políticas públicas da cidade, como uma moeda social, foram bastante exitosas", complementa.
Sobre o avanço de vereadores de direita na Câmara, o especialista avalia que ocorreu um "processo parecido com o resto do Brasil".
"O bolsonarismo conseguiu muitos votos. Muitas lideranças surgiram, sempre com pautas ideológicas muito radicais. No caso do eleito por Niterói [Douglas Gomes], era uma campanha muito contra pessoas trans", finaliza.
A professora de ciência política da UFRJ Mayra Goulart, coordenadora do Lapcom (Laboratório de Eleições, Partidos e Política Comparada), afirma que Neves deve ser visto menos como uma liderança à esquerda e mais como uma "liderança pragmática".
Ela explica que, no início dos anos 2000, a esquerda teve mais votos na região por influência do brizolismo. "Em 2003, a hegemonia do PT na esquerda se consolida, mas em 2006 houve redução na identificação das classes médias e altas com a esquerda em geral", diz.
Para Mayra, Neves conseguiu contrabalançar as circunstâncias — antipetismo crescente e a onda conservadora — com histórico de boa governança. "Em Niterói, lideranças locais fizeram boas gestões e colheram os frutos disso. Mas hoje, o desafio é o antipetismo que ainda marca o eleitorado, além da identificação com o bolsonarismo."
O dia da votação
No primeiro turno, Neves teve 48,47% dos votos, enquanto Jordy teve 35,59%. A pesquisa AtlasIntel, divulgada um dia antes da eleição, mostrava vitória de Neves com uma vantagem de 20 pontos percentuais: 60,1% contra 39,9%.
Os dois candidatos votaram pela manhã. Jordy votou por volta das 9h30 no Clube Naval, em Charitas, enquanto Neves votou às 10h45 na Faculdade de Veterinária da UFF (Universidade Federal Fluminense), em Icaraí.
A reportagem esteve nos dois colégios eleitorais neste domingo. Em nenhum ponto da cidade houve animosidade entre opositores, de acordo com policiais militares.
Apesar disso, pelo menos 38 pessoas foram levadas à delegacia da Polícia Federal na cidade suspeitas de terem praticado crime eleitoral, a maioria por boca de urna.
Após votar no Clube Naval, Jordy afirmou à imprensa que estava esperançoso pelo sentimento de mudança que seus eleitores tinham com relação a atual gestão.
Já Neves disse a jornalistas que os votos que receberia seriam para enfrentar "amigos de grupos milicianos" de entrar na política da cidade.
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